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(Foto: Getty Images)

 

O desafio começou em 2017. A meta era assar em 17 churrasqueiras diferentes. No primeiro dia do ano, a largada foi com picanha mal passada. No último, entre lugares inéditos e reprises, média de quase um churrasco por semana e a "glória" da 18ª churrasqueira distinta no currículo. Um recorde. Tudo isso 11 meses antes de me tornar vegano.

Eu fazia piada com o veganismo. Insinuava que uma amiga vegana comia carne escondida. Postava vídeos da churrasqueira fumegando no Instagram. Na hora da foto, exibia a faca ou cruzava os espetos com cara de mau. Sou gaúcho, filho e neto de churrasqueiros de alto calibre, modéstia à parte. No colégio, sempre fui o assador da turma.

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Que tal um churrasquinho? "Deixa que eu compro tudo e depois dividimos o valor", eu dizia animado. “Mas não dá muito trabalho sair, comprar, assar?”, perguntavam os amigos. "Jamais! Eu gosto de fazer isso", respondia, com o peito estufado.

O começo da mudança foi uma reeducação alimentar que comecei ainda em 2017, preocupado com a saúde. O motivo: colesterol alto, com necessidade de tomar medicamento para escapar de um futuro infarto. E lá estava eu, com 31 anos, 74 quilos e destinado a tomar um comprimido por dia para o resto da vida.

A real é que experimentar novos alimentos me fez baixar a guarda. Depois, finalmente resolvi encarar os documentários sobre como a carne é feita – aqueles que dá medo de ver, sabe? – e descobri que a picanha que eu assava – e amava – vinha do olhar de um animal aflito por saber que é próximo da fila do abate.

Eu optei por mudar. Você decide o que é melhor para a sua vida. Só me permita, por favor, explicar o meu porquê

 

 

Mais: os laticínios e seus derivados, como o queijinho “indispensável", exigiam que uma vaca fosse engravidada repetidas vezes e, depois, separada do filho para que seu leite fosse repassado para nós, humanos.

Também aprendi que uma dieta à base de vegetais melhora a saúde – há até atletas de elite veganos em várias modalidades, como Lewis Hamilton, hexacampeão e recordista de vitórias na Fórmula 1. E que o colesterol só entra no corpo humano se eu consumir produtos de origem animal.

Em novembro deste ano, fará dois anos que decidi não fazer mais parte disso. E aí você pode estar pensando: "agora vai querer me convencer, aposto". Não. Eu optei por mudar. Você decide o que é melhor para a sua vida. Só me permita, por favor, explicar o meu porquê.

A verdade é que não existe comida vegana. Existe comida. Só. A única diferença é que um vegano não come produtos de origem animal

 

No meu caso, foram três os principais motivos. O primeiro foi a saúde – meu colesterol ruim caiu mais de 40% desde então. O segundo foi a exploração dos animais para me alimentar – se você tem cachorro, imagine alguém comendo a perna dele e vai entender o que estou falando. O terceiro foi o meio ambiente – comer carne tem um preço alto para o mundo onde vou criar meus filhos.

Antes de me tornar vegano, uma das minhas maiores dúvidas era o que eu iria comer. O prato sempre começava pela carne. E agora? Foi buscando informação e me permitindo experimentar que descobri o óbvio que até pouco tempo antes não enxergava: todos nós já comemos comida vegana. Você já comeu! Talvez, hoje mesmo.

Arroz e feijão, que tal? Batata frita? Assada, quem sabe? Salada com alface, tomate, pepino? Maçã, banana ou laranja, já comeu? Já usou salsinha e cebolinha para dar mais sabor? E o delicioso pãozinho quentinho com um café preto no capricho? Tudo vegano.

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A verdade é que não existe comida vegana. Existe comida. Só. A única diferença é que um vegano não come produtos de origem animal. Foi aí que entendi que ser vegano na alimentação – ou vegetariano estrito – não é se transformar em um ET, mas sim optar por não consumir carne, leite, ovo, laticínios e mel.

"Mas você não come bolo?", me perguntaram certa vez. Como, sim! São deliciosos. “Mas bolo vai ovo”. O que eu como, não. Há várias receitas maravilhosas sem ovo nem leite. E isso vale para tudo. Chocolate? Tem opção vegana. Já há até queijos e carnes vegetais com sabores inacreditavelmente idênticos aos “normais”. Falo porque eu provei.

Antes de seguir, um aviso importante: este texto não tem a pretensão de te convencer a ser vegano. Volto a dizer, a escolha é sua. Só sua. Mas saiba que é possível e, ao menos no meu caso, tornou minha vida mais saudável, deliciosa e cheia de paz no coração a cada garfada.

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Aliás, um dos momentos mais marcantes dessa mudança foi quando devolvi ao meu pai a faca que ele havia me dado para assar churrasco. Era prateada, exclusiva e pertencia ao meu avô, pai dele. Ali entendi, também, que o amor não depende do que comemos, mas de estarmos juntos com alegria e respeito.

E, acima de tudo, sem medo. Sem medo de ouvir. Sem medo de perguntar. Sem medo de ver. Sem medo de experimentar. Sem medo de compreender. Sem medo de admitir que, talvez, ainda não chegou a hora. Ou, quem sabe, como fez este ex-assador recordista, sem medo de mudar o que põe no prato.

*Leandro Becker é jornalista e editor da Revista Globo Rural
Source: Rural

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