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A incerteza sobre o mercado de fertilizantes, reforçada pela guerra entre a Rússia e a Ucrânia, colocou em alerta o agronegócio brasileiro, importador da maior parte do insumo usado no campo. Boa parte desses fertilizantes vem da Rússia, mas o governo recomendou a suspensão dos embarques em função de riscos logísticos e sanções aplicadas ao país. Diante da situação, economizar fertilizantes e atentar para o manejo eficiente do solo tem sido a orientação da Embrapa e de representações do setor.

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Na falta de fertilizantes, produto brasileiro estuda meios de economizar no campo (Foto: Divulgação)

 

A avaliação é de que, pelo menos o início do plantio da safra 2022/2023, está garantido, pois a maioria dos agricultores compra o produto antecipadamente. Mas há riscos sérios a partir de setembro, caso o conflito continue. “Há grande risco de faltar potássio, porque a Bielorússia e a Rússia são os maiores exportadores, só perdem para o Canadá”, afirma José Carlos Polidoro, pesquisador da Embrapa Solos, no Rio de Janeiro.“Não temos notícia que a indústria parou de produzir fertilizantes, mas houve o embargo. Acabou a guerra, tudo volta ao normal, mas agora estamos em alto risco.”

Para ajudar o produtor adotar melhores práticas de manejo do solo e economizar no uso do fertilizante, a Embrapa iniciará em abril a Caravana FertBrasil. Técnicos serão enviados para 30 polos agrícolas, cobrindo 90% da área plantada do País. A iniciativa, que será realizada até abril de 2023, levará conhecimento sobre a correta avaliação do solo e a dosagem necessária de adubo com o objetivo de, em média, elevar a eficiência do produto em 10%.

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Segundo Polidoro, os fertilizantes usados hoje chegam a ter eficiência de até 60% e, com a iniciativa, a ideia é elevar para 70%. “Isso significa uma economia de 10% em fertilizantes. Ou se usa menos e mantém a produtividade, ou você usa a mesma quantidade e aumenta a produtividade melhorando a eficiência”, explica o pesquisador.

O pesquisador explica que há casos de o produtor não realizar a análise do solo antes do plantio e, muitas vezes, mesmo dispondo das informações sobre a fertilidade, aplicar o fertilizante de acordo com o preço. Para o pesquisador, seria como precisar tomar um remédio, mas calibrar a dosagem de acordo com o preço do produto, sem considerar a receita médica. “Dá para se melhorar muito com melhores práticas agrícolas e tecnologia. Boa parte já faz boas práticas, mas todos podem melhorar. E, por isso, vamos com a nossa Caravana com expertise de mais de 40 anos com manejo de fertilizantes.”

Poupança na terra

Julio Cezar Busato, presidente da Associação Brasileira dos Produtores de Algodão (Abrapa), confirma que, para esta safra, não há qualquer risco. Nos Estados da Bahia, Goiás, Mato Grosso do Sul e Piauí o plantio começou em novembro do ano passado. Já Mato Grosso, que responde por 70% da produção de algodão, o plantio teve início em janeiro.

“Mas, para a próxima safra que vai começar em fim de novembro é outra história. Alguns produtores já adquiriram os fertilizantes, mas não deve passar de 30% do total. E o mercado está parado, porque não está tendo precificação pelos exportadores como Rússia e Bielorússia, que representam 40% do potássio. Isso nos preocupa muito”, explica Busato.

 (Foto: Divulgação)

 

A entidade está orientando os seus associados a fazer análises do solo e avaliar se é possível aproveitar a “poupança da terra”, ou seja, o reflexo de anos de anos de adubação, que elevou a fertilidade a um nível em que é possível de ser aproveitado o residual nas lavouras.

“O mercado de fertilizante está parado, compra-se caro e em pequenas quantidades. Mas ainda temos tempo”, diz o presidente da Abrapa ”O que pedimos aos associados é calma nessa hora, porque nós temos tempo. E usar a poupança que temos no nosso solo. Estamos usando fertilizante ao longo do tempo, elevamos a fertilidade e podemos usufruir um pedaço do que já está no solo. E quando as coisas voltarem ao normal, repomos isso.”

