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Em franca expansão nos últimos dois anos, o mercado de crédito de carbono tem despertado a atenção de um dos setores mais acusados de contribuir para o aumento das emissões de gases de efeito estufa: o agronegócio.

Segundo levantamento realizado pela Ecosystem Marketplace, o mercado voluntário, do qual produtores e agroindústrias poderiam participar, cresceu 35% em 2020 – ano em que gigantes do setor como JBS, Marfrig, SLC Agrícola e Bayer também anunciaram seus planos de descarbonização.

Árvores em sistema ILPF (Foto: Marcelo Min/Fotogarrafa/Ed. Globo)

 

“Com esses compromissos das empresas de se tornarem carbono zero ou pelo menos terem metas de descarbonização, o mercado vem tomando uma nova velocidade”, revela Mariama Vendramini, diretora para o Brasil da EcoSecurities.

A empresa foi criada em 1997 com foco no desenvolvimento de projetos de carbono e viu esse mercado passar por altos e baixos. Depois de coordenar mais de 700 projetos em 2009, um ano antes do fracasso das negociações da COP15, conferência da Organização das NaçõesUnidas sobre mudanças climáticas, realizada em Copenhague, Dinamarca, jogar um balde de água fria nas negociações.

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A empresa passa hoje por uma nova onda de crescimento, acompanhando os anúncios de compromissos de descarbonização de empresas e governos. O novo momento, contudo, é diferente do cenário vivido nas décadas passadas. “Existe um novo foco para soluções baseadas na natureza, que são projetos de reflorestamento, conservação e outras iniciativas que premiam ou subsidiam mudanças de práticas no agronegócio ou na pecuária”, conta a executiva.

Entre as iniciativas elegíveis estão a recuperação de pasto degradado, a integração lavoura-pecuária-floresta, a recuperação de áreas de preservação permanente, entre outras. “Tudo isso tem sido alvo de interesse por parte de produtores e investidores compradores desses créditos, porque é uma nova fronteira a ser explorada”, conta.

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Cruzar essa fronteira, contudo, não tem sido fácil para o setor agropecuário – sobretudo noBrasil. “O grande empecilho que a gente tem é uma barreira técnico-científica num primeiro momento, que é saber como mensurar, verificar e reportar que aquele carbono está ficando no solo”, explica Fabio Passos, diretor do negócio de carbono da Bayer para a América Latina, ao destacar a falta de participação do agronegócio no mercado de crédito de carbono. Junto com a Embrapa, a empresa está trabalhando para criaruma metodologia de mensuração das emissões do setor, num projeto que envolve 414 produtores.

Atualmente, o mercado de carbono já conta com protocolos de certificação próprios, o mais recente deles criado em outubro do ano passado, mas ainda não teve nenhum projeto aprovado.

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“Está todo mundo ainda no nível de piloto, entendendo como vai ser o processo de mensuração de carbono na agropecuária. Primeiro, porque ele é custoso, e a tecnologia vem tentar reduzir um pouco esse custo demensuração”, observa Guilherme Raucci, diretor de impacto da Agrosmart.

A startup, que atua na coleta e análise de informações agronômicas, incluiu entre as suas soluções a mensuração das emissões de carbono também, visando principalmente aos produtores que queiram compensá-las.

Mata contribui para sequestro de carbono da atmosfera (Foto: Marcelo Min/Fotogarrafa/Ed. Globo)

 

A emissão dos créditos, porém, ainda é algo distante. “Primeiro tem de ser feito um baseline, apontando o seu padrão de emissões. Em geral, usa-se uma média dos últimos três anos. A partir daí, desenvolve-se um projeto que será submetido a uma certificadora e, em seguida,
auditado para comprovar que aquela redução foi feita”, explica Raucci.

Mariama calcula que o custo dessa auditoria gira em torno de R$ 150 mil, ao que se somam os custos de desenvolvimento e implementação do projeto. Em muitos casos, o crédito gerado é insuficiente para cobrir os custos ou não gera retorno algum.

Raucci afirma que tem um pouco de receio de que o produtor imagine que vai ter mais um ativo para rentabilizar na lavoura, e pode não ser bem assim para todos. Acredito que vai ter de ser feito um arranjo muito mais regional, entre cooperativas, entre grandes produtores,
para você ter uma escala de impacto que é importante também”, completa.

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“Fica muito difícil gerar crédito num cenário de aumento do desmatamento, como estamos vendo agora. Falta uma estratégia mais clara e concreta sobre o que queremos para a Amazônia e como queremos valorizar esse ativo ambiental”, observa o gestor ambiental Pedro Soares, líder da Força-Tarefa Mercado de Carbono da Coalizão Brasil Clima, Florestas e Agricultura.

Ele lembra que metade das emissões brasileiras de carbono hoje se origina no desmatamento e outros 25% na atividade agropecuária. “O crédito de carbono está associado a reduzir o desmatamento. Então é muito difícil para o Brasil negociar créditos ou solicitar créditos com o desmatamento em alta”, completa Soares.

Animais criados no sistema de integração com florestas (Foto: Getty Images)

 

A falta de uma regulação central desse mercado também prejudica a emissão dos créditos de carbono. Em 2019, por exemplo, o preço médio pago por compradores europeus por créditos gerados no Brasil foi de cerca de US$ 2, valor abaixo do praticado em países como Uganda (US$ 3,79), Quênia (US$ 3,97), Guatemala (US$ 3,65) e Indonésia (US$ 6,85).

“Como não é regulamentado, é um mercado em que o crédito em si não é muito valorizado. É a mesma coisa que um mercado paralelo, em que você tem uma segurança para o investidor, mas sem o controle de uma série de coisas que teria num mercado mandatório”, explica o pesquisador sênior do Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia (IPAM) Paulo Moitinho.

Ele defende que esses projetos sejam realizados em âmbito jurisdicional, com a coordenação de órgãos reguladores centrais que permitam mensurar os benefícios gerados em escala. “Há uma demanda mundial, e onde há demanda tem alguém querendo fazer o projeto para vender algum crédito. Só que, sem regulamentação, a gente sempre terá um mercado meio duvidoso, onde o valor da tonelada de carbono, que poderia ser de US$ 10, está menor que US$ 1”, completa Moitinho.

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Source: Rural

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