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"O mercado continua nos desafiando e agora temos um gato no telhado.” A frase é do empresário Leandro Pinto, sócio do Grupo Mantiqueira, maior produtor de ovos comerciais do país, com 13,3 milhões de galinhas que botam mais de 2,7 bilhões de ovos por ano. O "gato no telhado" é a guerra entre Rússia e Ucrânia, que, neste sábado (5/3), chegou ao décimo dia. Um conflito que envolve dois países que estão entre os maiores produtores e exportadores mundiais de grãos. 

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Apesar do cenário de incerteza no mercado, Granja Mantiqueira espe (Foto: Divulgação/Granja Mantiqueira)

 

O confronto em território ucraniano chacoalhou os mercados de commodities, trazendo incertezas sobre o quadro de oferta e demanda de insumos básicos para a avicultura e dando impulso aos preços internacionais. Para o setor de ovos, é mais um motivo de preocupação, em um cenário de aumento de consumo, mas também de alta nos custos de produção das granjas de postura.

Juliana Ferraz, analista do Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada (Cepea) da Esalq-USP, explica que a guerra pode afetar a volatilidade do câmbio e elevar o preço de insumos e do petróleo. O que tende a pesar nas cotas das granjas, já que o milho, junto com o farelo de soja, é responsável por cerca de 70% do custo de produção de um ovo. “Milho e farelo de soja, bases da ração, dependem de outros insumos que importamos. Qualquer ruptura ou aumento de preços na cadeia impacta a produção de ovos", resume. 

Leandro Pinto, da Granja Mantiqueira, ressalta que milho e farelo são insubstituíveis. E as granjas não têm mais fornecedores exclusivos. Concorrem com as tradings. Segundo ele, desde 2018, o preço do milho saiu de R$ 40 para R$ 100 a saca e o do farelo de soja subiu de R$ 1.200 para R$ 3.000 a tonelada. A Mantiqueira, que bateu recordes de produção e exportação em 2021, acionou o freio de arrumação, já que não há como reduzir custos de mão-de-obra, energia, embalagens ou óleo diesel.

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“Até 2018, o setor estava muito rentável e muitos achavam que esse cenário duraria para sempre, mas os aumentos de custo dos dois últimos anos levaram muitas granjas pequenas a saírem do mercado. Nós estamos reduzindo o alojamento de aves, privilegiando as galinhas jovens no pico da postura porque cada caixa de ovo que a gente põe no caminhão estamos mandando junto uma nota de R$ 50 de prejuízo em cada uma”, lamenta o executivo.

Ao menos nos últimos dois anos, a empresa – nascida em uma pequena granja de Minas Gerais e que, hoje, é dona da maior unidade de produção de ovos do país, em Mato Grosso – realizou uma série de investimentos em esturturas e ampliação dos negócios. Iniciou novas construções e comprou uma unidade em Descalvado (SP). 

Diate do atual cenário de mercado, projeta uma queda de 10% no mercado nacional de ovos neste ano. O que, em princípio, não deve impedir a empresa de aumentar suas vendas. No ano passado, faturou R$ 1,086 bilhão, quase 40% mais que em 2020. Para 2022, o plano é superar R$ 1,3 bilhão.

Dificuldades no repasse

CEO da Granja Faria, Denilson Dorigoni também acredita que os efeitos da guerra sobre as commodities agrícolas vem agravar o cenário para a avicultura de postura do Brasil. O executivo lembra que, além do custo maior, há a dificuldade de repasse desses aumentos para o consumidor, diante de um mercado que já considera contraído.

"Mexe com os preços das commodities agrícolas, que já estavam pressionando os  produtores nacionais. Agora, certamente o impacto aumenta, mas a dificuldade de encontrar uma oportunidade para o repasse  aos preços persiste porque o mercado está contraído, não há espaço para reajustes”, diz ele.

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A Granja Faria tem 10 milhões de galinhas produzindo 7,2 milhões de ovos comerciais por dia e outras 4 milhões produzindo 3,2 milhões de ovos férteis por dia. A empresa foi fundada em 2006 para a produção de material genético, mas decidiu expandir o negócio para a área comercial, com diversas aquisições pelo país a partir de 2017.

O grupo tem hoje 20 unidades de produção e mantém o nome regional das granjas adquiridas. E vem elevando seu faturamento a cada ano. Em 2021, rompeu a barreira de R$ 1 bilhão. Em 2022, ainda que em meio ao cenário de incerteza que passa a ser agravado pela guerra na Ucrânia, a meta é fechar com R$ 1,4 bilhão, sendo 25% em ovos férteis e  65% em comerciais.

“Os dois últimos anos de pandemia foram bem difíceis para o setor. Houve uma redução de 20% a 40% na quantidade de aves em produção no país devido à queda de preço causada pela oferta maior que a demanda e a Granja Faria teve que melhorar sua eficiência para sair da crise. Felizmente, a demanda e os preços começaram a melhorar no meio do ano passado e as perspectivas para 2022 são de um aumento de 3% na produção", diz ele.

Denilson Dorigoni, CEO da Granja Faria (Foto: Divulgação/Granja Faria)

 

Demanda na quaresma

O CEO da Granja Faria aponta que o consumo de ovo caiu no Brasil nos últimos dois meses. Mas deve subir agora em março, por conta do tradicional período da Quaresma, quando os praticantes do catolicismo restringem o consumo de carne. Historicamente, um substituto acaba sendo o ovo.

Juliana Ferraz, analista do Cepea, avalia que os preços devem subir, mas as condições de mercado é que vão determinar se a sazonalidade positiva da quaresma vai se manter nos próximos meses. “O poder de compra do brasileiro foi reduzido pela inflação no ano passado. A tendência em 2022 é de mercado aquecido porque o ovo é uma proteína alternativa às carnes e mantém seu protagonismo pelo preço”, explica.

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Ela afirma que muitos produtores pequenos realmente abandonaram a atividade porque, por um lado, não têm poder de barganha na compra dos insumos e, por outro, tem dificuldade na precificação do ovo, que tem margem de lucro bem pequena por unidade. “Mas, em compensação, os grandes players do mercado aumentaram sua produção.”

Dados da Associação Brasileira de Proteína Animal (ABPA) apontam que a produção de ovos no Brasil em 2021 atingiu 54,5 bilhões de unidades, um aumento de 1,8%. Para este ano, a projeção da entidade é de 56,2 bilhões de ovos, uma alta de 3%, para um consumo per capita de 262 unidades.
Source: Rural

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