(Foto: Enrique Marcarian/Reuters)
A valorização do dólar e a alta nas exportações brasileiras de grãos já pressionam os custos de produção agropecuária. Os produtores de carne, principalmente aves e suínos, dependem de soja, milho e derivados para ração animal. Além disso, há preocupação com a possível redução no consumo de proteínas por conta da crise de Covid-19.
No dia 2 de janeiro, o preço da saca de 60 kg de milho estava em R$ 48,43, na média, em Campinas (SP). No entanto, com o mercado externo aquecido no início da pandemia, a cotação chegou ao recorde de R$ 60,14 pela mesma quantidade em 31 de março, segundo o Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada (Cepea-Esalq/USP).
Em abril e maio, entretanto, o valor do cereal caiu influenciado pela alta disponibilidade de milho dos Estados Unidos no mercado externo e pela leve queda no dólar, fechando a R$ 50 na última quinta-feira (28/5). Esse patamar, porém, representa um valor 29,6% maior do que em maio do ano passado, quando a saca estava em R$ 38,56.
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Da mesma forma, o indicador do Cepea para a saca de 60 kg de soja no Paraná apontava R$ 79,53 no começo do ano. Com a valorização nos últimos dois meses, a saca chegou ao pico de R$ 106,07 no último dia 18. Na quinta-feira, fechou a R$ 99,81, – mesmo com a queda, a cotação é 29,4% maior do que no final de maio do ano passado.
Para o sócio-diretor da Athenagro, Maurício Palma Nogueira, a valorização dos grãos deve reduzir os ganhos dos pecuaristas. “Não acredito que consista numa ameaça que inviabilize a produção, mas irá impactar as margens, aumentando a exigência gerencial dos produtores”, afirma.
Mesmo em situação complicada, a perspectiva antes da pandemia era mais positiva, o que fica comprometido com a perda de renda da população diante da crise. “Era um cenário que já estava complicado por conta do preço da ração. É catastrófico por conta da queda no preço da carne de frango”, avalia Ariovaldo Zani, vice-presidente do Sindicato Nacional da Indústria de Alimentação Animal (Sindirações).
(Foto: Ricardo Benichio)
Poder de compra reduzido
Com a restrição no poder de compra no mercado interno, muitos frigoríficos se beneficiaram do câmbio elevado para aumentar as receitas com a exportação.
Segundo a Associação Brasileira de Proteína Animal (ABPA), os embarques externos da carne de frango (in natura e processados) totalizaram 1,365 milhão de toneladas nos primeiros quatro meses do ano, 5,1% acima do registrado em 2019, com 1,299 milhão de toneladas exportadas.
No caso dos suínos, a ABPA aponta que esse aumento proporcional nas vendas externas foi ainda maior, com o total 280,8 mil toneladas no primeiro quadrimestre, volume 28,4% superior ao registrado aos primeiros quatro meses de 2019, com 218,7 mil toneladas.
O dólar acaba pesando também nos fatores de custos de produção porque alguns insumos são importados. Com essa retração do consumo interno, o câmbio tem favorecido porque você consegue manter a produção com esse importante canal de escoamento
Alcides Torres, sócio-diretor da Scot Consultoria
No entanto, analistas alertam que a capacidade de remanejar a produção para a exportação fica limitada às grandes empresas com maior capacidade de produção e que têm plantas habilitadas para atender outros mercados consumidores de proteínas, caso da China.
De acordo com a ABPA, cerca de 80% dos suínos e 70% da produção de aves ficam no mercado interno, já que o segmento possui muitas indústrias de pequeno porte que não contam com estrutura e autorização dos demais países para exportar.
Preço da carne
Enquanto os grãos registram valorização na primeira metade do ano, o mesmo não aconteceu com o preço das carnes. O valor da carne de frango congelado passou de R$ 5,38 em janeiro para R$ 4,04 ao final de maio no Estado de São Paulo, segundo o Cepea. Na comparação entre maio deste ano e o mesmo mês do ano passado, a cotação de aves recuou R$ 0,76, cerca de 16%.
Já a carcaça suína no atacado da Grande São Paulo estava em R$ 9,97 em janeiro deste ano, passando para R$ 6,90 ao fim de maio, recuo de 30,7%. Na comparação entre maio de 2020 e o mesmo mês do ano passado, a diferença é menor, já que a carne de porco estava avaliada em R$ 7,12 ao final do mesmo período em 2019.
A tendência é de que a indústria reduza a quantidade de animais alojados, impactando a oferta nas semanas seguintes. Nesse caso, os preços sobem e acabam sendo repassados aos consumidores
Maurício Palma Nogueira, sócio-diretor da Athenagro
O entendimento é que a pressão dos custos de produção deve ser repassada ao consumidor. Historicamente, o segundo semestre registra um aumento nos preços das carnes, período marcado pela alta nos preços de proteínas com as festas de fim de ano.
No entanto, a imprevisibilidade sobre a dimensão da crise econômica e a perda de renda com a pandemia podem dificultar os repasses nas prateleiras dos supermercados. "O consumidor está muito reticente. Então, talvez ocorra um fenômeno de preços estáveis", observa Alcides Torres, da Scot Consultoria.
Source: Rural