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Nos anos 1970, a atividade rural no Brasil era feita majoritariamente até a 600/700 quilômetros da costa. As capitais eram quase todas costeiras, assim como os maiores centros urbanos, de modo que a produção ficava mais próxima do consumidor. E até os anos 1970 eram importados cerca de 30% dos alimentos aqui consumidos.

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Foi naquele tempo que se organizou um dos maiores movimentos de transformação de toda a história brasileira. O governo federal decidiu, estrategicamente, ocupar a região central do país, que era um grande vazio populacional e econômico, e para isso optou pelo avanço da agropecuária como instrumento de desenvolvimento integrado.

Vozes do Agro (Foto: Estúdio de Criação)

 

Em 29 de janeiro de 1975, foi publicado o decreto número 75.320, instituindo o Polocentro – Programa de Desenvolvimento do Centro-Oeste, que contemplava, entre outros ambiciosos projetos, o financiamento para incorporação de novas áreas ao processo de produção agropecuária e de insumos agrícolas. A região era formada em grande parte pelo Cerrado, com solos pobres e degradados, com acidez alta e pouca capacidade de retenção de umidade. Os fazendeiros tradicionais do Sudeste e do Sul do país tinham até uma frase emblemática a esse respeito: “Cerrado, só dado ou herdado”. Ninguém queria.

Mas, com crédito abundante e barato, aconteceu um fenômeno extraordinário: puxados por gaúchos determinados e valentes, iniciou-se a epopeia da marcha para o Oeste. Lá compraram terras em grande extensão e – do zero, do nada – montaram o “Maracanã” onde seria jogada a partida final da Copa do Mundo da Segurança Alimentar, que venceremos. Atrás deles foram catarinenses, paranaenses, paulistas, mineiros, capixabas, nordestinos, numa saga tão épica quanto a conquista do Oeste nos Estados Unidos, que é exibida há décadas em filmes maravilhosos de faroeste que mostram a bravura dos desbravadores daquela região. É incrível como essa fantástica marcha brasileira não seja trombeteada aos quatro ventos como fazem os norte-americanos.

Foi uma façanha que mudou o país e o mundo em termos de oferta de alimentos, às custas de sacrifícios de pessoas e famílias inteiras que se mesclaram num cadinho de raças cujo resultado é um vigor híbrido que reenergiza a vontade de crescer daqueles bravos bandeirantes modernos.

Deu certo por causa da determinação desses homens e mulheres que deixaram todas as suas raízes para trás e foram construir o Brasil profundo. Deu certo também porque a “domesticação” do Cerrado, iniciada nos anos 1960por pesquisas de técnicos do IAC, foi completada pela Embrapa, criada em 1973. Foi a tecnologia sustentável aí desenvolvida a alavanca essencial para essa transformação que fez do Brasil um dos três maiores exportadores de alimentos do planeta.

E num momento em que o mundo se atordoa com a falta de fertilizantes, um número mostra o que aconteceu por aqui: em 1975, quando o Polocentro foi lançado, nossos agricultores consumiram menos de 2 milhões de toneladas de fertilizantes. No ano passado, somente
46 anos depois, esse consumo subiu para mais de 43 milhões de toneladas. Dá para entender agora a demanda por importações

*Roberto Rodrigues é coordenador do Centro de Agronegócio da FGV, embaixador especial da FAO para as cooperativas e titular da Cátedra de Agronegócios da USP.

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Source: Rural

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