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O Código Florestal (Lei nº 12.651/2012) surgiu como oportunidade única de equalização entre a produção agropecuária e a conservação do meio ambiente. Dentre outras disposições, a lei aprimorou o conceito normativo de Reserva Legal para assegurar o uso econômico de modo sustentável dos recursos naturais do imóvel rural, a conservação da biodiversidade, a proteção de fauna silvestre e da flora nativa.

Em resumo, a Reserva Legal é uma área da propriedade que não pode ser utilizada economicamente de forma tradicional. Todavia, a exploração mediante manejo sustentável, devidamente aprovado pelo Sistema Nacional do Meio Ambiente (SISNAMA), é uma alternativa legal. Hoje, o conceito de Reserva Legal prevê a divisão de áreas protegidas de acordo com a vegetação, seguindo o Código Florestal atual. Anteriormente, essa divisão se dava por regiões, baseada no primeiro Código Florestal de 1934.

 

 

Após a entrada em vigência da lei florestal em 2012, dente outros assuntos, a temática da Reserva Legal foi discutida perante o Supremo Tribunal Federal nas Ações Diretas de Inconstitucionalidade (ADIs) 4.901, 4.902, 4.903, 4.937 e ADC 42. Esta tramitação durou mais de seis anos, quando, finalmente, houve seu julgamento.

Vale ressaltar a discussão em torno do artigo 12, que entre os parágrafos quatro e sete trata de excludentes e traça a possibilidade de o Poder Público reduzir a Reserva Legal para fins de recomposição em casos específicos ou mesmo deixar de exigir a Reserva Legal para situações taxadas na lei.

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O julgamento do Supremo Tribunal Federal (STF) foi no sentido de declarar a constitucionalidade do Código Florestal. Todavia, do ponto de vista prático, mesmo após a declaração de constitucionalidade, os efeitos em torno da aplicação do Código Florestal ainda têm um longo caminho a percorrer, principalmente no que se refere à compensação de áreas de Reserva Legal consolidadas.

Isso porque persistem as discussões no STF sobre as regras para uso das Cotas de Reserva Ambiental em compensação ambiental, já que o voto do STF criou a terminologia “identidade ecológica”, mas não explicou qual o sentido e aplicação na prática.

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Essas cotas são um dos instrumentos disponíveis no Código Florestal (art. 66) para compensação de Reserva Legal em áreas ocupadas antes de 22 de julho de 2008. A data é usada como marco temporal porque corresponde ao dia da edição do Decreto Federal 6.514/2008 — que definiu o que são infrações administrativas ambientais e estabeleceu o procedimento para sua apuração no âmbito federal.

Nota-se também a falta de convergência sobre o tema no judiciário. Recentemente o Superior Tribunal de Justiça (STJ) julgou caso sobre a aplicabilidade da lei florestal para a regularização de propriedades rurais situadas em APP’s no bioma Mata Atlântica no Paraná.

O presidente do STJ entendeu que com a declaração de constitucionalidade do Código pelo STF, sua aplicação deve acontecer, cassando liminar que determinava a aplicação da Lei da Mata Atlântica em detrimento às regras estabelecidas pelo Código Florestal. Pois entendeu que houve indevida interferência judicial no caso.

Por se tratar se um tema sensível e coletivo (proteção ao meio ambiente), mesmo com a vigência da lei florestal, alguns pretendem utilizar regramentos ambientais já revogados ou mesmo propor novas leis para alterar as normas vigentes, o que gera profunda insegurança jurídica no cenário do agronegócio nacional

Rafaela Aiex Parra e Loris El Hadi Maestri

Um outro bom exemplo da interferência entre os poderes é a edição das medidas provisórias nº 867/2018 e, posteriormente, 884/2019, pelo Executivo Federal. Apesar de a MP nº 867/2018 não ter prosseguido, a aprovada MP 884/2019 alterou a redação do parágrafo 3º do artigo 29 para extinguir o prazo de inscrição no Cadastro Ambiental Rural (CAR), o que traz impactos diretos na adesão do Programa de Regularização Ambiental (PRA).

De um lado, a MP sugeriu o aceleramento na regularização dos passivos ambientais existentes e a possibilidade de ocorrência independente do prazo, o que é positivo. Por outro, deu um indicativo de que as áreas protegidas degradadas não seriam recuperadas tão facilmente, em virtude da falta de materialização dos PRAS (Programas de Regularização Ambiental) nos Estados.

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No mais, foram apresentados mais de 56 projetos de lei pretendendo modificar as regras do Código Florestal, tornando o ambiente muito incipiente e frágil no que toca às regras florestais. Ou seja, por se tratar se um tema sensível e coletivo (proteção ao meio ambiente), mesmo com a vigência da lei florestal, alguns pretendem utilizar regramentos ambientais já revogados ou mesmo propor novas leis para alterar as normas vigentes, o que gera profunda insegurança jurídica no cenário do agronegócio nacional.

Mesmo a despeito de o Código Florestal ter delimitado o conceito e a abordagem da Reserva Legal, verifica-se que, na sequência, tanto o Poder Executivo, quanto o Legislativo e até o Judiciário alteraram (ou pretenderam alterar) as disposições do Código Florestal, atitudes estas que impactaram diretamente na regulamentação do tema e trazem insegurança jurídica para o agronegócio e sua cadeia, principalmente no que se refere a tomada de investimentos privados, adequação visando exportação de commodities e as novas diretrizes ligadas à sigla ESG, de melhores práticas ambientais, sociais e de governança.

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A discussão em torno da “proibição do retrocesso ecológico”, um princípio no Direito para que não sejam editadas normas que tragam prejuízo ao meio ambiente, trouxe um efeito colateral, pois deu aval a diferentes interpretações acerca da aplicação do Código Florestal.

Por se tratar se um tema sensível e coletivo (proteção ao meio ambiente), mesmo com a vigência da lei florestal, alguns pretendem utilizar regramentos ambientais já revogados ou mesmo propor novas leis para alterar as normas vigentes, o que gera profunda insegurança jurídica no cenário do agronegócio nacional.

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Em tempos de globalização, acesso a mercados e protagonismo de exigências ESG pelos mercados consumidores, a exemplo dos movimentos vindos da União Europeia, incluindo França, e até mesmo da China, não nos parece inteligente enfraquecer a legislação florestal (sua aplicabilidade).

O ideal é fomentar sua plena instrumentalização, inclusive no que se refere ao Capítulo X do Código Florestal, que institui diretrizes para um programa de apoio e incentivo à preservação e recuperação do meio ambiente, como o pagamento ou incentivo a serviços ambientais (PSA), compensações fiscais e/ou tributárias relativas às boas práticas adotadas, além de incentivos à pesquisa e tecnologia e plena efetivação das Cotas de Reserva Ambiental.

*Rafaela Parra é sócia e head da área Ambiental do escritório Araúz Advogados; Loris El Hadi Maestri é estagiária do escritório Araúz Advogados

As ideias e opiniões expressas neste artigo são de responsabilidade do seu autor e não representam, necessariamente, o posicionamento editorial da Revista Globo Rural.

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Source: Rural

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