Diminuir a dependência da importação de nitrogênio tem sido prioridade para produtores rurais, à medida que a oferta de fertilizantes está em crise no mercado mundial desde o início da guerra entre Rússia e Ucrânia. Pesquisadores brasileiros, mesmo antes do conflito, já vinham se dedicando a estudar e oferecer alternativas que barateassem os custos do produtor e facilitassem a fixação de nitrogênio no solo.
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Trevo tropical em área de integração lavoura-pecuária-floresta no Sul da Bahia (Foto: Divulgação/Embrapa)
Uma solução que tem ganhado mais atenção é o uso das forrageiras, plantas que servem como fonte de alimento para animais e plantas, variando entre gramíneas ou leguminosas. Uma tecnologia da Estação de Zootecnia da CEPLAC no extremo Sul da Bahia com colaboração da Embrapa, deu luz a uma tecnologia que pode ser replicada em todo o Brasil: a combinação entre leguminosas e braquiária.
As forrageiras conseguem retirar nitrogênio do ar e transformá-lo em aminoácidos e proteínas aproveitados por animais e plantas. No caso das leguminosas, elas enriquecem o solo com nitrogênio, resultando na economia de uso do fertilizante nitrogenado. Combinado com a braquiária, os níveis de nitrogênio fixados no solo também permitem que o produtor não precise mais aplicar ureia, outro elemento impactado pela guerra e com custos elevados.
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Claudia Rezende, pesquisadora da Estação de Zootecnia da CEPLAC, diz que, comparando leguminosas com pastagem nitrogenada, há uma diferença grande de custo. A conta que ela faz para elucidar é que o trevo tropical, com a capacidade de fixar 150 quilos de nitrogênio por hectare/ano no solo, evita o uso de 300 quilos de adubo nitrogenado sintético.
Assim, amendoim forrageiro e desmódio, também chamado de trevo tropical, são alternativas de forrageiras leguminosas indicadas por Bob Boddey, pesquisador da Embrapa Agrobiologia, a serem consorciadas com braquiária. “É um velho assunto, mas com progresso muito grande. Até recentemente, pensamos que as leguminosas forrageiras não poderiam conviver com braquiária, mas isso estava errado”, diz.
O pesquisador esclarece que o segredo para as leguminosas é mantê-las entre 10 centímetros e, no máximo, 30 centímetros de altura em relação ao pasto. “Se fica muito baixo, acaba afogando a gramínea”, comenta.
ILPF
A produção de capim de alta qualidade é uma porta de entrada para o sistema de integração lavoura-pecuária-floresta (ILPF). “Você pode plantar soja e, antes de formar o grão, fixa-se muito nitrogênio a ser incorporado no solo. Depois, coloca-se a pastagem ou silvicultura em seguida, substituindo a necessidade de fertilizante nitrogenado”, sugere Bob.
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Com o tempo, a leguminosa enriquece o solo, a gramínea cresce melhor e o animal engorda mais rapidamente. Isto é, o manejo apropriado de consórcio de braquiária com leguminosas pode ser economicamente favorável.
“Em um experimento de nove anos de pastejo sem renovação da pastagem, foi observado o rendimento do animal chegando a um ganho de peso de 2,5 quilogramas por hectare por dia”, diz o pesquisador ao contar que foi utilizado 25% de fertilizante nitrogenado a menos na planta. “No momento, se a semente está disponível, nós favorecemos o trevo tropical com capim marandu debaixo do eucalipto, ideal para a integração lavoura-pecuária-floresta”, indica.
O trevo tropical ainda é disseminado pelo próprio gado por meio das fezes. O animal se alimenta de sal e sementes da forrageira leguminosa e no momento de evacuação as sementes acabam sendo depositadas no solo, germinam e novamente a fixação de nitrogênio é favorecida.
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Sustentabilidade
Além de melhorar a qualidade do solo e a alimentação do gado, há ainda o ganho ambiental por diminuir a emissão de gases de efeito estufa e, consequentemente, frear o avanço do aquecimento global. Ainda em relação às mudanças climáticas, Bob Boddey admite que o “grande vilão é o metano entérico”.
No entanto, dados preliminares de experimentos mostram que o consórcio entre trevo tropical e braquiária possibilita menor emissão de metano e ainda diminui o estímulo à produção de adubo químico, que por si só já emite dióxido de carbono. Cada quilo de fertilizante produzido, segundo a Embrapa, exige entre quatro e cinco quilos de CO2 equivalente queimado para ser produzido.
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No momento, admite o pesquisador, o grande problema é a produção de sementes de leguminosas. Bob revela que o grupo Matsuda está produzindo o trevo tropical e a expectativa é que a oferta seja ampliada a partir de 2023, inclusive com a adaptação de maquinário para a colheita das sementes. Ainda assim, as sementeiras devem ficar atentas ao possível crescimento desta demanda.
Source: Rural