Skip to main content

Na última safra de verão, o empresário e operador de máquinas Jaime Silveira, de 43 anos, viajou mais de 5.700 quilômetros por estradas do Brasil, deixando o lar em São Sebastião da Amoreira, no norte do Paraná, para trabalhar nas colheitas de soja em Mato Grosso do Sul e no Piauí. Trabalhou bastante e teve bons rendimentos, valendo-se de um conhecimento que acumulou ao longo de anos de prática e de estudos, por conta própria, para se aprimorar.

Leia Também: Globo Rural publica 4º ranking GPTW com as Melhores Empresas para Trabalhar no Agro

Jaime Silveira agencia trabalhadores para colher soja em Mato Grosso do Sul e no Piauí (Foto: Sergio Ranalli)

 

Jaime começou a pilotar máquinas agrícolas aos 14 anos. Casado, aos 20, tornou-se funcionário de uma fazenda no Paraná, onde havia máquinas valiosas. Aprendeu bastante.

Em 2005, ao lado da esposa, Sandra, aventurou-se nos Estados Unidos, entrando ilegalmente pela fronteira mexicana, sem falar inglês. Conseguiu serviço na colheita de milho no Estado de New Hampshire, onde conheceu tecnologias como o piloto automático, que ainda não tinha visto no Brasil. Na entressafra, trabalhou em outros ramos, como funilaria e restaurantes.

Quando retornou ao Brasil, em 2008, voltou a ser empregado na mesma fazenda da qual havia saído três anos antes, até resolver conhecer Mato Grosso do Sul, em 2014. Imediatamente percebeu que havia espaço para mão de obra qualificada em outros campos.

▶️ Globo Rural está na Rádio CBN! Ouça o boletim de hoje

Atualmente, Jaime faz parte de um contingente de milhares de brasileiros que transitam pelo país aproveitando as oportunidades, fixas ou temporárias, que o agronegócio oferece. São 18,74 milhões de empregos diretos, o que corresponde a 19,67% dos brasileiros empregados, de acordo com relatório referente ao primeiro trimestre de 2022, elaborado pelo Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada (Cepea), vinculado à Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz, da Universidade de São Paulo (Esalq/USP).

Além de pilotar uma colheitadeira, Jaime abriu uma empresa de prestação de serviços agrícolas e agencia vagas para outros 19 trabalhadores em Mato Grosso do Sul e no Piauí. Os respectivos calendários agrícolas permitem começar a colher no Estado do Nordeste quando o mesmo serviço termina no Centro-Oeste.

Quanto mais moderna a máquina, mais fácil para nós. Eu mesmo dou um curso de atualização"

Jaime Silveira,
empresário e piloto de colheitadeira

Um operador de colheitadeira chega a ganhar R$ 20 mil em um período de aproximadamente 35 dias, com jornadas que vão do nascer ao pôr do sol. “São dias intensos, como tem de ser na colheita, pois a gente trabalha contra o tempo. O café da manhã é servido às 5h30. Mas, ao final, os rendimentos compensam e garantem uma vida melhor para as nossas famílias”, ele explica.

Para um “bazuqueiro”, que é o profissional que pilota o trator que puxa uma carreta para ir recebendo, em movimento, os grãos da colheitadeira, os ganhos chegam a R$ 14 mil por safra. Já quem trabalha com um trator puxando a plantadeira, no sistema plantio direto, deixando na terra as sementes do milho de segunda safra imediatamente após a colheita da soja, recebe R$ 12 mil.

saiba mais

Contratação de crédito rural supera previsto e atinge R$ 252,46 bilhões

 

“São oportunidades para bons profissionais, que dominam as técnicas, que sabem que colher não é só puxar o manche, que regulam, com precisão, a velocidade e a altura do molinete, que conduzem a máquina na melhor velocidade e que não se amedrontam com as tecnologias, como o GPS. Quanto mais moderna a máquina, mais fácil para nós. Eu mesmo dou um curso de atualização para o pessoal que levo para as colheitas”, ressalta o operador e empresário. Nas entressafras, ele trabalha no Paraná, em sociedade com um primo, em uma empresa que comercializa madeira.

Leandro Fernandes trabalha na lanchonete da família e nas férias pilota colheitadeira (Foto: Sergio Ranalli)

 

Leandro Fernandes Rodrigues, de 29 anos, também morador de São Sebastião da Amoreira, conseguiu vaga em Mato Grosso do Sul por intermédio de Jaime. Ele aprendeu a pilotar tratores acompanhando o pai em sítios do Paraná. Há seis anos, já casado, deixou as lavouras para trabalhar em uma lanchonete especializada em salgados, da família da esposa.

