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Principal ferramenta da indústria processadora de soja para fazer frente às cobranças por maior sustentabilidade em sua cadeia de produção, a Moratória da Soja não tem sido suficiente para conter o desmatamento ilegal no Estado de Mato Grosso – maior produtor do país. A conclusão é do Instituto Centro de Vida (ICV), que fez um levantamento com base em registros públicos e imagens de satélite e constatou que 92% da supressão vegetal registrada em fazendas de soja mato-grossenses entre 2008 e 2019 ocorreu de forma ilegal.

Vista aérea de um desmatamento na Amazônia no município amazonense de Lábrea. (Foto: Victor Moriyama/Amazônia em Chamas)

 

“A gente tem a necessidade de um acordo da cadeia que olhe, para além a área de cultivo, para a fazenda como um todo. Porque, ao passo que houve, na Amazônia, 62 mil hectares de desmatamento ilegal sobreposto a área de cultivo de soja, a gente teve outros 97 mil hectares de desmatamento ilegal nessas fazendas de soja, mas fora da área de cultivo”, destaca a coordenadora do programa de Transparência Ambiental do ICV, Ana Paula Valdiones.

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Em vigor desde 2006, a Moratória da Soja é um compromisso firmado pela cadeia produtiva da oleaginosa de não adquirir e nem financiar a produção em áreas desmatadas após 2008. Esse compromisso, contudo, restringe-se ao local de cultivo da oleaginosa e não abrange o restante dessas fazendas – onde o desmatamento pode ocorrer para abrir espaço para outras atividades. Além disso, é válido apenas para a soja produzida no bioma amazônico – delimitação que também precisaria ser revista, segundo a pesquisadora do ICV.

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“No Cerrado, a gente encontrou 307 mil hectares de desmatamento ilegal, um número maior inclusive do que na Amazônia. É um bioma que tem uma proteção legal menor, com uma área de reserva legal de 20% a 35% e que acaba sendo bastante ameaçado pelo desmatamento ilegal que tem avançado no Estado”, detalha Ana Paula. Da área total desmatada ilegalmente no bioma, 97 mil hectares estavam ocupados com soja em 2019.

Fiscalização

O levantamento do ICV também alerta para a falta de punição nos casos de desmatamento ilegal. Apenas 30% dos imóveis nessa situação analisados pelo estudo apresentavam algum tipo de embargo federal ou estadual. Além disso, enquanto na Amazônia foram identificados 804 imóveis com embargo, no Cerrado, onde a área com desmatamento ilegal é 92,7% maior, o número de imóveis com embargo foi três vezes menor: 253 imóveis.

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Ana Paula afirma que, além de faltar fiscalização, os números revelam a fragilidade de alguns sistemas de monitoramento mantidos pela indústria. “Para os sistemas de monitoramento de compra que são focados unicamente no monitoramento das áreas embargadas, ainda tem uma parcela de desmatamento ilegal que estaria passando, porque não foram fiscalizados e responsabilizados”, pontua a coordenadora do programa de Transparência Ambiental do ICV.

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Ainda de acordo com o estudo, para cada hectare desmatado legalmente em fazendas de soja de Mato Grosso de 2008 a 2019, outros 11 foram desmatados sem autorização dos órgãos competentes. Ao todo, foram 511 mil hectares que tiveram a vegetação derrubada de maneira irregular em 3.516 propriedades, sendo 176 responsáveis por mais da metade.

Outro lado

Em nota, a Associação Brasileira das Indústrias de Óleos Vegetais (Abiove) reforçou que "a Moratória da Soja monitora os polígonos com soja" e que "havendo plantio de soja em polígonos com desmatamento após 2008, toda a fazenda é considerada não conforme na Moratória da Soja". Já se a soja for plantada em área desmatada após 2008, mas antes ocupada com outra atividade agropecuária, "a fazenda será considerada não conforme na safra subsequente ao plantio", explica a Abiove, ao defender o sucesso do programa mantido há mais de 15 anos.

"A Moratória da Soja é uma grande conquista para a indústria da soja, para nossos clientes e para todos os stakeholders interessados na redução do desmatamento no Bioma Amazônia. A Moratória promoveu reduções significativas no desmatamento nos municípios que produzem soja", afirma a entidade, ao destacar que "os atributos da Moratória da Soja foram ranqueados como de grande efetividade entre compromissos de desmatamento zero".

"Os procedimentos adotados pelas empresas signatárias da Moratória da Soja passam por auditorias externas. Por fim, a Moratória garante que a soja importada pelos compradores não foi plantada em área desmatada depois de 2008. Assim, a Moratória da Soja estabeleceu credibilidade para a soja brasileira e funciona como uma garantia de sustentabilidade para exportadores e compradores da soja", completa a Abiove.

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Globo Rural também entrou em contato com o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) para saber por que grande parte das fazendas de soja onde houve desmatamento irregular depois de 2008 não sofreu embargo na esfera federal. O órgão não respondeu até a publicação desta reportagem.

Já a Secretaria de Meio Ambiente do Estado de Mato Grosso (SEMA) enviou nota destacando que os “dados apresentados no estudo são anteriores à atual gestão, e não refletem os avanços na fiscalização, monitoramento e autuação alcançados a partir de 2019”.

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Segundo a Secretaria, Mato Grosso implantou em 2019 um sistema de monitoramento por satélite de alta resolução, o que gerou aumentou em 550% o número de autuações a crimes ambientais em 2021, em comparação ao ano de 2019.

“Nos últimos três anos, foram emitidos 9.366 autos de infração, montante que saltou de 771, em 2019, para 3.591, em 2020, e 5.004 em 2021. Cerca de 41 milhões hectares foram embargados nos últimos três anos”, afirma a SEMA, em nota.
Source: Rural

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