O Museu e Centro de Ciências, Educação e Artes "Luiz de Queiroz" (Foto: Rogério Albuquerque/Ed. Globo)
Um sobrado imponente, com cerca de 1.000 metros quadrados, guarda memórias centenárias em Piracicaba, no interior de São Paulo. É o Museu e Centro de Ciências, Educação e Artes "Luiz de Queiroz", dedicado à história da Escola Superior de Agricultura "Luiz de Queiroz" (Esalq), fundada em 1901, e posteriormente integrada à Universidade de São Paulo (USP).
O casarão branco foi construído na década de 1940 pela própria Esalq no terreno que já fazia parte do campus na época. Seu estilo foi inspirado nos prédios das universidades norte-americanas, e a fachada frontal lembra a arquitetura colonial das fazendas sulistas dos Estados Unidos. À frente, há um lago habitado por patos e cercado de árvores.
Mas o acervo nem sempre esteve ali. Coordenador do Museu, Edno Dario explica que o prédio foi construído para ser a residência do diretor da Esalq e para recepcionar personalidades importantes em visitas à Escola. “Em 1990, o professor João Lúcio de Azevedo, diretor naquele momento, abdicou do uso da casa. O Museu, fundado em 1984, procurava um espaço para o seu acervo, porque estava alocado no Prédio Central da Esalq, com uma única sala para guardar tudo. Conseguimos, então, fazer a transferência.”
No Museu desde 1989, onde começou como estagiário, Dario acompanhou de perto essa fase de transição. Hoje, sua responsabilidade é coordenar as funções do centro cultural. “Entre elas, estão o recolhimento e a seleção de peças nos departamentos da Esalq, a coordenação das visitas monitoradas, além da conservação e documentação do acervo que recebemos”.
Edno Dario em um dos cômodos do museu (Foto: Rogério Albuquerque/Ed.Globo)
Ele conta que, no início, a missão do Museu era mais simples: cuidar dos quadros de fotografias dos formandos. “A função inicial era conservar essas peças. Mas logo sentiu-se a necessidade de criar um museu mesmo, com outras peças e um acervo que contasse a história da Esalq, do fundador Luís Vicente de Souza Queirós e das ciências agrárias”.
Homenagens a Luís de Queirós vão além do nome da Escola e do Museu. O proprietários de terras e agronômo que viveu no século XIX é lembrado como um homem empreendedor e com ideias modernas para sua época. É atribuído a ele, por exemplo, a instalação da primeira linha telefônica de Piracicaba e da implementação da eletricidade na iluminação pública da cidade. Ficou conhecido, também, pela participação no movimento abolicionista.
Em 1889, Queirós doou uma propriedade ao governo de São Paulo com a condição de que, dali a dez anos, fosse construída uma escola agrícola. Ele desejava ver, no Brasil, uma instituição que seguisse o modelo das europeias, onde estudou. Como morreu em 1898, Queirós não chegou a ver o nascimento da "Escola Agrícola Prática de Piracicaba", que, em 1931, foi rebatizada em sua homenagem.
Acervo
Após a mudança para o casarão, o Museu cresceu e se consolidou. “Começamos, então, um trabalho de garimpagem pelos departamentos, que no início não tinha muito critério. Na verdade, nenhum critério: nós trazíamos peças para que elas não fossem perdidas”.
Hoje, são cerca de 10 mil peças, segundo Dario. “Temos documentos textuais, fotografias e as chamadas peças tridimensionais, que eram usadas pelos departamentos da Esalq. São cerca de 3 mil documentos, 5 mil fotografias e 2.500 peças. Cerca de 60% a 70% desse acervo está exposto no Museu. O restante está na reserva técnica”.
Entre as 10 mil peças, Dario prefere não eleger a mais importante. “Eu gosto de dizer que o destaque é o conjunto. Todos os departamentos têm a sua importância para a Esalq. Seria até injusto escolher uma ou outra peça. Eu gosto de todas.”
