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Plantação de cacau na Amazônia (Foto: Kevin Arnold/TNC)

 

Na Cooperativa Alternativa Mista dos Pequenos Produtores do Alto Xingu (Camppax), no Pará, todos os agricultores familiares responderam ao Cadastro Ambiental Rural (CAR), segundo a organização. Os agricultores familiares, que vivem do cultivo do cacau e da coleta de castanha-do-pará, agora esperam a vigência dos benefícios do Programa de Regularização Ambiental (PRA), regulamentado em outubro do ano passado pela Secretaria de Estado de Meio Ambiente e Sustentabilidade.

Mas essa não é a realidade da maioria dos pequenos produtores de Pará e Mato Grosso. Eles são 17% menos propensos a aderirem ao programa de regulamentação em relação aos grandes fazendeiros, embora correspondam à maior parte dos respondentes ao CAR (89% no PA e 78% no MT), segundo trabalho publicado no Journal of Enviromental Management.

Para chegar a essa conclusão, pesquisadores da Universidade Federal de Minas Gerais analisaram cerca de 97 mil questionários do Cadastro Ambiental Rural (CAR), que recebeu inscrições até 31 de dezembro de 2020, para saber se fazendeiros iriam perseguir a regularização ambiental na Amazônia.

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Cerca de 55% dos agricultores analisados afirmaram que escolheriam manter reservas legais dentro da propriedade rural, dos quais mais de 70% preferem a "regeneração natural", enquanto os demais preferem "plantar árvores". Apesar de os restantes 45% dos agricultores manifestaram preferência por compensar seu déficit em outras propriedades em vez de manter a reserva legal, 17% deles não deram mais detalhes sobre como pretendem compensar. Isso pode indicam falta de conhecimento e / ou limitação dos respondentes sobre o CAR questionário.

Conforme a Lei de Proteção da Vegetação Nativa, de 2012, as reservas legais da Amazônia Legal devem equivaler a 80% da área dos imóveis situados em área de florestas;  35% em cerrados; e 20% em campos gerais.

Segundo o professor Raoni Rajão da UFMG, especialista em gestão ambiental e um dos autores do estudo, a pesquisa confirmou o esperado: “produtores grandes têm mais acesso à assistência técnica e, por isso, tendem a saber mais sobre a situação ambiental de seus imóveis do que os médios e principalmente os pequenos”.

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Raimundo Santos,  um dos cooperados da CAMPPAX, conta que a cooperativa foi uma exceção porque discute o respeito às regras ambientais com seus membros desde 2013, logo após a aprovação do novo Código Florestal, que trouxe a figura do CAR. A produção da cooperativa baseia-se em práticas agroecológicas e no princípio de conservação da floresta, com geração de renda e melhoria da condição de vida dos produtores.

A legislação de proteção à vegetação nativa em vigor propõe duas formas de preservação da vegetação nativa. Quando as reservas legais são mantidas dentro da propriedade rural, as medidas são chamadas de restauração e recebem as maiores anistias previstas no texto da lei. Se mantidas fora da propriedade, são de compensação.

A pesquisa da UFMG mostra também que o pequeno produtor, além de ter menos déficits de reserva legal, tende mais a restaurar a vegetação em sua propriedade. Já os grandes e médios preferem a compensação, seja a partir do aluguel de florestas ou da compra de áreas florestadas.

A principal autora do estudo, Rayane Pacheco, doutoranda do Laboratório de Gestão de Serviços Ambientais, integrado ao Departamento de Engenharia de Produção da Escola de Engenharia da UFMG, explica que esse movimento “está ligado sobretudo aos custos de oportunidade da restauração.” Ela emenda: “é importante que os instrumentos de regularização extrapropriedade sejam regulamentados em nível estadual e a restauração seja viabilizada para os casos em que a compensação não é permitida”.

Ainda de acordo com Rayane Pacheco, os pequenos produtores não sabem sobre as anistias trazidas pela lei de 2012, e por isso tendem a achar que devem recuperar uma área maior de reserva legal. “Isso sugere que na prática a resistência à implementação do programa de regularização ambiental deve ser menor”, avalia.

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Outras cooperativas no Pará

O Sistema OCB/PA – que reúne cooperativas de todo o Estado – relata que 80% dos cooperados paraenses estão registrados no CAR. No momento, estão registradas na entidade mais de 60 cooperativas, num total 6.083 membros, que precisam se adequar às novas exigências de rastreabilidade dos produtos agrícolas e pecuários.

A entidade considera  o Cadastro Ambiental Rural essencial para a regularidade da propriedade dos cooperados e, por consequência, das cooperativas, pois é uma necessidade de mercado para estarem aptas a comercializar sua produção.

"Fomos procurados pela empresa que ganhou chamada pública da SEMAS para a emissão de 18 mil CARs dentro do Estado para indicarmos as cooperativas dentro da região. Estamos fazendo esse contato para possibilitar o cadastramento aos cooperados de forma gratuita", afirmou o presidente do Sistema OCB/PA, Ernandes Raiol.

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Embora tanto os resultados do Sistema/OCB quanto os do estudo da UFMG sejam otimistas, ao mostrarem grande número de produtores interessados na regularização, Raoni Rajão considera o avanço da implementação da lei pouco provável no atual contexto.

“Com as muitas prorrogações no prazo de adesão ao CAR e também no programa de regularização ambiental, e com o risco de mudanças na lei com novas anistias, os produtores ficam receosos de assumir o custo da regularização. Isso ocorreu entre 2004-2012, quando muitos produtores, principalmente em Mato Grosso, investiram na recuperação de áreas de preservação permanente em faixas de no mínimo 30 metros, para depois a lei reduzir essas áreas para 15 metros. Quem foi responsável e seguiu a lei na prática perdeu área produtiva, enquanto os irregulares foram premiados pela anistia da lei de 2012”, recorda o professor.

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Onde o programa pode melhorar

Estudo da UFMG também indica que fazendas em posse de empresas são as que menos buscaram o registro no CAR, uma vez que podem buscar com auxílio de advogados outros meios para conseguir a regularização ambiental. Essas mesmas propriedades, voltadas sobretudo às produções de soja, milho ou algodão, também procuram métodos de compensação.

O trabalho optou por analisar Pará e Mato Grosso por serem dois dos grandes produtores de commodities no Brasil e os maiores desmatadores da Amazônia, além de estarem em uma região de fronteira agrícola, segundo Rayane. Os Estados também são pioneiros na regularização ambiental e monitoramento do desmatamento em propriedades rurais.

Para a pesquisadora, existem dificuldades não apenas para o cumprimento da lei por parte dos produtores, mas também para o Estado avançar em aspectos técnicos. “O avanço na área depende de definições de parâmetros para restauração e compensação, insumos e estrutura para atender a regularização ambiental dos imóveis rurais, estratégias viáveis de monitoramento das medidas que serão adotadas e a efetiva condução do processo”.

Raoni Rajão cita como bom exemplo os Acordos de Integração Regional da política climática da União Europeia que contêm estimativas dos custos e benefícios para os diferentes setores da economia. “Estudos como o nosso são importantes pois fornecem para os tomadores de decisão elementos concretos para a elaboração de normativas e estratégias de implementação mais aderentes à realidade no campo”, defende.

*sob supervisão de Venilson Ferreira, editor executivo, e de Raphael Salomão, editor-assistente
Source: Rural

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