Trazer os trabalhadores de longe custa um pouco mais, porém estou satisfeito"

Agostinho Francisco Ludwig,
produtor rural de Maracaju (MS)

Na última safra, aproveitou as férias para aceitar uma vaga de “bazuqueiro” na Fazenda Rio Branco, em Maracaju (MS). “Atualizei-me antes de ir e consegui trabalhar muito bem, em um ambiente de respeito, com boa comida, alojamentos dignos, com ar-condicionado na cabine e uma equipe boa. A renda extra veio em excelente hora. Daqui para frente, pretendo conciliar o trabalho na lanchonete durante boa parte do ano com as colheitas na época da safra”, ele comenta.

Para Agostinho Francisco Ludwig, de 62 anos, proprietário da Fazenda Rio Branco, investir em mão de obra qualificada faz a diferença para uma colheita eficiente. “As máquinas têm muito recursos. É preciso operá-las bem. Trazer os trabalhadores de longe custa um pouco mais, porém estou satisfeito.”

O produtor Marius Matter, de 34 anos, também de Maracaju, é mais um que recorre à contratação de temporários de outros Estados. “Temos bons profissionais na nossa região, mas eles já estão todos empregados”, explica. Na última safra, Marius empregou temporariamente nove safristas de outros regiões. Exigente, faz questão de bons currículos, com referências, e estabelece boas relações de trabalho. “Felizmente, alcançamos bons resultados. O agronegócio propicia oportunidades para todos”, finaliza.

saiba mais

Saúde mental: depressão e ansiedade aumentam entre trabalhadores rurais

Conheça as melhores grandes empresas do agro para trabalhar, segundo o GPTW

 

Do campo para a praia

Pelas ruas de Itajaí e Balneário Camboriú, no litoral de Santa Catarina, João Felipe Vazan Soares, de 28 anos, dirige um carro popular durante parte do ano. Motorista de aplicativos, transporta moradores locais e turistas e realiza o sonho de infância de morar na praia.

Nascido no Paraná, ele foi criado em meio às lavouras de grãos e de cana-de-açúcar. Durante alguns anos, trabalhou em uma usina, colhendo as gramíneas com colheitadeiras. Em 2019, depois que a indústria encerrou as atividades, decidiu “abrir a mente”, como ele diz.

Colheitadeira (Foto: Getty Images)

 

No litoral, primeiro trabalhou em depósitos de supermercados e lojas de departamentos, sentindo-se um passarinho em gaiola. Era uma realidade muito diferente trabalhar em ambientes fechados para quem antes labutava olhando para os horizontes. “A lavoura está no sangue”, explica João.

Por isso, aceitou de bom grado quando Jaime Silveira, que é seu irmão, o chamou no ano passado para participar de colheitas em Maracaju (MS), a 1.150 quilômetros de Itajaí. Abandonou os trabalhos em ambientes fechados e passou a conciliar os meses nas lavouras com o trabalho como motorista de aplicativos quando não é tempo de colher.

Agora sinto que estou realizando um sonho,
morando na praia e

trabalhando com as colheitas"

João Felipe Vazan,
operador de colheitadeira

“Agora sinto que estou realizando um sonho com plenitude, morando na praia com minha esposa, Graciele, e trabalhando com as colheitas, que é algo que gosto de fazer. O que ganho como motorista de aplicativos é um complemento para a nossa renda”, destaca João.

Nas horas vagas, ele faz cursos por meio da internet para melhorar os conhecimentos em relação às colheitadeiras e técnicas de colheita. Não quer ficar para trás. “A colheita, principalmente da soja, é trabalho que exige refinamento. Quem nos contrata é exigente, e com razão. O produtor faz muitos investimentos em uma lavoura, dedica-se a ela por meses. Não podemos permitir desperdícios justamente no momento de colher. É um desafio que encaramos com garra e gratidão”, finaliza.

Café nas montanhas

Nas regiões de montanhas de Minas Gerais e do Espírito Santo a mão de obra humana é relevante para a cafeicultura, devido à topografia. Como é impossível entrar nas lavouras com as grandes colhedeiras que realizam o trabalho no cerrado mineiro, nessas regiões é preciso contratar homens e mulheres para operar as derriçadeiras manuais, ferramenta que trepida os galhos dos cafezais, fazendo com que os grãos caiam sobre as lonas que cobrem o terreno.

Café (Foto: Getty Images)

 

A maior geração de emprego na cafecitultura ocorre em Minas, maior produtor nacional. Quarto maior Estado do Brasil em extensão territorial, com 586 mil quilômetros quadrados, Minas tem um intercâmbio interno, mas nem por isso de curtas distâncias, para a época da safra cafeeira. O exemplo de Eduardo Lima de Souza, de 59 anos, que trabalha em sociedade com os irmãos na Fazenda Ponto Alegre, de 256 hectares, ilustra bem o cenário.

A propriedade, situada no município de Cabo Verde, contratou 70 pessoas da região nordeste de Minas, de municípios como Santo Antônio do Jacinto, a mais de 1.200 quilômetros dali.
Para produzir cafés de qualidade na categoria cereja descascado, Eduardo precisa de uma colheita bem executada e por isso contrata trabalhadores que saibam cumprir bem a missão. Todos são registrados como safristas e recebem boa alimentação e alojamentos, seguindo as regras da legislação e das certificações que a fazenda detém.

