A safra brasileira 2021/2022 entrará para a história como uma das mais instáveis em termos de clima das últimas décadas na Região Centro-Sul. Começou em julho do ano passado, com estiagem, seguidas geadas em agosto e novamente falta de chuvas no final do ano. Mas também teve área com enxurradas e até tornado inédito.
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A falta de chuvas provocou quebra de 45% na safra do Paraná (Foto: Sergio Ranalli)
José Renato Bouças Farias, pesquisador da Embrapa, calcula que, somente no caso da soja, as perdas no Paraná e no Rio Grande do Sul nesta safra atingiram em torno de 38 milhões de toneladas, o equivalente a US$ 20 bilhões. Trata-se apenas da perda direta do agricultor, sem contar os prejuízos ao longo da cadeia de produção.
Para chegar à conclusão, ele considerou desde situações como baixo volume de água disponível no solo até uma seca mais extrema, como na temporada atual. “O produtor
teve o custo de investimentos, de instalação de lavoura, e foi o que ele deixou de colocar no bolso só nesta safra. Agora, imagine isso em cadeia”, pontua Farias.
O pesquisador lembra que a soja pode suportar temperaturas mais elevadas, mas, quando falta água, o dano às plantas, muitas vezes, é irreversível. Ele salienta que esses números servem de alerta para a importância do uso de técnicas conservacionistas no campo.
Daí a importância de fazer rotação de culturas e uma boa cobertura vegetal, lembra Farias. Essas medidas contribuem para a formação de um bom perfil de solo, que favorece o crescimento das raízes, o armazenamento de água e o fluxo de oxigênio e nutrientes para as plantas.
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“Quando falo de manejo de solo, eu tenho de vender conhecimento.Enão é fácil, porque, muitas vezes, o produtor precisa de renda e precisa plantar. Com o manejo, no curto prazo, às vezes, ele não vai ter uma renda com aquela área, mas, no longo prazo, melhorar o perfil do solo é o melhor investimento dele”
JOSÉ RENATO BOUÇAS FARIAS,
pesquisador da Embrapa Soja
Para ele, transmitir esse tipo de conhecimento deve ser papel, principalmente, do Estado. "Temos de usar toda a assistência técnica disponível. O principal patrimônio do produtor é o solo. É a base de toda a produção, e dificilmente vou encontrar uma empresa privada que vai falar nisso, porque não tem o que vender."
Onda de frio
A intensa onda de frio que provocou queda acentuada de temperatura em meados de maio deste ano, assustou os cafeicultores brasileiros, que em 2021 enfrentaram os efeitos adversos do clima. A falta de chuvas e as geadas ocorridas entre junho e setembro provocaram uma queda de 15,3% na safra deste ano em relação à colhida em 2020, último ano de bienalidade positiva dos cafezais, segundo estimativa da Companhia Nacional de Abastecimento (Conab).
A previsão é de colheita de 53,43 milhões de sacas beneficiadas neste ano, em comparação aos 63,08 milhões de sacas colhidas em 2020. Comparativamente à safra 2021, quando os cafezais produziram menos, devido à bienalidade das lavouras, o resultado é 12% superior.
Ana Carolina Alves Gomes, analista de agronegócios da Federação da Agricultura e Pecuária do Estado de Minas Gerais (Faemg), observa que o inverno nem chegou e as ondas de frio já ameaçam também prejudicar a safra do ano que vem. Ela explica que a resiliência do cafezal e a capacidade de recuperação de uma planta danificada pelo frio dependem do manejo que o produtor adota na área. Uma das dicas é manter o terreno limpo nas entrelinhas dos cafezais, a fim de minimizar a umidade e as temperaturas baixas nas plantas.
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Em casos de geadas, diz ela, “a depender da área, alguns manejos técnicos são necessários, como esqueletamento (corte dos ramos laterais), poda ou até mesmo arranquio da planta, a depender do nível de queimadura da folha”.
Outra recomendação feita pela técnica é fazer a arborização, para minimizar a formação de corredores de vento frio em meio aos cafezais. Já em relação ao manejo em viveiros, a recomendação é o aquecimento das mudas assim que as temperaturas caírem. “Não é para deixá-las aquecidas o tempo todo, mas apenas no ato da ocorrência. É ficar acompanhando diariamente as previsões climáticas e prevenindo-se em tempo”, resume.
Os produtores do Paraná colheram 35 sacas de soja por hectare, volume 41% menor que o esperado (Foto: Sergio Ranalli)
Cultura castigada
Outra cultura castigada pelo clima adverso do ano passado foi a citricultura. A estimativa de safra do Fundo de Defesa da Citricultura (Fundecitrus), realizada em parceria com Markestrat, FEA-RP/USP e FCAV/Unesp, aponta a produção de 262,86 milhões de caixas de 40,8 quilos no cinturão citrícola de São Paulo e do Triângulo/Sudoeste Mineiro. O volume é 10,61% menor do que a previsão inicial e representa uma de 31,20 milhões de caixas.
Vinícius Trombin, coordenador da pesquisa de safra do Fundecitrus, explica que a redução drástica das chuvas em meados do ano passado, que ficaram 27% abaixo da média
histórica, e as geadas atípicas de alta intensidade inibiram o crescimento das laranjas e contribuíram para o aumento da queda prematura de frutos, reduzindo a quantidade de laranjas que chegaram à colheita – configurando o segundo ano consecutivo de uma safra pequena.
“Na estimativa que divulgamos em maio de 2021, já estava contemplado um menor volume de chuvas que afetaria a produtividade dos pomares. Mas, como enfrentamos a pior seca de quase um século, os danos foram maiores que o esperado”, completa. Embora este tenha sido um ciclo de bienalidade positiva, ano em que as plantas produziriam uma quantidade maior de frutos, as condições climáticas adversas fizeram com que os pomares perdessem produtividade, fazendo a safra recuar 2,11% na comparação com a temporada anterior.
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Adversidades climáticas
As adversidades climáticas estão influenciando o mercado de seguro rural. Pedro Loyola, diretor do Departamento de Gestão de Riscos do Ministério da Agricultura, avalia que o risco climático está se tornando mais frequente e mais severo. Prova disso é que o governo
federal desembolsou, por meio das seguradoras, R$ 5,4 bilhões em indenizações aos agricultores no ano passado.
As lavouras de milho de segunda safra foram responsáveis pelo maior volume de indenizações em 2021, pois os produtores do Paraná, Mato Grosso do Sul e São Paulo tiveram muito sinistro decorrente da estiagem, o que foi agravado por geadas. Além de estiagem e geadas no milho, contribuíram para um aumento da sinistralidade as geadas ocorridas no café, principalmente em Minas Gerais e São Paulo.
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Source: Rural