(Foto: Robispierre Giuliani/Ed. Globo)
Há 10 mil anos, a humanidade iniciava a exploração da agricultura, com práticas de um mundo antigo e intuitivo. Milho, arroz e trigo eram muito diferentes do que são agora. Levamos mais 6 mil anos para usar os microrganismos a nosso favor, quando aprendemos as técnicas de fermentação para produzir pães e cerveja. Longos 8 mil anos se passaram para entendermos que a Terra não era o centro do universo.
Foi preciso passar pela Idade das Trevas antes que a humanidade renascesse com Darwin e sua teoria da evolução das espécies; Mendel e a descoberta dos genes; Pasteur e o seu mundo microscópico; e tantos outros.
Luiz Josahkian (Foto: Divulgação/ABCZ)
Nenhuma dessas descobertas foi aceita com tranquilidade, porque, afinal, convencer os humanos de que eles não eram o centro do universo, que havia seres invisíveis que habitavam seus corpos e que havia uma lei hereditária determinando seus destinos eram verdades desconcertantes.
Mas, felizmente, a ciência não precisa de aceitações nem de elogios. Ela precisa é ser imparcial, replicável e capaz de ser submetida ao escrutínio público e resistir. Foi a ciência do melhoramento genético que permitiu que, em 1960, Norman Borlaug desenvolvesse o trigo anão, dando início à Revolução Verde.
Os estudos da molécula de DNA evoluíram e, em 1982, foi criada a primeira planta transgênica, um tabaco resistente a antibióticos, seguida de outros produtos transgênicos resistentes a pragas, inseticidas, vírus e bactérias.
A polarização das opiniões, se transgênicos eram ou não nocivos à saúde, logo tomou conta de todos os setores da sociedade, incluindo os próprios cientistas, que deram um tipo de moratória às próprias pesquisas.
Aos poucos, a engenharia genética ressurgiu e, no início dos anos 2000, 13 países multiplicaram em 25 vezes o tamanho da área plantada com variedades transgênicas, aparentemente um caminho sem retorno.
Mas o mundo dá voltas e sempre que a ciência assume ares de ficção provoca temor público. Voltamos aos primórdios da civilização com uma das mais recentes descobertas da área da genética, que atende pela sigla CRISPR. Essa descoberta de 2012 foi mais uma reviravolta na genética.
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E olha que ela nem é uma invenção humana. Vem das humildes bactérias. A CRISPR é uma sequência singular e repetida do DNA encontrada em algumas bactérias. O que os pesquisadores descobriram é que essa sequência corresponde ao DNA de determinados vírus que foram incorporados ao DNA da bactéria durante uma infecção.
Se a bactéria for infectada novamente pelo vírus, ela reconhece o invasor e inicia o contra-ataque. A CRISPR usa uma enzima específica para completar a tarefa, sendo que a mais conhecida até o momento é a CAS9. A coisa toda funciona assim: o vírus tenta se inserir no DNA da bactéria, mas a CRISPR captura o DNA viral e aciona o gene da CAS9, que irá, por sua vez, cortar a fita de DNA, impedindo sua multiplicação. Uma vacina no nível molecular.
Mas o que isso tem de impactante para o mundo dos transgênicos? É que com a CRISPR e a enzima correta, inserir, deletar ou rearranjar genes pode se tornar uma prática corriqueira e muito mais precisa que as técnicas anteriores, além de acessível à qualquer laboratório.
A possibilidade real de reeditar a natureza levou novamente os pesquisadores a se questionarem sobre o uso indiscriminado da nova técnica. No momento, o pêndulo está mais para a atitude conservadora. É esperar para ver e torcer que se estabeleça a decisão mais equilibrada entre prover a humanidade com os benefícios potenciais da engenharia genética e evitar o desequilíbrio da ecologia do planeta.
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*Luiz Josahkian é zootecnista, especialista em produção de ruminantes e professor de melhoramento genético, além de superintendente técnico da Associação Brasileira dos Criadores de Zebu (ABCZ). Este artigo foi publicado originalmente em janeiro de 2018, na edição nº 387 da Revista Globo Rural.
Source: Rural