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A tentativa de criar políticas públicas de incentivo à preservação do meio ambiente não é um tema novo. Há alguns anos, assistimos a iniciativas frustradas de emplacar projetos que auxiliem e despertem o interesse de produtores rurais para a preservação da terra rural. No início de 2021, foi criada a Política Nacional de Pagamento por Serviços Ambientais (Lei nº 14.119 de 13.01.2021) definindo conceitos, objetivos, diretrizes para a implantação dessa tão relevante política pública. Os efeitos ainda são tímidos e a implementação de projetos de grande escala ainda inexistentes. No entanto, alguns programas promissores vêm sendo implementados.

 

O Estado do Mato Grosso, após três anos de aperfeiçoamento e debates com produtores rurais, lançou através do Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia (IPAM), em parceria com as Secretarias de Estado de Meio Ambiente (Sema-MT) e de Desenvolvimento Econômico (Sedec-MT), o projeto de Compensação Financeira para Produtores com Excedente de Reserva Legal (Conserv).

Com o apoio dos governos da Noruega e dos Países Baixos, o Conserv objetiva transformar a conservação de florestas privadas da Amazônia Legal em renda extra ao produtor. Além do IPAM, o projeto conta com o apoio do Environmental Defense Fund (ED) e do Woodwell Climate Research Center.

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Nos termos do Código Florestal vigente, as propriedades rurais na Amazônia Legal devem ter preservadas 80% de sua vegetação nativa, se localizada no bioma Amazônia; e 35%, se localizada no bioma Cerrado. O grupo de desenvolvedores do projeto Conserv estima que aproximadamente 23 milhões de hectares na região podem ser considerados terras excedentes e podem ser legalmente derrubadas. Neste caso, só no estado do Mato Grosso, 7 milhões de hectares de terra estão nessas condições, o que se estima representar até 900 milhões de toneladas de carbono estocado, por exemplo.

O mencionado projeto é um mecanismo privado, de adesão voluntária, que compensa médios e grandes produtores por conservarem áreas de vegetação nativa dentro de sua propriedade que poderiam ser objeto de supressão, ou seja, a proposta é remunerar o produtor que tenha excedente de floresta, além da reserva legal mínima exigida por lei.

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A iniciativa de remuneração pela preservação do excedente florestal é de muita relevância, haja vista a possibilidade legal de corte da vegetação nativa para dar lugar a pasto ou plantios comerciais, reiterando que não se trata de remunerar os proprietários pela preservação das áreas de reserva legal e de preservação permanente, sendo tal preservação um ônus imposto a todos os proprietários e possuidores de terras rurais.

Esse tipo de projeto, em decorrência da Política Nacional de Pagamento por Serviços Ambientais, carrega consigo a importância da preservação do Meio Ambiente aliado à possibilidade de remuneração pela preservação do meio ambiente em linha com o preceito constitucional de que o meio ambiente é “bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações”.

Do que se tem notícia, o Conserv atingiu a marca de 8.410 hectares de vegetação nativa protegida, garantindo que os produtores mantenham intocados esses hectares em seus respectivos imóveis rurais, que hoje não têm sua proteção assegurada pela legislação ambiental.

Já há outros projetos que se assemelham ao Conserv, como por exemplo o Programa Reflorestar no Espirito Santo, uma parceria entre os programas de recuperação da Mata Atlântica, o Banco de Desenvolvimento do Espírito Santo (Bandes) e a Secretaria de Meio Ambiente e Recursos Hídricos (Seama), que visa pagar os produtores por serviços ambientais relacionados à preservação ambiental e à recuperação da Mata Atlântica em áreas estratégicas para o aumento da capacidade de infiltração da água no solo e ou na redução da geração de sedimentos.

Os números também se mostram relevantes para aquele estado. São quase 4 mil projetos aprovados no âmbito do Reflorestar, com a recuperação e preservação de cerca de 20 mil hectares de vegetação nativa.

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Seguindo a premissa da Política Nacional de Pagamento por Serviços Ambientais, para obter êxito na remuneração pela preservação florestal, os proprietários e possuidores têm a obrigação legal de ter e manter seus imóveis rurais regulares, o que implica em dizer que os imóveis devem estar inscritos no Cadastro Ambiental Rural (CAR), no Instituto de Colonização e Reforma Agrária (INCRA) e com seus limites definitos em título que demonstre a legítima posse ou a efetiva propriedade do pretendente à remuneração, funcionando como um fomento à regularização fundiária dos imóveis rurais no Brasil.

No tocante à regularização do imóvel, destaca-se ainda o incentivo à adesão e cumprimento de termos ou compromissos de ajustamento de conduta, a fim de possibilitar a participação em projetos dessa natureza, tendo em vista a vedação de aplicação de recursos públicos para pagamento de serviços ambientais prestados por pessoas físicas ou jurídicas inadimplentes em relação a tais compromissos.

Com a política de pagamento por serviços ambientais implementada e o surgimento de projetos de remuneração, os produtores rurais terão, de fato, oportunidade de gerar renda com a preservação florestal, especialmente, pela crescente comercialização de créditos de carbono gerados a partir de preservação e de restauração florestal. Ao mesmo tempo, haverá um efetivo benefício ao meio ambiente com a redução de cortes legais de florestas, restauração de áreas degradadas e incentivo à regularização fundiária dos imóveis rurais.

*Viviane Castilho, sócia responsável pela área de direito fundiário, com colaboração da advogada Ieda Januário Schlossarecke e da estudante de direito Emanuela Bombonato de Almeida, do escritório Oliveira e Roquim – Sociedade de Advogados

**as ideias e opiniões expressas neste artigo são de responsabilidade exclusiva de sua autora e não representam, necessariamente, o posicionamento editorial da revista Globo Rural
Source: Rural

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