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Soja sendo plantada em área de renovação de canavial, no Estado de São Paulo (Foto: Renato Barbeiro/Arquivo pessoal)

 

A área plantada de soja nesta safra em São Paulo passou de 1,1 milhão de hectares, segundo dados do Instituto de Economia Agrícola (IEA), o que representa 250 mil hectares a mais em três anos. Dez por cento desse crescimento pode ser atribuído a uma parceria entre usinas sucroalcooleiras e uma cooperativa, que “importou” produtores do Paraná para semear o grão em áreas de renovação de canaviais no noroeste paulista.

O projeto da Cocamar Cooperativa Agroindustrial, com sede em Maringá (PR), começou com 19 famílias de produtores considerados de bom desempenho agronômico para a semeadura de cinco hectares na safra 2019/2020 em terras arrendadas da Usina Cocal, nas unidades de Paraguaçu Paulista e Narandiba. Nesta safra, já com 100 produtores e mais duas usinas participantes (Atvos, de Teodoro Sampaio, e Umoe Bionergy, de Sandovalina), a área quintuplicou. O plano é estabilizar entre 35 mil e 40 mil hectares.

Boa parte das terras que recebem a soja é de plantio de cana por meiosi (método inter-ocupacional simultâneo). O viveiro de mudas pré-brotadas fica dentro da própria área de renovação. Enquanto as mudas crescem, a soja é plantada no intervalo de 30 metros das linhas.

“Áreas que antes ficavam paradas agora recebem a soja, que traz renda para produtor, usina e cooperativa e benefícios para a cana que será plantada na sequência”, diz Marco Antonio de Paula, gerente de negócios da Cocamar.

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Segundo ele, o modelo de negócios é altamente sustentável e derrubou o medo da usina de que os herbicidas da soja pudessem estragar a terra da cana. Funciona assim: a usina arrenda sem custos a terra para a cooperativa, que subarrenda para os produtores.

“É um ganha-ganha-ganha. Além do benefício agronômico que a soja deixa para a cana, a usina leva um percentual se a produtividade da soja for boa. O agricultor tem a oportunidade de expandir seu cultivo e renda e conta com um seguro contratado pela cooperativa para garantir os custos com insumos e gastos operacionais, em caso de frustração de safra. A cooperativa vende os insumos, recebe a soja colhida e cumpre sua missão de oferecer alternativas sustentáveis para o associado.”

O gerente conta que os produtores foram escolhidos entre os 14 mil cooperados levando em conta bom histórico agronômico e a presença de filhos para sucessão familiar na agricultura.   

Oportunidade

Wilson Antonio Palaro, de 63 anos, foi um dos 19 pioneiros. Produtor em 170 hectares (ou 70 alqueires, medida mais usada pelos paranaenses) no município de Floresta há mais de 40 anos, Palaro e os três filhos semearam 290 hectares em Narandiba (SP) no primeiro ano do projeto e 425 hectares na safra que estão começando a colher neste mês.

“Não tem mais terra para expandir no Paraná. Então, a oportunidade oferecida pela Cocamar foi muito boa. Obtive um bom lucro no primeiro ano e conta muito o fato de termos assistência técnica de agrônomo da cooperativa e seguro. A gente não planta para colher seguro, mas se acontecer, estamos respaldados”, disse Palaro, que cuida da linha de frente da produção, enquanto os filhos Tiago, Letícia e Victor coordenam as compras e vendas.

Renato Martins Barbeiro, cooperado há 20 anos, entrou no segundo ano do projeto. Em Maringá e Nova Esperança, ele semeia 212 hectares de soja com o pai, Ademir, e o irmão Edson. Nas terras da Umoe Bionergy, plantou nesta safra 415 hectares, sendo quase 300 em áreas de meiosi. “É uma experiência nova pra gente plantar em meiosi. Tem que ter cuidado redobrado com a aplicação dos defensivos porque não pode prejudicar a cana que está ao lado.”

Barbeiro diz que sua produtividade no Paraná no ano passado foi de 45 sacas por hectare. Em Sandovalina, ele espera colher de 55 a 60 sacas por hectare.

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“Quando tem terra para arrendar na nossa região, o preço é muito exagerado”, diz Fabiano Carlos Rossi, que cultiva 120 hectares nos municípios de Primeiro de Maio e Sertaneja, para explicar sua adesão ao projeto da Cocamar. Ele, o irmão e o pai se deslocaram 150 quilômetros para plantar 278 hectares em Narandiba no primeiro ano. No segundo, mais que dobraram a área, chegando a 654 hectares.

“A família vai crescendo e a gente tem que buscar caminhos para aumentar a renda. Tem sido muito satisfatório. Colhemos 158 sacas por alqueire na primeira vez ante as 147 sacas no Paraná. Ficou bom para os três lados.” Neste ano, ele prevê uma produtividade um pouco menor porque o plantio foi atrasado pela falta de chuvas. “Mas só vou saber na hora em que colocar as máquinas.”

A rotina das três famílias paranaenses quando estão em São Paulo é semelhante: todos alugam casa ou sítio na região e pedem comida em restaurantes para entrega direto na roça. Os Palaro alugam todos os equipamentos para plantio, tratos e colheita. Já os Barbeiro e os Rossi trazem o maquinário próprio do Paraná.

