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Há oito anos, Gustavo Alexandre Grossi, produtor de grãos em Monte Carmelo (MG), observou que uma parte de sua lavoura de soja estava crescendo demais, mas não produzia. Terceira geração de uma família de agricultores, ele se desafiou a entender os motivos. Em uma caminhada noturna pela fazenda, viu que o grão com crescimento mais acelerado recebia luz de um poste da estrada que passa ao lado da fazenda.

“Vi que, quanto mais próximo da luz, a soja vegetava mais, crescia e não produzia. Era a chamada soja louca. Já a parte do talhão que recebia menos luz produzia bem melhor que as outras áreas”, explica.

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Testes feitos pela empresa mostraram aumento de produtividade de até 57% em lavouras de soja (Foto: Divulgação/Fienile)

 

A partir dessa observação, o produtor se associou a pesquisadores de universidades para criar uma tecnologia inédita de suplementação luminosa. Luzes de LED são instaladas em pivôs centrais de irrigação para estimular a fotossíntese da planta também à noite com o objetivo de aumentar a produtividade, reduzir a necessidade de aplicação de fungicidas e compensar ou substituir a baixa disponibilidade de luz natural e irrigação em determinadas regiões e culturas. “Não é apenas luz, é a luz correta e na frequência apropriada”, afirma.  

No caso da soja, pesquisas iniciais mostraram uma produtividade até 57% maior com a suplementação e uma redução significativa de uso de fungicidas. Na cana-de-açúcar, testes em uma fazenda do Triângulo Mineiro apresentaram lavouras 20% mais produtivas.

A tecnologia de suplementação luminosa outdoor que recebeu o nome de Irriluce (irrigar com luz, em italiano) demandou um investimento de R$ 15 milhões em oito anos, segundo Grossi. Foi apresentada, nesta semana, pelo Grupe Fienile, na Agrishow, em Ribeirão Preto (SP). A empresa é comandada por Grossi, com formação em gestão do agronegócio e MBA em gestão ambiental.

Desenvolvimento

Para desenvolver a tecnologia, Grossi contratou há três anos o pesquisador Ernane Miranda Lemes, engenheiro agrônomo com doutorado em microbiologia do solo, e instalou leds em pivôs centrais. Separou então 100 hectares de sua fazenda para testar a tecnologia em 18 culturas, entre elas soja, milho, trigo, sorgo, girassol, tomate, cebola, batata, algodão, cana e feijão. No experimento, dividiu as lavouras em três áreas: uma recebia suplementação todos os dias, a segunda recebia em dias alternados e a outra não recebia nada.

“Começamos a entender que a suplementação luminosa agrega mais ou menos produtividade dependendo da região, tipo de solo, clima, manejo empregado, tipo de irrigação, volume de fertilizantes etc. A luz faz a planta crescer e ‘comer’ mais. Sem uma análise de solo, falta equilíbrio na suplementação. Vimos também que cada cultura demanda um tipo de cor de luz, uma intensidade, um determinado número de horas de exposição.”

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Segundo Grossi, os melhores resultados da suplementação foram observados nas culturas de soja, milho, cana, girassol, trigo, sorgo e batata. Lemes, o diretor de pesquisas do Grupo Fienile, destaca que não adianta oferecer mais luz se a planta não tiver condições de extrair nutrientes e água do solo para se desenvolver de forma adequada.

O CEO da Fienile não revela o custo da tecnologia, mas garante que é menor do que o gasto do produtor com adubo por hectare safra sem a suplementação luminosa. Gustavo Grossi explica que os módulos de LED são instalados em pivôs centrais e sua eficácia depende de toda a cadeia produtiva estar bem alinhada.

No modelo de negócios da empresa, o equipamento é cedido em comodato de três anos, com pacote que inclui análises de solo e de folhas, monitoramento por satélite e assessoria agrícola e econômica da empresa. Ou seja, o cliente compartilha os dados com a empresa e passa a ser parceiro no desenvolvimento da técnica.

“A suplementação luminosa começa com uma consultoria com o produtor interessado para entender o que a área dele apresenta de possíveis fatores limitantes, o que é possível melhorar em termos de manejo, estrutura e química do solo, nutrição para a planta e o próprio modo de lidar com a lavoura", diz ele.

Suplementação com luz artificial é instalada no pivô de irrigação (Foto: Divulgação/Fienile)

 

Testes

O produtor e empresário diz que a tecnologia está sendo usada comercialmente em estufas de frutas e em áreas com pivô espalhadas por Minas, Bahia, Mato Grosso e Rio Grande do Sul. E vem sendo também testadas em lavouras de diferentes cultiras no país.

