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Em meio à pandemia de coronavírus, agro deve continuar atraindo investimentos, mas fundos devem ficar mais seletivos na hora de escolher startups onde aplicar seus recursos (Foto: Getty Images)

 

Com o avanço da digitalização no campo, o aporte de fundo de investimentos em startups que comercializam soluções para a agropecuária cresceu nos últimos anos. Em meio aos efeitos da pandemia de coronavírus sobre a economia, a resistência do setor deve mantê-lo atrativo de investimentos, mas os investidores devem ser mais seletivos. Fundos deverão priorizar empresas mais maduras, onde já há uma proposta de valor concreta, ou mais testadas em relação à viabilidade econômica e operacional.

"A escassez que vai pegar a economia inteira acabará chegando às agritechs. Os negócios muito incipientes, que exigem trabalho de campo com o produtor em duas ou três safras para demonstrar eficiência, com certeza serão afetados", diz Francisco Jardim, sócio-fundador da SP Ventures, fundo de investimento em venture capital, àqueles referentes às empresas em estágio inicial. "A gente vai privilegiar negócios mais maduros."

As startups com uma linha de atuação e proposta de valor mais avançadas devem passar pela crise sem grandes problemas. "As empresas não estão perdendo clientes, pois o agro e a cadeia de fornecimento continuam operando. Mas a liberdade que o empreendedor tinha para resolver seus negócios ficou comprometida”, analisa o presidente da Associação Brasileira de Startups (Abstartup), Amure Pinho. “Por isso, negócios que estão começando no agro podem ter mais dificuldade para se desenvolver”, completa.

Mesmo com a maior seletividade em decorrência da crise econômica, há espaço para avançar. Um relatório feito pela Associação Brasileira de Private Equity e Venture Capital (Abvcap), em parceria com a consultoria KPMG, aponta que os investimentos em Venture Capital passaram de R$ 6 bilhões para R$ 10,2 bilhões entre 2018 e 2019, crescimento de 70% em apenas um ano, ou R$ 4 bilhões. O número de empresas que receberam aportes quase dobrou entre um ano e outro, de 122 para 216.

Um dos sinais recentes de que há oportunidades veio de Minas Gerais. A Federação da Agricultura e Pecuária do Estado (Faemg) se juntou ao fundo FCJ Venture Builder e lançou, em maio, o NovoAgro Ventures, programa que busca fomentar a criação de novas startups do agronegócio.

A ideia é utilizar a capilaridade da Faemg, que tem cerca de 200 mil produtores em quase 400 sindicatos, para solucionar problemas e incentivar a utilização de tecnologia de baixo custo. A prioridade será atender as culturas de café e leite, que compõem a maior parte da base da Federação e onde 95% são pequenos e médios produtores.

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 “Com a Covid-19, reacendeu ainda mais a tendência de que nós teremos, após a crise, um novo mundo. O agronegócio é um setor que conduz o país. Muitas demandas virão porque a população mundial cresce e vai demandar mais, e agro brasileiro produz alimentos a preço competitivo”, diz Roberto Simões, presidente da Faemg. “Geralmente, as tecnologias mais avançadas estão nas grandes propriedades. Precisamos mudar isso.”

Para o CEO da FCJ Venture Builder, Paulo Justino, existem diversas oportunidades justamente por conta do alto custo da tecnologia para o campo. “Há excelentes projetos nas universidades que não chegam ao pequeno produtor. De um lado, você tem o pequeno produtor querendo inovação, e, de outro, grandes proposta de valor. O que falta é essa liga”, afirma.

O objetivo do novo programa é angariar recursos de pessoas físicas, os investidores-anjo, com um ticket médio entre R$ 30 mil a R$ 100 mil – valores baixos para o mercado de investimentos – para o aporte em 30 novas startups nos próximos dois anos.

Segundo Justino, dois fatores propiciam mais investimentos no agro: a oscilação da Bolsa de Valores, por conta das crises política e econômica, o que afasta investidores; e a taxa básica de juros, a Selic, em 3% ao ano, o que desestimula a manutenção de recursos em fundos de renda fixa.

Por isso, o cenário pós-pandemia deve ser mais favorável para a transformação digital já em curso no agronegócio. “São poucas as saídas e a inovação passa a ser uma alternativa para quem nunca pensou. O investidor vai estar com uma pré-disposição para investir”, diz o CEO da FCJ Venture Builder.

Oportunidades na crise

No último ano, uma grande pesquisa para mapear as startups do agronegócio foi feita pela Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa), SP Ventures e a consultoria Homo Ludens, com o apoio do StartAgro, da ACE Startups e do Centro Universitário FEI.

O estudo Radar AgTech Brasil 2019 identificou 1.125 startups situadas em território brasileiro, quase 90% nas regiões Sul e Sudeste, com destaque para São Paulo (590), Paraná (102) e Minas Gerais (99). Entre os segmentos do agro, 196 empresas aparecem antes da fazenda (análise laboratorial, controle biológico ou fertilizantes e nutrientes) 397 dentro (agropecuária de precisão, diagnóstico de imagem, gestão de resíduos e água e máquinas) e outras 532 depois da fazenda (alimentos inovadores, armazenamento, infraestrutura e logística e bioenergia).

Para Amure Pinho, da Abstartup, o maior grau de exigência dos consumidores sobre padrões de produção, como a sustentabilidade e a origem dos alimentos, geram mais oportunidades para o segmento mesmo em momentos de retração da economia. "O consumidor quer ter a cesta de frutas e alimentos frescos que ele comprava no mercado. O produtor que está mais conectado com certeza terá mais chances", diz.

Algumas das startups listadas na pesquisa receberam investimentos durante a crise econômica do biênio 2015 e 2016, ou nos anos seguintes, quando o país ainda buscava retomar o crescimento. Uma foi a Jet Bov, de gestão para a pecuária de corte.

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Através de imagens de satélites, a plataforma auxilia o produtor no controle zootécnico e no uso de pastagens, o que impacta na gestão econômica. Com balanças eletrônicas, chips de identificação e brincos de radiofrequência na orelha dos bovinos, é possível economizar até 60% no tempo do manejo com a análise de dados.

Apesar da ambiciosa proposta de valor, o negócio só começou a tomar corpo no final de 2016, após um aporte de R$ 150 mil e um período de aceleração que incluiu a estruturação de uma equipe de vendas digital. “As pessoas não acreditavam que a gente conseguiria vender para um produtor rural pela internet, onde muitas vezes a campanha é feita pelo Facebook. Mas estamos tendo um resultado melhor do que antes, afirma Xisto Alves, fundador e CEO da Jet Bov.

Em número de novos clientes, março deste ano foi um dos melhores resultados da plataforma na história, da mesma forma em abril. “O setor agro está mais imerso na tecnologia”, diz.

No entanto, ele alerta que o tempo entre a injeção de capital e o funcionamento da empresa no mercado terá um ciclo mais estreito no pós-pandemia . “Os empreendedores vão testar e validar mais o seu negócio com provas de que há sustentação. Era muito comum que as empresas tivessem um tempo apoiadas pelos investidores até começar a dar resultado. Essa dinâmica deve mudar”, analisa Alves.
Source: Rural

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