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O Código Florestal (Lei 12.651) completa dez anos. Aprovado no dia 25 de maio de 2012, depois de ampla discussão no Congresso Nacional entre representantes do setor agropecuário e ambientalistas, o texto que define as normas de utilização e conservação da terra no Brasil ainda é implantado a passos lentos no país, ao mesmo tempo em que tramitam diversos projetos com a intenção de modificá-lo.

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Vista aérea da área desmatada da Floresta Amazônica, em Rondônia. Código Florestal, que completa dez anos, define as regras de uso e de preservação da terra no Brasil (Foto: REUTERS/Ueslei Marcelino)

 

Levantamento realizado pelo Centro de Sensoriamento Remoto da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), com base nos dados do Sistema Nacional de Cadastro Ambiental Rural do Ministério da Agricultura (Mapa), apenas 0,4% destas propriedades tiveram sua análise do CAR feita com sucesso. Isso significa que, após dez anos, somente 29 mil propriedades do Brasil tiveram as análises feitas com sucesso. 

O Cadastro Ambiental Rural (CAR) é um dos principais instrumentos do Código Florestal. É por meio desses dados, informados pelo proprietário rural, que o governo atesta se a área está de acordo com a legislação ou se tem algum passivo, que deverá ser regularizado. A regularização é feita pelo Programa de Regularização Ambiental (PRA). 

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Estas ferramentas de implementação do Código foram a principal mudança estabelecida em relação a versões anteriores. A primeira delas, de 23 de janeiro de 1934, sancionada pelo presidente Getúlio Vargas, conforme relata Roberta Del Giudice, secretária executiva do Observatório do Código Florestal. 

“Não tinha processo de implementação, era uma lei que ficava na gaveta. Ter um Cadastro Ambiental Rural (CAR), um Programa de Regulação Ambiental (PRA), são mecanismos de implementação que fizeram a diferença”, diz.

Roberta lembra que a articulação de uma nova versão da lei começou ainda em meados de 2001. Na época, em um contexto global, já havia sido discutido o Protocolo de Kyoto, em 1997, quando os países se reuniram em Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre a Mudança do Clima. Era o mundo olhando com mais atenção para as emissões de gases de efeito estufa e a progressão das mudanças climáticas.

Ou seja, só depois de mais de 70 anos da primeira edição do Código, o País começou a entender a importância de colocar a legislação em prática. No entanto, diz Roberta Del Giudice, apesar do avanço da lei atual, a implementação não contou com um planejamento prévio. O resultado é a atual morosidade na validação do CAR dos quase seis milhões de imóveis rurais cadastrados, para que então o PRA tenha continuidade.

Responsabilidade estadual

Do total dos cadastros, 92% aguardam análise e pré-validação, enquanto 7% estão sendo analisados ou têm pendências. Para Roberta, os números são a prova de que a análise está muito lenta. A responsabilidade, diz ela, é dos governos estaduais. Também é papel dos Estados decidir qual ferramenta de validação usar, que pode ser própria ou a disponibilizada pelo governo federal. 

Entre os maiores atrasos na validação do CAR, ela cita Sergipe, Alagoas e Rio Grande do Norte. “Para começar a implementar o PRA, os Estados deveriam dizer que vão avaliar pela regra local ou seguir o Serviço Florestal Brasileiro. A maioria já estipulou essa regulamentação, mas esses três estados nem fizeram isso. Sem essa diretriz, nem dá para começar a análise”, ela lamenta. 

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Segundo Raoni Rajão, professor do Centro de Sensoriamento Remoto da UFMG, são inaceitáveis as diferenças entre os prazos de implementação nos Estados, pois demonstra que o sistema funciona de forma irregular. "Pará, São Paulo e Mato Grosso são os que mais avançaram nas análises. E, de forma geral, os que mais avançaram foram os que seguiram com cadastro próprio, enquanto os estados que se apoiam somente nos sistemas fornecidos pelo Ministério da Agricultura tendem a seguir de forma mais lenta", diz o professor.

Na visão do deputado Sergio Souza (MDB-PR), presidente da Frente Parlamentar da Agropecuária (FPA), é um desafio implementar o Código em âmbito federal e a aplicação depender de cada Estado. “Os Estados estão fazendo sua parte. Aqueles que tiveram melhor orçamento puderam acelerar o processo de análise, mas há um esforço por parte do Ministério da Agricultura para que todos avancem”, comenta. 

Muni Lourenço, presidente da Comissão de Meio Ambiente da Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA), também admite que um dos grandes desafios é dar celeridade ao trabalho dos Estados. 

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“Sabemos que existem situações como carência de pessoal, algumas estruturas públicas das secretarias de meio ambiente e órgãos ambientais, mas estamos muito confiantes que isso vai ser dinamizado, inclusive com o lançamento do AnalisaCAR”, afirma. Ele se refere à ferramenta lançada pelo Mapa no ano passado para fazer as análises de forma digital. A expectativa da então ministra Tereza Cristina era analisar todos os cadastros até o final de 2022.

Mudanças na Lei

Embora o Código Florestal ainda não tenha sido implementado na sua plenitude, o que não faltam são iniciativas para modificá-lo. Para Roberta Del Giudice, é um retrocesso. “A lei precisa avançar pela urgência climática, para o bem da produtividade brasileira e para a nova economia que surge com a mudança do clima.”

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A secretária executiva do Observatório do Código Florestal ainda alerta para a perda de tempo em se discutir um texto que já entrou em vigor. “A gente vê muita perda de tempo em discutir alterações a favor de poucos, quando poderíamos estar unindo esforços, e inclusive recursos, para acelerar as análises estaduais”, adiciona.

Sergio Souza, por outro lado, é a favor de algumas alterações e admite que está trabalhando em prol de duas mudanças principais: a prorrogação do prazo de adesão ao PRA, que atualmente é dia 31/12/2022, e a obrigatoriedade de aplicação do Código Florestal sobre a Mata Atlântica. A legislação que vigora sobre o bioma é a Lei da Mata Atlântica. 

“Estamos trabalhando na prorrogação do PRA, para que o produtor tenha mais tempo de se adequar, e isso está na Comissão de Meio Ambiente [da Câmara dos Deputados], e também na interpretação do artigo 13 do Código, para ele valer para todos os biomas. Construímos um Código para todo o País e nenhum bioma deve ficar de fora”, defende o presidente da FPA. 

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Propostas de mudanças requerem atenção, principalmente neste ano eleitoral, alerta Roberta, do Observatório do Código Florestal. Segundo ela, além de prorrogação de prazos do PRA e aplicação a lei sobre os biomas, há projetos também para reduzir a área a ser restaurada na Amazônia e retirar o Estado de Mato Grosso da Amazônia Legal.

“O que falta é vontade política, porque quando se tem isso, você coloca recursos para acontecer. Falta recursos nos Estados, base de dados com imagens de satélites, falta de recursos humanos, mas isso tudo deriva da vontade política. Vamos ver se o eleitor está um pouco preocupado com as questões ambientais”, ressalta.
Source: Rural

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