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(Foto: Marcos Camargo/Editora Globo)

 

 

 

 

Entramos no Século 21 com a questão ambiental como prioritária e a clara noção da necessidade de preservação florestal nas propriedades rurais. As novas percepções da sociedade, aliadas às divergências de interpretação de temas antigos, agora sob um novo enfoque, exigiam uma nova legislação.

Após amplo debate no Congresso Nacional, a primeira versão do atual Código Florestal foi aprovada na Câmara Federal por 410 votos contra 63. No Senado, por 59 a 7; a versão final foi aprovada no dia 25 de maio de 2012. O acordo político obtido deveria ter sido visto como a consolidação do que existia de positivo e o desenvolvimento de regras para preservação florestal futura. Infelizmente não foi o que ocorreu.

Decreto de 1934 ofereceu os primeiros fundamentos do que seria um Código Florestal, possibilitando a derrubada de 75% da área coberta por mata. Foi substituído 30 anos depois pela Lei 4.771 de 1965 que inovou estabelecendo percentuais de proteção conforme a região do país. Foi sendo gradativamente modernizado em especial a Lei 7.803 de 1989 que introduziu de maneira definitiva o conceito de Reserva Legal (RL) tratada como percentual de área mínima a ser preservada. Não somente as áreas de mata, mas qualquer que fosse a forma de vegetação existente na área inclusive as áreas de cerrado.

Evoluímos também no conceito de Áreas de Preservação Permanente (APPs). No passado a orientação técnica indicava desmatar até a margem do rio em função de considerações sanitárias. Posteriormente se evoluiu para uma faixa à margem dos rios, nascentes e lagos.

Também nas áreas de grande declive o cultivo era usual. Encontramos áreas centenárias de vitivinicultura da serra gaúcha ou cafezais mineiros em declives acentuados. A preocupação com a erosão do solo levou a legislação a incluir maior restrição. Destaco, foi o desenvolvimento do conhecimento e a preocupação ambiental que levaram à evolução da legislação.

Infelizmente o Código Florestal foi fortemente judicializado. Logo após a sua aprovação, o ambientalismo, junto com o Ministério Público Federal, entrou no Supremo Tribunal Federal (STF) com diversas Ações Direta de Inconstitucionalidade (ADIN), contestando artigos do Código Florestal. Extenso período de insegurança jurídica.

Os principais pontos de contestação, embora não sejam os únicos, se referem à questão do cômputo das APPs no cálculo do percentual da RL da propriedade; e o tratamento da supressão de vegetação nativa respeitando os percentuais de RL previstos pela legislação em vigor à época em que ocorreu a supressão, dispensando a recuperação para os percentuais da nova legislação.

Muitas vezes são apresentados como uma anistia a crimes passados. Crimes tributários, eleitorais ou mesmo penais prescrevem. Aqui, porém, não se trata de prescrição de crimes de qualquer espécie. A evolução do conhecimento científico e a compreensão da sociedade nos temas ambientais avançou. A legislação foi alterada.

O conceito político das áreas consolidadas foi de avançar, olhar para frente, respeitar o passado caminhando para o futuro. Remoer o passado somente atrasa o processo. O Código Florestal foi desenhado, votado, julgado, atingindo situações consolidadas no passado olhando para o futuro.

O Código Florestal obrigou o proprietário a apresentar declaração de como está sua propriedade através do Cadastro Ambiental Rural (CAR). Milhões de CARs foram realizados pelos milhões de proprietários rurais estando essa massa de informações na nuvem eletrônica. O CAR, uma imagem estática da propriedade, expõe eventual obrigação para atender à nova legislação.

A validação dos dados apresentados pelos proprietários e a pactuação dos compromissos de enquadramento ambiental previstos no Código Florestal exigem a análise por parte dos Poderes Públicos, em particular o Estadual. São milhões de CARs a serem analisados, e compromissos de enquadramento a serem acordados.

O atraso porem é imenso. Indicam estarem desenvolvendo um esforço em automatizar o trabalho, pois falta capacidade burocrática nas autoridades ambientais estaduais responsáveis pelas análises. Mesmo assim será muito difícil acompanhar a urgência necessária. Sequer os perímetros das propriedades foram analisados. Os perímetros já permitiriam verificar ocorrências de superposições de áreas junto a áreas e reservas públicas e terras indígenas. Era um importante passo que deveria ser priorizado.

Perímetros validados permitiriam conhecer o proprietário de área desmatada de maneira diária identificado pelo permanente sobrevoo dos satélites, fotos e análise com inteligência artificial. Isso já justificaria o esforço do CAR.

Enquadrar as propriedades, e não uso a palavra regularizar de maneira proposital, pois implicaria em falar em irregularidades que não é o que ocorre, é um desafio de grande importância. As APP, precisam ser destacas e incluídas em processo de regeneração representando importantíssimo esforço ambiental. Exigem o correto conhecimento dos cursos das águas, suas nascentes, lagos e áreas úmidas além das declividades. Automatizar isso está longe de trivial.

Reconhecer as áreas consolidadas exigem o conhecimento do processo de ocupação em períodos que não tínhamos fotos de satélites ou mesmo de aviões como eram realizadas no passado. Mapas antigos não tem o detalhe necessário para validar de maneira automática desmatamentos. Será preciso critério e bom senso olhando para o futuro.

O Código Florestal de 2012 coloca o Brasil na vanguarda na questão ambiental no que se refere as florestas. Essencial porem ser cumprido o que não está ocorrendo. Perdemos já muito tempo divergindo. Não podemos agora perder mais tempo com dificuldades burocráticas. É preciso avançar mesmo que um passo por vez. O desmatamento ilegal precisa ser eliminado.

*Pedro de Camargo Neto é pecuarista e ex-secretário de Produção e Comercialização do Ministério da Agricultura

As ideias e opiniões expressas neste artigo são de responsabilidade do seu autor e não representam necessariamente o posicionamento editorial da revista Globo Rural
Source: Rural

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