Componente básico da salada do dia a dia, a alface está mais cara, acompanhando a tendência vista em diversos produtos do segmento de hortifruti nos últimos meses. Só entre os dias 17 de março e 13 de abril, o aumento médio para o consumidor foi de 5,4%, de acordo com o IPCA-15, a prévia da inflação oficial, divulgada nesta quarta-feira (27/4) pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). No acumulado do ano, a alta é de 44,71% e, em 12 meses, de 46,22%, de acordo com o levantamento.
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Preço da alface subiu mais de 40% no acumulado do ano e em 12 meses (Foto: Ernesto de Souza / Ed. Globo)
As altas no preço da hortaliça têm sido consistentes ao longo do mês, depois de alguma acomodação em março. Na Companhia de Entrepostos e Armazéns Gerais do Estado de São Paulo (Ceagesp), a expectativa é do preço da alface encerrar o mês 20% mais alto que em março.
Thiago de Oliveira, chefe da Seção de Economia da Ceagesp, explica que uma série de fatores tem pressionado o preço do produto, acompanhado por outras folhosas que também estão em alta, como repolho, brócolis e couve-flor. O item hortaliças e verduras, que compõe a Cesta Ceagesp de Preços, deve subir até 14% em abril, estima Oliveira, que não fechou ainda todos os dados para cálculo do indicador cheio.
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Frutas e hortaliças se valorizaram em mês com problemas climáticos
A alface está mais valorizada também no campo, apontam os indicadores do Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada (Cepea). Em Ibiúna (SP), a alface crespa fechou na sexta-feira, dia 22 de abril, a R$ 36,85/cx de 20 unidades (+16,39%) e a americana, a R$ 39,10/cx com 12 unidades (+14,66%). Em Mogi das Cruzes (SP), a cotação final foi de R$ 37,00/cx com 20 unidades de crespa e de R$ 38,50/cx com 12 unidades de americana (+16,67%).
De acordo com a instituição, a produção ainda está reduzida, com menor ritmo de plantio e produtividade prejudicada pelo clima. Marina Marangon, pesquisadora do Cepea, lembra que o alface foi a cultura que mais sofreu com a pandemia em 2020, em razão das medidas de isolamento e fechamento do comério.
No verão de 2021, apesar do clima ter ajudado, os preços de venda foram muito baixos, o que deixou o produtor descapitalizado. “O primeiro semestre do ano passado foi favorável para produzir hortaliças, o que gerou maior oferta e preços baixos”, explica a pesquisadora. “A consequência desses últimos dois anos é um produtor sem caixa, descapitalizado, sem capital para investimento. Como aumentou o custo de produção, esse é um dos fatores que limitaram a oferta.”
Thiago de Oliveira, da Ceagesp, lembra também que, em julho do ano passado, geadas ocasionaram a perda de produção e a redução da qualidade. Na sequência, ocorreu uma estiagem prolongada, afetando também a disponibilidade de recurso para cultivos irrigados. Com isso, o produto já chegou com baixa qualidade para comercialização entre setembro e outubro.
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E, no momento em que os produtores foram plantar novamente, em novembro e dezembro, enfrentaram alta elevada de fertilizantes e defensivos. “E são agricultores familiares, são pequenos agricultores, diferentemente do pessoal do trigo e da cana-de-açúcar, que podem comprar um caminhão de defensivo, eles não tem poder de barganha para comprar. E sofrem impacto maior do custo de produção.”
Diante da situação, produtores reduziram a área plantada. E, se, anteriormente, o problema foi a seca, no início deste ano foi o excesso de chuva entre o final de janeiro e início de fevereiro que prejudicou a plantação. As chuvas mais intensas em Minas Gerais e Rio de Janeiro levaram muitos produtores do Estado de São Paulo a receber pedidos de entrega nessas regiões, para garantir o abastecimento.
A oferta já reduzida, e de baixa qualidade, se tornou ainda mais crítica. Só em fevereiro, o preço do alface chegou a subir cerca de 30%. “Quando o preço subiu mais do que normal, além de qualidade inferior, está aparecendo outros clientes para abastecer mercados locais. E tem cidades do interior paulista que não tem costume de comprar, acabaram comprando.”
Demanda crescente
Igor Aparecido Vieira de Camargo, produtor e dono do sítio Bela Vista, em Ibiúna, chegou a vender neste ano para clientes em Goiás, Paraná e Bahia. E em abril, está vendendo para Minas Gerais e Amazonas, além de ser fornecedor no Estado de São Paulo. “Está acontecendo bastante. Normalmente essa época ninguém carregava para fora”, diz ele, com plantações em 38 alqueires.
Ele conta que no ano passado muita gente deixou de produzir por conta dos altos custos de produção. E, em janeiro, com a retomada do comércio e das vendas para prefeituras, a demanda cresceu sem que a área plantada pudesse dar conta. Devido às altas de insumos e do diesel, no ano passado ele lembra que o custo para a venda de uma caixa com 24 pés de alface na Ceagesp era de R$ 10, incluindo os gastos com frete; hoje, chega a mais de R$ 20. “Eu tive que reduzir a produção, porque se aumentar o preço muito o cliente não compra.”
E o clima continua sendo uma incerteza. Em Ibiúna e Piedade, o calor está forte, prejudicando a lavoura. “Agora está muito quente em Ibiúna e já está começando a faltar água. Em Piedade, está faltando mais água. Acho que nesse inverno vai faltar mercadoria por falta de água, porque, agora que abriu comércio, está com muita demanda.”
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Anderson Taira, produtor de alface hidropônica em São Lourenço da Serra (SP), conseguiu manter a produção em 100% nos 30 metros quadrados de suas estufas. Para ele, o preço está alto porque muitos produtores reduziram a área plantada e deixaram de cultivar alface. Sua produção diária, de mil caixas de 20 unidades, tem compradores praticamente certos e, no mês passado, ainda vendeu para clientes no Rio e Belo Horizonte em decorrência dos estragos da chuva nessas regiões.
Apesar de ser uma produção em estufa, mudanças bruscas de temperatura prejudicam a qualidade do produto, podendo causar perdas de cerca de 10%. “Da pandemia prá cá, muito dos adubos que a gente usa subiram mais de 300%. E ainda mais depois da guerra, que parou de vir insumo, piorou tudo. E o diesel que subiu 30%. E uso o saco plástico para embalar o alface, que subiu 100%. O custo de produção ficou muito alto e muito produtor acabou desistindo de produzir. E a oferta e demanda é o que fizeram subir o preço da alface de forma drástica”, explica ele.
Marina Marangon, pesquisadora do Cepea, explica que a variação térmica nessa época do ano, com noites frias e dias quentes, prejudica a cultura. Ela avalia, no entanto que, com o clima ficando mais ameno, a oferta deve se recuperar no inverno. Há desafios, sem dúvida, porque apesar de preços ao consumidor estarem altos, os custos de produção também estão, reduzindo a margem do produtor. Mas essa demanda pode incentivar o produtor a ampliar a área na safra que começa em junho, fazendo com que os preços ao consumidor recuem.
Thiago de Oliveira, da Ceagesp, também acredita que os preços da alface devem começar a cair à medida que se aproxima o inverno. “Como estamos com preços altos, talvez o produtor se anime e haja uma recuperação da área de produção o que pode ajudar nos preços”, diz Marina.
Source: Rural