Produtor de soja, milho e trigo em uma fazenda de 50 hectares na cidade gaúcha de Jacuizinho, Vilmar Luiz Stefanello conta que ouviu falar da suplementação luminosa há três anos. Passou três dias em Monte Carmelo vendo de perto como funciona e decidiu testar. “Eu já tinha o pivô e agreguei a tecnologia para explorar o potencial da minha lavoura.”

O agricultor montou a primeira área de testes em cultura de soja aplicando a luz artificial em metade do talhão de 12 hectares equipado com pivô central. Ele conta que, assessorado pela Fenile, plantou o grão  no mesmo dia e fez os mesmos tratos culturais nas duas áreas. Resultado: colheu 102 sacas por hectare na área que recebeu suplementação de luz e 75 na sem luz, mesma média da sua produção na fazenda.

“Obtive recorde de rentabilidade e ainda gastei muito pouco com a luz extra. Achava que o consumo de energia ia ser alto, mas não passou de uma saca e meia de soja”, comemora o agricultor, afirmando que utiliza agricultura de precisão em sua fazenda há alguns anos, em busca de máxima eficiência.

O teste no trigo também foi muito bem-sucedido: colheu 8,5 sacas a mais por hectare na área com iluminação artificial. Já no milho, a tecnologia não funcionou. O produtor diz que vai ter que repetir o teste porque plantou atrasado e a cultura sofreu ataque de cigarrinhas.

“Recebo informações todas as semanas. Minha lavoura é monitorada por satélites e, como filho de italianos, tenho que ver para crer. Sei que funciona, mas ainda estou tentando entender como usar para explorar melhor o potencial das culturas. Já sei que a luz é a cereja do bolo, mas tem que fazer a massa antes”, diz Stefanello, que diz ter pago de 8 a 10 sacas de soja por hectare pela tecnologia.

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A tecnologia de iluminação artificial também está sendo testada em uma parceria público-privada que envolve a Universidade do Estado de Santa Catarina (UESC), a fábrica de cervejas Ambev e a Fienile. O pesquisador da universidade Hyan de Cássio Pierezan conta que iniciou o trabalho no ano passado, na área experimental de plantio de lúpulo da empresa, em Lages (SC). Foram espalhados 20 módulos de LED de 100w em um hectare.

“Com a suplementação luminosa em postes, conseguimos aumentar a produtividade e a qualidade do lúpulo.” Segundo ele, a planta passou de uma safra anual para duas e a segunda repetiu o desempenho da primeira. A produção atingiu 400 gramas de cone (parte da planta que emerge da flor e é usada na fabricação da cerveja) seco por planta na área suplementada ante as 140 gramas da área que não recebeu luz.

De acordo com o pesquisador, mesmo em anos de produtividade ruim, a tecnologia se mostra bem produtiva e melhora a qualidade do lúpulo, atendendo às exigências do mercado cervejeiro.

Grossi, o CEO da empresa, pretende ainda testar sua tecnologia em uma área própria, de 600 hectares, que comprou na Chapada dos Guimarães (MT). Ele estima um investimento de R$ 25 milhões em três anos. Além disso, a empresa deve assinar em breve um parceria com a Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa), para validação do sistema.

Chang Wilches, coordenador de suporte à inovação da Embrapa Cerrado, confirmou que a parceria já está acordada e só falta a assinatura. Segundo ele, as pesquisas deverão ser feitas na área experimental da instituição, em Brasília (DF), em diferentes biomas do Cerrado, por um período de dez anos. “A suplementação luminosa das lavouras tem grande potencial. À medida que a pesquisa avançar, vamos validando e fazendo os lançamentos", diz.

 

 

Pivô de luz para sequeiro

Além de apresentar o Irriluce, o Grupo Fienile lançou na Agrishow um pivô para áreas de sequeiro. O equipamento faz os movimentos normais do pivô, mas não irriga água, somente luz. O objetivo é levar a tecnologia da suplementação luminosa para áreas sem pivô de irrigação que recebem muita chuva e têm muitos dias nublados. A irrigação por luz teria o efeito de evitar ou reduzir a evaporação de água do solo.

Segundo Grossi, o pivô só é ligado nos dias nublados e à noite e sua estrutura é a mesma do pivô de irrigação, porém mais leve. “Não tem tubulação de água, nem o conjunto de motobombas para bombear água. A estrutura só vai sustentar os módulos, gerando uma redução de peso de aproximadamente 30% e gastando menos energia.”

O preço do equipamento, segundo o CEO, é de 40% a 60% menor que o de um pivô de irrigação.
Source: Rural

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