Quem tem o mesmo raciocínio é o presidente institucional da Associação Brasileira dos Produtores de Milho (Abramilho), Cesario Ramalho. Ele observa que tudo correu bem, sem preocupações, no plantio do milho de segunda safra, semeado a partir de janeiro, após a colheita de soja. “Mas o futuro é incerto: há preocupação para outubro, na nova safra, e grande preocupação para 2023.”

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“Mas nós temos uma coisa muito positiva para a agricultura, temos uma espécie de reserva de elementos no solo pelo trabalho que a gente vem fazendo há algum tempo, tenho uma poupança de potássio no solo, não preciso tanto de potássio. Pode ter risco de plantar com metade do fertilizante, e há que diga que planta sem fertilizante. Mas essa poupança ajuda. Mas a situação é bastante preocupante, mas sem pânico”, explica Ramalho.

O setor, que teve perdas de até 20 milhões de toneladas de milho na safra passada em decorrência da estiagem nos Estados do Sul e em Mato Grosso do Sul, não espera um impacto na produção em decorrência da crise dos fertilizantes. “Essa melhora da fertilidade do nosso solo vai produzir agora com menos fertilizante com certeza. Mantenho minha preocupação pelo País inteiro, mas não tenho nenhum pânico“, explica ele, que vai apoiar a caravana da Embrapa.

Orgânicos e organiminerais

Já o setor de cana-de-açúcar tem maiores preocupações, pois não compra fertilizantes antecipadamente para o plantio, explica Arnaldo Bortoletto, presidente da Cooperativa dos Plantadores de Cana de São Paulo (Coplacana), que também atua no Paraná, Minas Gerais, Mato Grosso do Sul e Goiás.

Bortoletto observa que o setor canavieiro não faz compra antecipada. ‘Até o momento estamos entregando as carteiras que temos, porque as empresas suspenderam as vendas. Mas afirmar, neste momento, que a produção irá reduzir é muito precoce, pois ainda temos fertilizantes nos estoques das empresas, embora a demanda tenha aumentado muito nestes últimos 10 dias.”

A cana é uma cultura semiperene, na qual a renovação dos canaviais ocorre no máximo a cada cinco anos. Cerca 80% da produção vem da chamada “cana soca”, na qual a cana é cortada e colhida após o primeiro plantio, mas logo em seguida nascem novos brotos da terra, para gerar as novas safras. “Hoje a situação mais crítica é para a cana soca. Para o plantio o pessoal já comprou”, diz o presidente da Coplacana.

A entidade está orientando aos associados fazrem a mistura de fertilizante mineral com esterco de galinha, porco e boi, os chamados organominerais. “Como ninguém sabe o que vai acontecer com o preço, que vem subindo e afetando o custo de produção, a alternativa que a cooperativa vem tomando é usar organomineral, de compostagem que nós temos, como esterco de galinha, suíno e boi para economizar no fertilizante, para sempre usar uma dosagem menor para não ficar sem”, explica.

Menos dependência

Dos 42,5 milhões de toneladas de fertilizantes entregues ao setor entre janeiro e novembro do ano passado, 35,6 milhões de toneladas foram importados, 83,7% do total, de acordo com dados da Associação Nacional para Difusão de Adubos (Anda).

Busato, da Abrapa, avalia que após muita discussão com o governo, agora será possível avançar na redução da dependência na produção de fertilizantes no Brasil. Para ele, a questão ambiental será equacionada, mas avalia que a sociedade precisa também apoiar. “Somos o maior produtor de soja do mundo, o segundo de milho, o quarto de algodão, mas sem fertilizantes não vamos produzir nem para o nosso mercado. Tem que ter apoio não só dos agricultores, mas de toda a sociedade para entender essa problemática.”

Em nota divulgada à imprensa, o presidente da Associação dos Produtores de Soja e Milho de Mato Grosso (Aprosoja-MT), Fernando Cadore, destacou a necessidade de desburocratizar o sistema de licenciamento no Brasil, para reduzir a dependência da importação do produto. “Precisamos desburocratizar o sistema de concessão e de licenciamento dessas jazidas de recursos minerais com potenciais para o uso de fertilizantes no país”, diz. “O Congresso Federal precisa agir rápido, é momento de deixar as ideologias e se preocupar com o futuro e a alimentação das pessoas, se o Brasil não agir rápido poderá acontecer escassez de alimentos, inflação e desemprego.”
Source: Rural

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