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Fogo no Pantanal (Foto: Mayke Toscano/Secom-MT)

 

Apesar de ter defendido o agronegócio como o grande impulsionador da economia brasileira no discurso de abertura da Assembleia Geral das Nações Unidas, nesta terça-feira (22/9), o presidente Jair Bolsonaro pode ter dado um “tiro no pé” do setor, na avaliação do secretário-executivo do Observatório do Clima, Márcio Astrini. “Os concorrentes brasileiros no mercado de commodities agrícolas ficam muito gratos quando Bolsonaro fala nesses palcos internacionais”, destacou Astrini.

“Existem algumas instituições internacionais que estão certamente pulando de alegria, especialmente a associação de agricultores franceses e outras associações do tipo na Europa, que tentam implantar medidas restritivas ao mercado do agronegócio brasileiro por lá, são extremamente felizes com os discursos do Bolsonaro porque ele nega a realidade e terceiriza as responsabilidades. Isso tem um peso negativo enorme para o mercado brasileiro, pelos acordos internacionais e cai como uma luva nesses grupos protecionistas de fora para o Brasil”, completa o executivo.

A repercussão negativa pode ser prejudicial para investimentos internacionais, segundo o executivo. Astrini lembra que, agosto de 2019, algumas empresas internacionais de couro interromperam as compras do produto do Brasil. Um mês depois, 230 fundos de investimentos fizeram uma carta pública se preocupando com a situação ambiental do Brasil. Em dezembro de 2019, outros 67 fundos de investimento mandaram uma carta ao governo brasileiro, assim como documento de senadores estadunenses, parlamentares europeus e redes de supermercados da Alemanha e Inglaterra.

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As cidades de Los Angeles e Nova Iorque chegaram a fazer leis municipais para evitar o comércio de produtos brasileiros ligados ao desmatamento da Amazônia. Recentemente, investidores que movimentam trilhões de dólares questionaram o vice-presidente Hamilton Mourão sobre planos de reverter a situação e saíram de mãos vazias.

“Agora, tivemos a manifestação de oito países do bloco europeu falando que a situação de relações comerciais com o Brasil pode se complicar demais por conta da questão ambiental. O acordo Mercosul – União Europeia não só subiu no telhado como caiu de cabeça depois dessa carta dos oito países, que dizem que não querem mais discurso, e sim algo prático. Portanto, não é de hoje que esses avisos internacionais de investidores e grandes clientes do brasil estão na mesa e o governo nada faz”, destacou.

Astrini disse que a fala de Bolsonaro na ONU não surpreendeu, já que muito do que foi dito condiz com o que o governo vinha já vinha dizendo internamente no Brasil. Na área ambiental, ele classificou o discurso como “muito ruim”, especialmente em um momento delicado para o país no cenário internacional. “Ao invés do presidente (Jair Bolsonaro) apresentar um plano para o país para os problemas ambientais que a gente tem, ele resolveu criar teorias da conspiração, negar realidades e terceirizar responsabilidades”, avaliou.

Desmatamento

O executivo salientou que, desde que Bolsonaro assumiu a presidência, os alertas de desmatamento dobraram, as queimadas no Pantanal neste ano são 200% maiores e na Amazônia, mesmo com a presença do Exército, subiram 12% em relação ao ano passado, quando já houve um aumento expressivo.

“Enquanto ele falava lá na tribuna da ONU, inventando uma realidade paralela, o governo estava sendo processado no STF (Supremo Tribunal Federal), neste momento, exatamente por não usar o orçamento do Fundo Amazônia, com mais R$ 1 bilhão parados, e do Fundo Clima, com R$ 300 milhões,  no Brasil. Este ano, sobre a política ambiental direta a cargo com Ministério do Meio Ambiente, apenas 0,4% foi utilizado de todo o orçamento disponibilizado. O processo é por omissão no uso de recursos disponíveis para combater, por exemplo, o desmatamento e as queimadas”, disse Astrini, desmentindo o presidente com os números.

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Astrini contesta a fala de Bolsonaro que relaciona as queimadas na Amazônia com a atuação de "índios e caboclos". Segundo ele, apenas 7% de todo o fogo que é detectado na Amazônia ocorrem em terras indígenas. Mais de 50% desses incêndios são detectados em áreas onde o fogo está sendo usado no desmate ou para limpar remanescentes de árvores que tenham ficado na região.

Entre 2004 e 2012, o Brasil registrou uma queda de 83% no desmatamento da Amazônia. “O problema não é o tamanho da Amazônia nem a desinformação, e sim a falta de noção do governo e a falta de vontade de alguma coisa. Não existe um complô internacional, existe um complô do governo contra o meio ambiente”, destacou Astrini, afirmando que grilagem e desmatamento são crimes que sempre existiram na Amazônia.

Emissões

Em seu discurso na ONU, Jair Bolsonaro destacouque o Brasil responde por apenas 3% das emissões mundiais de gases de efeito estufa, o que coloca o país na sétima posição no ranking mundial. Se tirar a União Europeia como bloco, o Brasil fica em sexto. De acordo com Astrini, esse quadro deve mudar nos próximos períodos.

“Em 2019, a gente subiu o desmatamento na Amazônia em cerca em 34% e isso vai ter um acréscimo nas emissões do Brasil e talvez a gente tenha um patamar de contribuição um pouco maior, mas isso também depende do quanto os outros países vão emitir. Para 2020, em especial, o Brasil deve subir bastante o seu percentual. Porque o coronavírus desestimulou as economias no undo inteiro e grande parte desses maiores emissões está atrelada à economia. No Brasil não, essas emissões estão atreladas, em boa parte, ao desmatamento da Amazônia, que não gera economia positiva para o país”, explicou.

Florestas

Astrini contesta também a afirmação de que o Brasil é o país que mais preserva florestas. Segundo ele, só em 2019, o Brasil foi, incluisve, o que mais desmatou, respondendo por quase um terço das perdas no mundo. E considerando a proporção de áreas florestais em relação ao território total, o Brasil não é o maior detentor mundial de florestas, diz o executivo o Observatório do Clima.

Dados compilados pelo Imazon e pro Pro Forest apontam que, na Rússia, país com maior cobertura florestal do mundo, as florestas representavam 34% do território nacional em 1950, e alcançaram 49% em 2010. No Brasil, em 1954, a área de florestas era de 76%, caindo para 56% em 2010. As florestas da Noruega, maior doador do Fundo Amazônia, passaram de 24% em 1950 para 33% do seu território em 2010. 

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“Fora essa análise de quem tem mais ou menos floresta, a análise que acontece no Brasil no momento não é o que a gente tem, mas o que está sendo feito com o que temos. Esse é o alvo de todas as críticas. O Brasil tem uma floresta muito importante, tem um percentual grande ainda dela viva, 20% da Amazônia foi desmatada, tem ainda um percentual de floresta que não é mais original, que já foi degradada em algum estágio, mas que ainda é uma floresta que está de pé, e ainda tem um percentual pequeno de floresta intacta ou muito pouco antropizada", salienta Astrini, pontuando que o Brasil já tem áreas abertas suficientes para garantir sua produção de alimantos sem desmatar mais um palmo de floresta.

O executivo do Observatório do Clima critica a gestão ambiental do governo. Afirma que a administração Bolsonaro "desintegrou o Ibama", diminuiu operações de campo na Amazônia, além de criticar iniciativas de promover a mineração em territórios indígenas. Ele tanbém é crítico do ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, que, durante uma reunião ministerial, em abril, falou em "passar a boiada", ao defender mudanças na legislação ambiental no país.
Source: Rural

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