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Revogada há mais de um ano, a portaria editada pelo Ministério do Meio Ambiente em abril do ano passado, que regularizava áreas de Mata Atlântica desmatadas e ocupadas até julho de 2008, abrindo a possibilidade de cancelamento de multas, continua alvo de disputa entre produtores rurais e Ministério Público Federal (MPF). Baseada numa mudança de interpretação da Advocacia-Geral da União (AGU) sobre a sobreposição ou não do Novo Código Florestal à Lei da Mata Atlântica, a orientação dada pela portaria continua sendo seguida pelas superintendências estaduais do Ibama, o que levou à abertura de ações civis públicas por parte do Ministério Público em São Paulo, Paraná e Santa Catarina.

Lei da Mata Atlântica determina área de preservação permanente de 20% em propriedades rurais (Foto: Pixabay)

 

“Quando a gente entrou com essas ações diferenciadas, com questões diferentes de cada Estado, ao invés de termos a contestação assinada por procuradores em cada um dos Estados, houve um direcionamento dessas ações para Brasília e quem contestou foi a AGU de Brasília – o que nos indica que continua existindo uma orientação, embora não mais vinculada a uma portaria”, relata a procuradora da República em Santa Catarina, Analúcia Hartamann, ao comentar decisão da 6ª Vara Federal de Florianópolis acatando a um pedido de antecipação de tutela proposto pelo Ministério Público Federal e pelo Ministério Público Estadual para que o Instituto do Meio Ambiente do Estado (IMA) e o Ibama sigam as determinações da Lei da Mata Atlântica no Estado.

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A sentença, proferida em maio deste ano, conclui que “a Lei da Mata Atlântica está em pleno vigor, não tendo sido revogada pelo Código Florestal” e que, por se tratar de norma especial, com a finalidade de proteger especificamente a Mata Atlântica, só poderia ser revogada por lei específica, que trate do bioma em questão. Com isso, a justiça proibiu a homologação do Cadastro Ambiental Rural (CAR) de propriedades com áreas desmatadas além da previsão legal após setembro de 1990 sem que haja a celebração de um termo de compromisso para a recuperação ambiental dos 20% de reserva legal previstos na lei.

A decisão desagradou o setor agropecuário, que enviou carta às autoridades catarinenses apontando que traz “enorme insegurança jurídica e problemas sérios para a produção agropecuária”.

“A sentença proferida veda a homologação do CAR pelo Instituto do Meio Ambiente do Estado de Santa Catarina – IMA, em propriedade rural que esteja inserida em área pertencente ao bioma Mata Atlântica, que, no caso de SC, significa dizer todo o território catarinense. Ou seja, o agropecuarista que aqui produz não poderá contar com esse instrumento para obter financiamento a partir de agora, no limiar da próxima safra”, destacam os presidentes da Federação da Agricultura e Pecuária do Estado de Santa Catarina (Faesc), da Federação dos Trabalhadores na Agricultura do Estado de Santa Catarina (Fetaesc),  da Organização das Cooperativas do Estado de Santa Catarina (OCESC) e  Federação das Cooperativas Agropecuárias do Estado de Santa Catarina (Fecoagro).

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“Na prática, os ruralistas alegam que quem fez o uso de área de preservação permanente até 2008 poderia ser dispensado de recuperar essa área porque o Código Florestal deu anistia. Mas o Código Florestal não deu anistia para áreas da Mata Atlântica e a lei não foi revogada, então o proprietário que desmatou na Mata Atlântica, independente do Código Florestal, tem que restaurar a área de preservação permanente. E eles não querem restaurar, eles querem que a área seja anistiada”, resume a diretora de Políticas Públicas da SOS Mata Atlântica, Malu Ribeiro. 

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Na opinião dela, a portaria publicada pelo Ministério do Meio Ambiente causou uma “confusão proposital”. “Os ministérios públicos e ONGs questionaram a decisão de Salles, e aí veio o escândalo da reunião ministerial sobre passar a boiada e isso o levou a revogar o despacho. Mesmo assim, [o Ministério do Meio Ambiente] fez um questionamento ao STF, se valia a Lei Espacial da Mata Atlântica ou o Código Florestal”, destaca Malu.

Com uma Ação Direta de Inconstitucionalidade no Supremo Tribunal Federal e uma mudança na orientação da Advocacia Geral da União, as superintendência do Ibama nos Estados e alguns órgãos ambientais estaduais continuaram acatando à intepretação dada pela portaria publicada em abril. “Essa inclusive foi a informação que o superintendente do Ibama em Santa Catarina nos deu: de que ele estava vinculado a uma orientação da AGU. Não mais uma portaria, mas uma orientação da AGU”, lembra a procuradora Analúcia.

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Com apenas 12% de sua vegetação ainda preservada, a Mata Atlântica registrou aumento de quase 30% na taxa de desmatamento entre 2018 e 2019. De toda a supressão de vegetação, 71% ocorreu em 100 municípios que respondem por apenas 3% das 3.429 cidades inseridas no bioma, conforme dados da Fundação SOS Mata Atlântica e do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe).

Já de acordo com dados do Mapbiomas, entre 2000 e 2019, 20% do bioma teve alterações de florestas maduras para florestas mais jovens e isso ocorre, principalmente, entre o centro-sul do Paraná, Santa Catarina e a divisa entre Minas Gerais e Bahia.

“Na verdade há uma falta de conhecimento da importância dessas áreas de preservação permanente, principalmente no que diz respeito à preservação da agua. Nós estamos passando por uma mudança climática muito violenta, já existe falta de água em vários locais do país, e os proprietários rurais pretendem mais e mais exceções para poder desmatar áreas de preservação permanente que, em sua maioria, principalmente no interior do Estado, servem para proteção de nascentes e de cursos d’água”, lamenta a procuradora da República em Santa Catarina.

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Source: Rural

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