Sinergia

“A ótima sinergia entre a soja e a cultura da cana, o fato de ampliarmos o plantio por meiosi e o bom relacionamento com a Cocamar foram determinantes para fecharmos o acordo” diz Paulo Zanetti, CEO da usina Cocal, pioneira do projeto. Antes da parceria com a soja, a usina fazia rotação de culturas com milheto e crotalária ou terceirizava a área para a produção de amendoim. 

Segundo Zanetti, a cana tem uma série de benefícios quando é plantada após a soja. “Por experiência, sabemos que a soja fixa o nitrogênio e estrutura o solo com seu sistema radicular. Vemos que a cana nasce mais vigorosa, se beneficiando dos tratamentos foliares da soja.”

Soja é usada na rotação com cana. Fixação de nitrogênio no solo possibilitada pela oleaginosa é vista como benéfica para a gramínea (Foto: Renato Barbeiro/Arquivo pessoal)

 

O CEO afirma que a responsabilidade junto ao produtor é da cooperativa, mas a usina supervisiona os trabalhos, especialmente em suas áreas de meiosi, para não haver contaminação da rua-mãe. O manejo da soja utiliza o defensivo glifosato, danoso para a cana.

Por conta dos resultados, a Cocal mais que dobrou o arrendamento de suas terras para a Cocamar no segundo ano, passando para 11 mil hectares, sendo 70% em áreas de meiosi. “Tivemos bons resultados no primeiro ano, apesar dos atrasos da chuva, e esperamos uma produtividade ainda maior neste ano para a soja e também para a cana.”

A Cocal, que processa 8,7 milhões de toneladas de cana por ano, produz etanol, açúcar, energia, biogás e leveduras, com um faturamento de R$ 2 bilhões por ano. “O faturamento com a soja não é muito significativo, mas é mais um produto da usina”, ressalta Zanetti.

Soja avança em SP

Dados do Centro Varietal de Cana do Instituto Agronômico de Campinas (IAC) apontam que, nos últimos três anos, o percentual da soja em área de reforma de canaviais paulistas passou de 16% para 38%. O pesquisador Denizart Bolonhezi , do IAC, estima que há potencial para São Paulo chegar a 1,5 milhão de hectares de soja em pouco tempo.

“Com os preços da soja, daqui a pouco teremos condomínios de casas sendo derrubados para plantar soja”, brinca. Atualmente, o preço da saca de 60 kg é de R$ 160. No início de 2020, valia R$ 87.

Gustavo Chavaglia, presidente da Associação dos Produtores de Soja de São Paulo (Aprosoja-SP), diz que a produção no Estado chega a 4 milhões de toneladas e tende a crescer devido ao preço, que estimula o produtor a plantar mais, e ao aumento de renovação de canaviais com soja no noroeste paulista.

“Claro que há casos também de produtores de cana que não foram bem remunerados pelas usinas sucroalcooleiras e mudaram de cultura. Hoje, devemos ter de 600 mil a 700 mil hectares de soja como atividade principal em São Paulo.”

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Chavaglia ressalta que, no último ano, a mudança para soja teve um recuo por conta dos altos preços do boi e pelo fato de açúcar e etanol estarem recuperando seus preços.

Com área plantada de cana de cerca de 10 mil hectares em Goiás (8 mil hectares), São Paulo (na região de Ituverava) e Minas, ele diz que renova cerca de 1.700 hectares com a soja por ano. “Mas sempre tenho voltado para a cana e acredito em preços melhores neste ano, já que houve aumento do petróleo.”

Sobre a safra de soja que está sendo colhida, ele diz que, apesar do atraso no plantio, causado pela falta de chuvas, São Paulo foi um dos menos prejudicados do país e deve ter perdas de 3% a 5%. Foi também o Estado com menos vendas antecipadas, o que é bom para o produtor, que pode aproveitar os preços maiores.

“Só 40% ou 50% dos produtores paulistas venderam soja antes da colheita. Eu vendo 20% no máximo e meu conselho é sempre fechar contratos antecipados aos poucos porque trabalhamos em uma indústria a céu aberto”, diz.

Chavaglia acrescenta que o produtor sempre deve desconfiar quando as tradings incentivam o fechamento de muitos contratos de venda antecipada. “Certamente, com sua estrutura e seus especialistas de mercado, as tradings estão vendo algo no futuro que vai trazer lucro para elas.”

Pecuária

Comemorando os resultados da parceria com as usinas de açúcar e etanol, a Cocamar resolveu expandir neste ano e levar seu plano também para reforma de áreas de pastagem em São Paulo e Mato Grosso do Sul. O projeto-piloto atinge 2.000 hectares, com potencial para chegar a 15 mil. “O pecuarista não tem aptidão para fazer a renovação de suas pastagens. Então, entramos com a soja e nossa expertise”, diz o gerente da cooperativa.

Os contratos com os criadores são firmados por quatro anos. A partir do segundo ano, o sojicultor divide o lucro com o dono da terra.

A cooperativa tem 90 unidades operacionais para receber soja, sendo cinco em São Paulo e três no Mato Grosso do Sul. Os grãos do projeto com as usinas paulistas são recebidos na unidade de Iepê (SP), que fica a mais de 360 km da região. No ano passado, Iepê recebeu 124 mil toneladas de soja ante a média anterior de 58 mil. Neste ano, para facilitar a logística, a Cocamar está construindo uma unidade em Mirante do Paranapanema.
Source: Rural

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