O pagamento é feito de acordo com a produtividade do trabalhador, variando de R$ 120 a R$ 150 por dia. “Ao final da safra, todos conseguem voltar para casa com dinheiro. Trabalhar com cafeicultura em região montanhosa dá também essa satisfação de gerar empregos. Mesmo na entressafra, precisamos de um homem para cada 7 hectares”, destaca o cafeicultor.

É fundamental a recuperação da nossa economia, o que vai resultar em mais oportunidades em todo o agronegócio"

NICOLE RENNÓ,
pesquisadora do Cepea

Fora da porteira

Nicole Rennó, pesquisadora do Centro de Estudos Avançados em Economia Apliacada (Cepea/Esalq/USp), acredita que, com a tendência de mudança do padrão de consumo da população, que passa a demandar produtos mais industrializados, as oportunidades de emprego no agronegócio devem crescer, principalmente para “o lado de fora da porteira”.

“A geração de empregos no agronegócio deve continuar acontecendo, mas, para isso, precisa haver uma retomada da geração de empregos na agroindústria, a qual tem sido puxada pelo mercado externo. Por isso, é fundamental a recuperação da nossa economia, o que vai resultar em mais oportunidades em todo o agronegócio, principalmente fora das propriedades rurais”, detalha a pesquisadora.

De Minas para o Paraná

Em março de 2022, Astor Carvalho Rodrigues, de 30 anos, deixou Patos de Minas (MG) para se deslocar mil quilômetros em direção ao sul do Brasil e começar um novo desafio profissional no Paraná.

Administrador de empresas, com MBA em gestão financeira e controladoria, ele trabalhava em uma cooperativa focada em recebimento de leite, mas apareceu uma oportunidade com novos desafios na Frísia Cooperativa Agroindustrial, em Carambeí (PR).

Um dos grandes desafios da cooperativa para as contratações que precisa fazer é encontrar pessoas especializadas que estejam dispostas a morar em cidades interioranas (Foto: Getty Images)

 

Astor foi contratado para ser coordenador de controladoria, debruçando-se sobre os muitos dados que explicam o faturamento histórico da cooperativa em 2021: R$ 5,2 bilhões, crescimento de 40% em relação ao ano anterior.

Mudar de cidade e de Estado tem as suas dificuldades. Por enquanto, o rapaz mora sozinho, em quarto de hotel, às vezes sentindo-se em outro país. Há diferenças culturais e de paisagem, com os muros baixos e quintais ajardinados de Carambeí, no entanto, o bom acolhimento que recebeu dos carambeienses e o horizonte de crescimento profissional para o futuro o animam. Astor pretende se casar em julho com a noiva, Rafaela, e fixar residência no Paraná.

“O potencial do agro é muito grande e, querendo agarrar, há oportunidades. Para mim, o coração do Brasil é o agronegócio”, entusiasma-se o coordenador de controladoria.

Tatiana Kfouri de Lima Tigges é a gerente de gestão de pessoas da Frísia. A cooperativa tem 1.160 funcionários, além de 300 terceirizados fixos e mais um contingente de 350 a 450 pessoas que são contratadas para trabalhar somente nas épocas das safras de verão e de inverno.

O potencial do agro é muito grande e, querendo agarrar, há oportunidades. O coração do Brasil é o agronegócio"

Astor Carvalho,
coordenador de controladoria da Frísia

De acordo com Tatiana, um dos grandes desafios da cooperativa para as contratações que precisa fazer é encontrar pessoas especializadas que estejam dispostas a morar em cidades interioranas. A área de tecnologia da informação (TI) é uma das mais carentes e, cada vez mais, o agronegócio precisa de profissionais com esse tipo de conhecimento.

Em alguns casos, a melhor alternativa é investir na formação de pessoas, como aconteceu recentemente em expansão que a Frísia fez para o município de Dois Irmãos do Tocantins (TO), que tem em torno de 7 mil habitantes, de acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).

Como não havia pessoas na região com conhecimento para preencher o cargo de operador de secador nos silos de armazenagem de grãos, a cooperativa teve de promover cursos para capacitar trabalhadores locais. Contudo, para os cargos de coordenadores em Tocantins, foi preciso “exportar” funcionários do Paraná.

“O agro está em desenvolvimento, com muitos processos de inovações e alta profissionalização, inclusive em processos de gestão. Os profissionais que esão preparados e dispostos a mudanças vão encontrar boas oportunidades”, ressalta a gerente de gestão de pessoas da cooperativa do município colonizado por imigrantes holandeses.

Quer ter acesso a conteúdos exclusivos da Globo Rural? É só clicar e assinar!

 
Source: Rural

Leave a Reply