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O aumento da mistura obrigatória de biodiesel, proposta pela Frente Parlamentar Mista do Biodiesel (FPBio) em meio ao risco de desabastecimento de diesel fóssil no país, deve ter impacto direto sobre a inflação de alimentos diante do aumento no preço do óleo de soja, fonte de 90% da matéria prima usada na produção do biocombustível, e do próprio diesel – hoje mais barato que a alternativa renovável.

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“O mercado de biocombustíveis é muito influenciado por políticas públicas. A partir do momento que tem um anúncio desses, existe um incremento gigantesco de demanda, o mercado já antecipa essa alta de demanda e o preço fica instantaneamente mais caro”, explica o head de energia da Stonex, Smyllei Curcio. Segundo ele, não há dúvidas de que o principal óleo usado na culinária brasileira subirá de preço caso haja, de fato, aumento da mistura.

soja-oleo-preco (Foto: oleo de soja)

 

“O mercado é muito instantâneo. Eu tenho certeza que se esse anúncio saísse 20h, às 7h o mercado já estaria em outro patamar de preços porque o mercado já precificaria esse aumento”, observa o analista ao destacar o peso do Brasil no mercado internacional de soja.

O país é o maior produtor e terceiro maior consumidor mundial da commodity, mas está longe de conseguir influenciar as cotações na bolsa de Chicago, onde é negociada. Com isso, quanto mais desvalorizado o real, mais cara a matéria prima se torna no mercado interno em meio a um cenário inflacionário alimentado por quebras de safra e restrições na oferta do leste europeu.

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Para o economista e membro do Instituto Fome Zero, José Giacomo Baccarin, “esse é o pior momento possível para usar matéria prima agrícola para outras finalidades”, dada a forte inflação dos alimentos no país. “Até 2019 nós tivemos o óleo de soja crescendo abaixo do Índice de preços de alimentação. Nesse momento, a partir de 2020 a soja é campeã e seus derivados foram os que mais subiram de preço, de janeiro de 2021 a março de 2022 a alta acumulada do óleo de soja foi de 136,07% e da margarina de 41,37% enquanto a inflação geral foi de 18,72% no período e a de alimentos 29,16%”, ressalta Baccarin.

Embora sejam itens que tenham menor impacto na dieta dos brasileiros, o economista lembra que os derivados da soja são matéria prima para outros produtos alimentícios, como processados e ração animal – que também sofreriam impacto diante de uma alta de preços no mercado. “Dentro da participação no consumo das pessoas, a presença dos derivados de soja não é tão grande quanto carnes, trigo e leite, por exemplo, mas tem um efeito, sim, sobre a inflação de alimentos e, sob esse ponto de vista, este é o pior momento”, completa o representante do Instituto Fome Zero.

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Uma solução difícil

“Infelizmente não há uma solução fácil. Apesar de parecer uma solução muito boa – e é, pensando na indústria nacional e no biocombustível, que é o que a gente precisa, economicamente é uma decisão muito difícil porque o governo está muito pressionado por causa da inflação”, pontua Smyllei ao destacar o duplo efeito do aumento da mistura na inflação: no preço dos derivados da soja, como óleo e margarina, e no próprio diesel, hoje negociado pela metade do preço do biocombustível nos leilões da ANP.

“Já existe uma flexibilidade, sendo permitido às distribuidoras adicionar até 15% de biodiesel ao diesel. Isso já é permitido. Ela é obrigada a misturar 10%, mas já pode misturar 15%. Mas por uma questão de preço, obviamente, as distribuidoras não vão fazer isso”, lembra o especialista da Stonex ao ressaltar que, na atual situação, qualquer centavo no preço do diesel impactará a inflação no país, já acima de 10% no acumulado de doze meses.

De acordo com o diretor executivo da Frente Parlamentar Mista do Biodiesel (FPBio), João Henrique Hummels, o setor não propôs o aumento da mistura, apenas colocou-se à disposição para aumentar a oferta diante de uma eventual escassez de diesel no mercado. “Nos não estamos pleiteando isso, estamos colocando ao governo a  possibilidade, se ele tiver dificuldade, de a gente colocar isso”, afirma Hummels ao destacar que o setor está preparado para atender a um aumento de 10% para 12% na mistura este ano.

Segundo o cronograma de adoção do biodiesel no Brasil, a mistura no diesel deveria estar em 14% (B14) este ano, mas tem sido mantida em 10% pelo governo federal desde o ano passado, medida que tem penalisado usinas que investiram na expansão da capacidade de produção, hoje ociosa. Segundo Smyllei, essa capacidade instalada poderia gerar uma oferta duas vezes maior de biodiesel no país, não fossem os preços desfavoráveis para a commodity.

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“Estamos com uma margem de esmagamento muito grande, o Brasil exporta 70% do que consome. Por mais que haja quebra de safra, nós continuamos esmagando muita soja. Isso gerou um excedente muito grande de óleo, devemos chegar a quase 2 milhões de toneladas de exportação de óleo de soja. É um número muito alto perto do que vínhamos exportando, entre 1 milhão e 1,3  milhão de toneladas”, explica o especialista.

Hummels, da FPbio, afirma que os cálculos realizados pelo setor ao acenar com o aumento da mistura não levam em consideração o impacto na inflação de aliementos, mas garante que são baseados no volume que hoje é exportado. “Nós só vamos substituir o que se está exportando e colocar internamente. E, qualquer coisa, está liberada a importação de óleo”, defende o diretor executivo da frente parlamentar representativa do setor ao ressaltar que a medida evitaria a importação de 100 mil litros de diesel por mês.

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Source: Rural

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