O conflito entre Rússia e Ucrânia abriu uma série de questões relacionadas aos impactos econômicos globais desencadeados por essa guerra. A Rússia vem sofrendo uma série de sanções vindas de grandes players econômicos e empresas multinacionais. Ao mesmo tempo, o país transcontinental é o terceiro maior produtor mundial de petróleo e gás natural e o principal fornecedor de fertilizantes ao Brasil. A redução da oferta global de produtos russos, seja por boicote ou por interrupção do fornecimento por parte da Rússia, gera impactos nos preços globais de combustíveis, energia e alimentos.
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Vozes do Agro (Foto: Estúdio de Criação)
Dentre os efeitos já observados está o aumento do índice mundial de preços de alimentos da Organização das Nações Unidas para a Agricultura e Alimentação (FAO), que subiu 24,1% em fevereiro, quando comparado ao mesmo período do ano anterior. Esses desdobramentos acontecem em um mundo que já vive um momento de forte inflação de preços gerada por consequências da pandemia da covid-19.
As relações bilaterais entre Brasil e Rússia são marcadas principalmente pela venda de fertilizantes e derivados do trigo ao Brasil.
Pelo lado da oferta, em 2021 o Brasil exportou um total de US$ 1,6 bilhão em produtos para a Rússia, o equivalente a 0,6% das exportações totais, a menor participação em pelo menos duas décadas. Isso deixou o país em 36º entre os destinos para onde o Brasil mais exporta. A maior parte dessa pauta, 80,2%, foi de produtos do agronegócio, atingido o valor total de US$ 1,27 bilhão. Há uma concentração do comércio de soja, carnes e café, que respondem por 53,7% de todas as vendas para a Rússia, já em relação ao agronegócio respondem por 67,0%.
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Já as importações vindas da Rússia totalizaram US$ 5,7 bilhões em 2021. O valor das compras mais do que dobrou em relação a 2020, saltando de US$ 2,7 bilhões para US$ 5,7 bilhões. Dessa forma, o país saiu da 13ª para a 6ª posição do ranking das importações brasileiras. Em 2021, as importações de produtos russos só não superaram as compras da China, Estados Unidos, Argentina, Alemanha e Índia. Com isso, a Rússia ultrapassou países como Coreia do Sul, Japão, França, Itália e México no ranking de principais fornecedores do Brasil. Esse salto foi impulsionado pelas compras de adubos e fertilizantes químicos.
Em 2021 o Brasil importou US$ 15,14 bilhões em fertilizantes, valor que corresponde a 41,55 milhões de toneladas. Desse total, 23% em termos de valor (US$ 3,53 bilhões) e 22% em termos de volume (9,27 milhões de toneladas) tiveram a Rússia como origem. A União Europeia, por exemplo, respondeu por 7% do valor e 8% do volume importado.
Uma das medidas do governo para reduzir a dependência da importação de fertilizantes é o Plano Nacional de Fertilizantes (PNF). O PNF, lançado na primeira quinzena de março, é um plano de longo prazo e pretende reduzir a dependência por fertilizantes importados. Atualmente a demanda por importados é de 85% do total utilizado, o PNF pretende reduzir essa demanda para 50% durante os próximos 30 anos.
Há cinco objetivos estratégicos traçados pelo governo para o desenvolvimento do PNF: i) reativar e ampliar as plantas e projetos de fertilizantes existentes no Brasil; ii) melhorar o ambiente de negócios no Brasil para atração de investimentos para a cadeia de fertilizantes e nutrição de plantas; iii) promover vantagens competitivas na cadeia de produção nacional de fertilizantes para melhorar o suprimento do mercado brasileiro; iv) ampliar os investimentos em PD&I (Pesquisa, Desenvolvimento e Inovação) e no desenvolvimento da cadeia de fertilizantes e nutrição de plantas do Brasil; v) adequar a infraestrutura para integração de polos logísticos e viabilização de empreendimentos.
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A diminuição da dependência de fornecimento externo de fertilizantes é um grande passo para a produção agrícola, diminui a chance de desabastecimento, estabiliza os preços envolvidos nos custos de produção e deixa o país menos vulnerável a eventos externos, como é o caso do conflito no leste europeu.
*Talita Priscila Pinto é pesquisadora do FGV Agro, o Centro de Estudos do Agronegócio da Fundação Getúlio Vargas
**as ideias e opiniões expressas neste artigo são de responsabilidade exclusiva de sua autora e não representam, necessariamente, o posicionamento editoria da revista Globo Rural
Source: Rural