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Muitos departamentos contribuíram para a formação do Museu. “Temos peças de laboratórios, como, por exemplo, o de botânica e genética. Temos também várias balanças de precisão, e uma em especial fazia a medição da evaporação de solo. Na nossa exposição sobre o café, temos muitas máquinas, como a beneficiadora. Mas não dá pra classificar uma só como a mais bonita do museu. Estão todas muito bem conservadas”.
A exposição do café citada ocupa um salão no segundo andar do Museu. “Quando Luiz de Queiroz teve a ideia de formar uma faculdade de agronomia, o Brasil já era um grande produtor de café. Então a Escola se preocupou muito com esse tema. Dos departamentos que trabalhavam com agricultura, com sementes, vieram muitas peças desse período rico do café”, explica Dario. Isso possibilitou a criação de um acervo que conta a história do cultivo do grão no país. “E não é só a história do café. Junto com ele, veio a imigração, novas tecnologias, trabalhadores. É uma história que passa pela escravidão, também. A exposição engloba tudo que norteia o tema do café”.
A exposição sobre o café, no segundo andar do sobrado (Foto: Rogério Albuquerque/Ed. Globo)
No casarão, Dario também organiza exposições temporárias de arte. As obras ficam, geralmente, em dois cômodos do térreo. Outras atividades também costumam movimentar o Museu, como cursos e oficinas com professores da Esalq.
Legado
Além do espaço cultural, o Museu ainda tem mais um aspecto marcante para os interessados na história da Esalq e também da agricultura em geral. Dario lembra que muitos documentos históricos estão abrigados na casa. “Recebemos muitos alunos e escritores procurando esses documentos. E eles podem consultar. Assim, auxiliamos em muitos trabalhos, como mestrados e doutorados. E essa é uma das funções de um museu: ser uma ferramenta muito importante no auxílio da educação”.
Dario no acervo do Museu. Sala é repleta de documentos e fotos históricas (Foto: Rogério Albuquerque/Ed. Globo)
Um de seus objetivos é estender os dias de visitação. Hoje, o Museu acompanha o horário de funcionamento da Esalq, o que não inclui os finais de semana. "Tem um público muito grande aqui no campus no sábado e domingo. Famílias que vêm para passear, por exemplo. Se o Museu estivesse aberto, nosso público aumentaria muito. E seria uma alternativa para o visitante poder conhecer esse acervo."
O coordenador diz que há uma proposta em andamento para viabilizar a ideia, mas sem previsão de conclusão. "É um trâmite que não é tão simples, porque envolve a reitoria e outras instâncias. Mas, apesar desse entrave, desse período de abertura que não é o recomendado, nós temos cerca de 10 mil pessoas visitando o Museu por ano."
A paixão de Dario por seu trabalho ficava evidente enquanto ele explicava a história do Museu ao lado de uma maquete do campus da Esalq, em um dos cômodos térreos do casarão. Acostumado a lidar com o passado, ele vislumbrou, rapidamente, o futuro do espaço.
“Eu espero que as pessoas se conscientizem que guardar a memória é fundamental. Hoje temos as histórias do fundador Luiz de Queiroz e a história das ciências agrárias graças à memória que se deixou. Quando a gente analisa essa memória entre a fundação da Esalq e hoje, ou seja, de 1901 até 2018, nós vemos que existem algumas lacunas. São as coisas que foram perdidas nos períodos que não havia a consciência de guardar aquelas memórias. Foi para contar essas histórias que o Museu surgiu. E eu quero deixar esse trabalho o mais organizado possível para que quem vier depois poder continuar e melhorar”.
Serviço:
O Museu e Centro de Ciências, Educação e Artes Luiz de Queiroz fica aberto para visitação de segunda a sexta-feira, das 8h às 12h e das 13h às 17h. A entrada é gratuita.
Endereço: Avenida Pádua Dias, 11, próximo ao Pavilhão de Engenharia, no campus da Esalq, em Piracicaba (SP). Confira a localização do Museu no mapa interativo da Esalq. Ele é o prédio nº 53.
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Source: Rural