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Responsável por 12,4% da produção nacional de grãos, a região Nordeste viu encolher à metade a participação das lavouras temporárias, que incluem produtos como arroz, feijão, soja, milho, cana-de-açúcar e frutas, sobre sua produção agrícola total em 11 anos.

É o que aponta uma análise divulgada nesta segunda-feira (9/8) pelo Ipea comparando dados dos Censos Agropecuários de 2006 e 2017, período no qual se acentuaram as desigualdades no desenvolvimento agrícola local na comparação com a média nacional.

Nordeste concentra 1,8 milhões de estabelecmentos da agricultura familiar, muitos deles vivendo abaixo da linha da pobreza, sgundo conta o pesquisador do Ipea (Foto: Reprodução)

 

Segundo o levantamento, apenas 3% dos municípios nordestinos tiveram mais de 80% de seus estabelecimentos fazendo uso de adubação em 2017, sendo a região que apresentou menor uso da tecnologia em suas lavouras: 30,3% dos estabelecimentos ante 42,3% na média nacional.

Em relação ao uso de defensivos, o percentual de fazendas que adotaram a tecnologia no Nordeste era de 23,8% ante 33,1% na média nacional e de 70% na região Sul.

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A mecanização também apresenta menor presença no Nordeste quando comparado ao restante do país. Segundo os dados do Censo Agropecuário de 2017, apenas 2,3% dos estabelecimentos agropecuários da região usavam tratores, índice que passa de 40% na região Sul e de 25% no Centro-Oeste.

“Definitivamente, até a década de 1990, esses pequenos produtores, que nas últimas décadas são chamados de agricultores familiares e são predominantes na região, não tinham nenhuma política pública voltada para eles. Era um grande número agricultores que não tinha acesso a crédito ou a assistência técnica”, explica o pesquisador do Ipea, César Nunes de Castro, que assina o estudo com a pesquisadora Caroline Nascimento Pereira, também do Ipea.

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Castro destaca que, apesar da criação de políticas específicas para a agricultura familiar a partir dos anos 1990, como o Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (Pronaf), as particularidades do Nordeste em relação ao restante do país exigem ações específicas, com a cooperação de diferentes áreas do governo.

“O Pronaf surgiu com uma modalidade e hoje já são inúmeras modalidades para públicos diferentes. Ele foi se desenvolvendo de uma forma atender clientelas específicas. Às vezes, seria justamente esse o caso, de se pensar numa questão mais específica, e isso envolveria diversas instituições”, pontua o pesquisador ao lembrar que 1,8 milhão dos 5 milhões de estabelecimentos da agricultura familiar do Brasil estão no Nordeste.

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“É um universo bastante grande de famílias e pessoas, muitas dos quais no semi-árido e, entre essas, muitas que nem o Pronaf atende ainda”, completa Castro.

De acordo com os pesquisadores, as políticas públicas atuais reproduzem o modelo de desenvolvimento do Centro-Sul, o que contribui para o avanço tecnológico da agricultura no Matopiba (Maranhão, Tocatins, Piauí e Bahia) e no Vale do São Francisco, mas sem gerar impactos semelhantes nas demais zonas rurais do Nordeste.

“Por conta de particularidades como solo, acesso a água e tamanho das propriedades, o modelo agroexportador, principalmente voltado para produção de  determinadas culturas de grãos, como soja e milho, não seria tão pertinente para a realidade desse grupo de agricultores familiares como talvez seja para a região Matopiba”, observa Castro ao ressaltar que, para parte desses agricultores, seria necessário trabalhar antes de tudo a cultura de subsistência.

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“Dentre esses 1,8 milhão de estabelecimentos familiares do Nordeste, muitos são de famílias que vivem abaixo da linha da pobreza. Por isso, seria preciso uma confluência de diversas políticas públicas que pudessem, se bem concatenadas e articuladas, ir transformando pouco a pouco a realidade desse grupo mais excluído – diferentemente de uma política púbica voltada para um pólio de Petrolina-Juazeiro ou Matopiba, que são outra realidade”, completa o pesquisador do Ipea.

Castro lembra que, no caso do acesso a assistência técnica e extensão rural, os dados do Censo Agropecuário apontam que apenas 8,2% dos produtores nordestinos recebiam algum tipo de orientação em 2017, dependendo de instituições públicas em 60% desses casos.

Nesse sentido, o pesquisador ressalta que o fechamento das empresas de assistência técnica e extensão rural e da Embrater, ainda na década de 1990, ajuda a acentuar o cenário de desigualdade entre a agricultura nordestina e a do restante do país.

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 "Até hoje não surgiu um modelo de ATER (assistência técnica e extensão rural) pública que volte a oferecer esse serviço em maior escala. As Ematers restantes, mantidas por alguns Estados, a maioria relamente está sucateada. Não só em estrutura e orçamento, mas também em relação ao  número de funcionários. Então, a capacidade de ofertar o serviço em maior escala é baixa", observa o pesquisador do Ipea.

Os dados dos Censos Agropecuários de 2006 e 2017 indicam que nas áreas que compõem a fronteira agrícola do Matopiba, ao contrário do restante do Nordeste, houve crescimento na adoção de adubos e  defensivos – processo que pode ter se acentuado nos últimos anos, agravando as desigualdades no campo, observa o pesquisador do Ipea.

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“Nos últimos dez anos, definitivamente, começou a se falar muito em Matopiba, coisa que até 30 anos atrás não existia, com uma penetração cada vez maior desse modelo do Centro-Sul. E boa parte do Matopiba se localiza na região Nordeste, o que é mais um foco de contraste muito nítido”, pontua Castro.
Source: Rural

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