As suspensões de frigoríficos brasileiros por parte do governo chinês – desde que o país passou a enfrentar uma nova onda de contaminações por Covid-19 – têm gerado prejuízo para pecuaristas que trabalham com o chamado boi-China. Esses animais, criados para serem abatidos com até 30 meses de idade, vinham sendo vendidos a preços de R$ 20 por arroba acima do mercado nacional. Mas os produtores viram esse ágio desabar, chegando a vender boiadas inteiras para consumo no mercado interno e sem bonificação.
“A situação hoje é alarmante. O produtor perdeu e está perdendo dinheiro, porque a receita caiu drasticamente”, conta o diretor Associação Goiana dos Criadores de Zebu (AGCZ), Fábio Porto.
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(Foto: Giovane Rocha / Rally da Pecuária)
Com três frigoríficos habilitados para exportar para a China – sendo dois da JBS – Goiás está entre as praças pecuárias mais afetadas pelas suspensões. Desde março, o principal abatedouro da região e o maior em capacidade de abate do país (2.250 cabeças por dia), a JBS de Mozarlândia, está fora do mercado chinês – o que afetou o preço dos animais. No final de maio, a planta da companhia em Senador Canedo teve sua habilitação suspensa por uma semana, reduzindo ainda mais as opções de venda de bois no padrão exigido pelo país asiático.
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Porto, da AGCZ, explica que o ágio pago pelo boi-China é decisivo para o resultado da comercialização dos animais. “Quando você faz a opção para produzir esse boi, você investe em nutrição e genética com um custo inicial maior. E como o boi é um animal de longo prazo, você investiu lá atrás com uma expectativa de ganho futuro, mas é ceifado dessa valorização, ou seja, investiu-se e realmente não vai ter retorno”, pontua o pecuarista.
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Com quatro frigoríficos aptos a exportar para os chineses, o Pará enfrenta situação semelhante à de Goiás desde a suspensão do frigorífico da Masterboi, de São Geraldo do Araguaia, em abril. “Alguma coisa do boi-China desse frigorífico é absorvida por outros frigoríficos, mas não é tudo. Para começar, um deles é muito longe e os outros têm uma capacidade de abate reduzida. Então acaba afetando o mercado porque aumenta um pouco a oferta”, relata o presidente da Associação dos Criadores do Pará (Acripará), Maurício Fraga Filho.
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Segundo Fraga Filho, muitos estão vendendo os animais sem bonificação para o mercado interno. Fábio Porto, de Goiás, ressalta que a desvalorização do boi-China acontece em um momento em que o setor enfrenta uma “cadeia de sucessivos problemas” que afetam o resultado operacional no campo.
“Esse excesso de boi-China pronto para abate está sendo comercializado por vários motivos, o produtor precisa da receita, precisa tirar os animais do pasto que já estão na transição das águas para seca e esse boi, de alguma forma, tem que ser vendido e vai ser vendido a preços mais baratos”, explica o diretor da AGCZ.
Com a chegada do inverno e a menor disponibilidade de pastagens, esta época do ano é tradicionalmente de baixa no mercado com a maior oferta de gado – contexto agravado pelo aumento dos custos de confinamento e suplementação.
“O capim precisa de luz umidade e temperatura, são os três fatores de crescimento. Quando chega no final de maio, em que os dias são mais frios, mas curtos e mais secos, o pecuarista que faz criação em pasto é obrigado a vender. E esse ano está mais seco, tem ainda a memória do ano passado de seca, geada, incêndio. Então, o pessoal resolveu não correr o risco e vender o gado”, explica o diretor-fundador da Scot Consultoria, Alcides Torres, ao ressaltar que “com o aumento do custo de produção, ninguém também se arriscou a suplementar o gado em pasto”.
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De R$ 330, o preço médio da arroba em São Paulo já caiu para abaixo dos R$ 300, segundo acompanhamento feito pela Scot. “Esse é o quadro e os preços devem continuar frouxos até que essa oferta termine. Agora vem a China suspendendo o abate de algumas plantas e o efeito é esse: a queda da cotação da arroba do boi gordo”, completa Alcides.
No caso específico do boi-China, ele pontua que o ágio pago pelo animal hoje encontra-se abaixo dos R$ 10, reduzindo as margens daqueles pecuaristas que ainda conseguem vender seus animais para frigoríficos ainda liberados para a exportação. “A margem do pecuarista encolheu e a solução é fazer operações de seguro através de contrato a termo ou pela B3 em contratos de opções. Mas se o pecuarista não faz isso, então todo impacto é transferido pra ele, ele que vai ter os custos subindo e preços caindo”, alerta.
Source: Rural