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O presidente da Associação dos Produtores de Vinho Finos da Campanha Gaúcha, Valter Potter, diz que um problema que se repete há cerca de cinco anos causou a perda de 15% da produção de uvas para vinho no Estado na safra 2021/2022, o correspondente a 1 milhão dos 7 milhões de quilos produzidos anualmente. Ele se refere à deriva dos herbicidas hormonais, especialmente os que têm como princípio ativo o 2,4-D, aplicados nas lavouras de soja para eliminar a buva, planta invasora muito resistente e comum no Estado.

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Produtores de uva do Rio Grande do Sul afirmam te rprejuízos milionários com deriva do 2,4-D (Foto: Pixabay)

 

Segundo os produtores, o agrotóxico é levado pelo vento, “viaja” até 30 quilômetros e causa prejuízos milionários em culturas sensíveis, como uvas, maçãs, oliveiras e outras frutíferas. O 2,4-D mata as plantas novas e atrofia as adultas, causando o enrugamento das folhas e o abortamento da floração, o que reduz o vigor da planta e derruba drasticamente a produção.

“O número de denúncias registrado na Secretaria da Agricultura nesta safra diminuiu, mas isso se deve ao desânimo dos produtores em denunciar porque nesses cinco anos nada evoluiu e nenhum produtor foi indenizado por suas perdas”, afirma Potter.

O produtor alega que as normativas criadas pela secretaria para regular o uso do agrotóxico e aplicar multas aos infratores das normas só funcionam no papel. Segundo ele, todos os vinhedos de Don Pedrito, onde ele tem sua produção e uma vinícola, e grande parte dos vinhedos de Bagé, de Livramento e Jaguari sofreram com a deriva do 2,4D novamente. Até uma área experimental da Universidade Federal do Pampa (Unipampa) em Don Pedrito foi prejudicada por duas derivas do produto hormonal.

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Rafael Lima, chefe da Divisão de Insumos da Secretaria da Agricultura, Pecuária e Desenvolvimento Rural (Seapdr) do Rio Grande do Sul, disse que 101 amostras de culturas sensíveis aos produtos hormonais da safra 2021/22 foram testadas neste ano e em 88% foi constatada a presença do 2,4-D. No total, 68 propriedades de 24 municípios foram atingidas.

O Laboratório de Análises de Resíduos de Pesticidas (LARP) da Universidade Federal de Santa Maria (UFSM) ainda deverá entregar à secretaria laudos referentes a outras 19 coletas.

O percentual de positivo é maior do que em anos anteriores, mas o número de amostras é menor e os sintomas, mais fracos, ressalta Lima. Na safra de 2019/2020, foram 85% de contaminações identificadas em 176 coletas. Em 2020/2021, 70% das 204 análises deram positivo para a presença de herbicidas hormonais. A concentração do ingrediente ativo hormonal nas amostras analisadas agora variou de traços até 40,33 mg/kg.

Lima diz que chamou atenção da secretaria o percentual mais elevado de positivos na região central do Estado, especialmente em Jaguari, município produtor de uva que sofre a influência de outros do entorno que não estão na lista das 31 cidades reguladas pelas normativas da secretaria, estabelecidas em 2020. Na próxima safra, as normativas que incluem obrigações na compra e aplicação dos herbicidas e multas para os infratores devem passar a valer para os 497 municípios do Estado.

Atraso

As amostras colhidas de agosto a novembro do ano passado só foram analisadas em janeiro porque não havia recursos no orçamento da secretaria para bancar os testes. “Estávamos aguardando verba das indústrias fabricantes do 2,4-D que estavam previstas no acordo feito com o Ministério Público, mas elas não vieram.” Este ano, os recursos para bancar os testes já foram previstos no orçamento da Seadpr. “Serviu como alerta para o Estado não depender de terceiros”, diz Lima.

O servidor público garante, no entanto, que nenhuma amostra foi perdida. O material coletado no prazo de até 48 horas após a denúncia foi congelado para aguardar a análise em laboratório. “Todas as denúncias feitas pelo canal da secretaria com localização e fotos dos sintomas nas lavouras foram investigadas pelos fiscais, que colheram as amostras. Em apenas cinco casos não foi possível fazer a análise porque a denúncia veio 30 dias depois dos sintomas.”

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O chefe de divisão cita um caso de contaminação em um pomar de maçãs de Vacaria que surpreendeu os fiscais. A denúncia e os sintomas eram claramente de deriva de 2,4-D, mas o laudo deu negativo para o produto hormonal e acusou a presença de glifosato, que havia sido usado tanto pelos vizinhos quanto pelo produtor das maçãs. “Nesse caso foi impossível identificar a origem do produto para a aplicação de multas.”

Quando a origem é identificada, além das multas que variam de R$ 1 mil a R$ 23 mil, o produtor infrator está sujeito a ser processado pelo Ministério Público. Na maioria das vezes, diz Rafael Lima, a deriva ocorre por deficiência ou má regulagem do equipamento de aplicação ou porque não são observadas as condições climáticas no momento de aplicar o produto na lavoura.

Ação civil

Desde dezembro de 2020, tramita na Justiça estadual uma ação civil pública movida pela entidade presidida por Valter Potter em parceria com a Associação Gaúcha dos Produtores de Maçãs (Agapomi) que pede a proibição do uso de produtos com o princípio ativo 2,4-D em todo o Estado. “Infelizmente, a Justiça no país é muito lenta. Houve despacho do juiz favorável a nós, mas o Estado recorreu e agora vamos ter que contestar o recurso”, diz Potter.

Na decisão liminar, em agosto, o juiz Eugenio Couto Terra, da 4ª Vara da Fazenda Pública de Porto Alegre, havia determinado que o governo gaúcho deveria apresentar um cronograma de implantação de um plano de efetivo controle de uso dos pesticidas hormonais, com metas aferíveis em curto, médio e longo prazo.
Source: Rural

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