Culinária mexicana usa e abusa da pimenta (Pixnio/Creative Commons)
Traduzir um livro sobre comida não é tarefa fácil. Cada terra com seu uso, cada terra com seu fuso. Estou traduzindo um há três meses e cada verdura, como couve, tem 50 tons de verde, cada verde com seu nome, pouca diferença entre elas, mais frisadinha, haste mais dura e coisas assim que nem reparamos na hora de comer.
Mas o que estranhei, e muito, na tradução é que os mexicanos entraram incrivelmente na moda, menos no Brasil, onde quase não temos tortilllas e burritos e chocolate com pimenta.
Um amigo meu diz que as comidas só se tornam conhecidas se nos acostumamos com elas, se há colônias para frequentar os primeiros restaurantes. Realmente não temos grandes colônias mexicanas no Brasil. Pode ser.
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Para sustentar os restaurantes, no começo, há que ter gente acostumada com aquela maravilhosa quantidade de pimentas, cada uma com seu gosto e própria para aquele prato. A combinação de fruta e doces com pimenta me agrada demais e os “moles”, geralmente peru e galinha ensopados, com molho de chocolate (sem açúcar), é claro, são de comover um coração empedernido. Experimente. Compre um chocolate bom, pode ser até um Valrhona, escuro, amargo. Derreta em banho-maria. Junte pimenta calabresa. Despeje em montinhos sobre papel-alumínio e deixe endurecer. Sirva com uma bolota de sorvete de creme.
Quando visitei o México, há muito tempo, eles, orgulhosos que são, escondiam sua comida com medo da chacota dos estrangeiros. E riam deles, mesmo, de suas pimentas, das frutas verdes com sal.
O governo mexicano ajudou e hoje é uma das culinárias mais conhecidas do mundo todo, o que deixa muita gente feliz, pois são extremamente conscientes e sabem bem do que gostam, escrevem livros sobre o assunto e nos ensinam coisas para lá de interessantes.
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Esperamos que as modas de comida se espalhem para lucrarmos com as gostosuras alheias. Pois moda é moda, e há moda até de peixe. Havia tanto peixe no Tâmisa que os aprendizes das fábricas fizeram uma greve pedindo que constasse do menu só duas vezes por semana. Sabem qual o peixe da moda agora? Garoupa! E quem sabe explicar por que as anchovas enlatadas brasileiras são tão piores que as italianas? Um mistério.
Sardinha era sinônimo de peixe barato, agora é servido nos melhores bistrôs do mundo. O Rio de Janeiro sabia das coisas, pois muitos botecos servem desde sempre sardinha frita com cerveja para gáudio dos admiradores. Havia um peixe, ou há um peixe nas feiras brasileiras, que ficava encalhado, o peixe-sapo, porque tinha nome e cara feia. Lembro bem que Neide Rigo e eu, de brincadeira, resolvemos renomear o bicho com seu nome verdadeiro, o tamboril, e passou a ser vendido, quem diria que um nome pode ter o poder marqueteiro de mudar a sorte de um bicho! Lembram quando o tomate seco apareceu nas nossas praças? Quase tivemos indigestão, passamos quase todos os anos 90 almoçando e jantando tomate seco.
A comida chinesa chegou antes, a japonesa custou um pouco por causa do peixe cru, a coreana veio com tudo, em São Paulo, nos Estados Unidos. Há um grande chef coreano-americano que confessa se sentir roubado quando um outro cozinheiro qualquer ganha estrelas com a comida coreana. Afinal, quem sofreu com aquela comida de gosto, aspecto e cheiro diferentes foram eles, os pequenos coreanos imigrantes da América, com suas lancheiras com cheiro de kimchi, as casas onde não podiam levar os colegas por causa do cheiro estranho da comida. E agora aparecem cozinheiros, todos faceiros, se aproveitando da moda… Ora bolas!
Source: Rural