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(Foto: Thinkstock)

 

 

*Publicada originalmente na edição 425 de Globo Rural (abril/2021)

Em 2020, o Brasil registrou o recorde de 493 defensivos agrícolas. A notícia, assim como em outros anos, gera debates acalorados sobre a aplicação cada vez maior de agrotóxicos.

Enquanto isso, no campo, muitos agricultores reclamam da falta de aprovação de produtos modernos para o controle de pragas e doenças já conhecidas que infestam hortas, pomares e pequenas lavouras. Em muitos casos, existem formulações disponíveis no mercado, porém, a autorização de uso é restrita a grandes cultivos, como os de soja e algodão.

“Às vezes, são produtos de alto valor, mas com pouco volume. E, como são muitas culturas, uma enormidade. Para as indústrias que produzem defensivos agrícolas, é praticamente inviável você cobrir toda essa gama”, explica Luis Rahmeier, diretor do Sindicato Nacional da Indústria de Produtos para Defesa Vegetal (Sindiveg).

Ele descreve o que mundialmente é conhecido como minor crops (culturas minoritárias, em tradução livre) e que, por isso, contam com suporte fitossanitário insuficiente para a produção em larga escala. Isso ocorre porque, ao fazer o pedido de registro de determinado produto, as empresas precisam especificar para quais culturas é indicado – restringindo muitas vezes o uso a mercados específicos.

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“A gente chama internacionalmente por esse nome porque são culturas que não têm atrativo para as empresas, seja financeiro, seja porque os estudos são caros. Então algumas companhias não têm interesse em fazer testes e estudos, considerando o que vão ganhar vendendo esse produto para essas culturas”, explica a chefe da divisão de registro de produtos formulados do Ministério da Agricultura, Tatiane Nascimento.

A falta de registro, contudo, não impede o uso irregular desses químicos, diz ela. “Se não tem o registro, o produtor às vezes acaba utilizando um determinado produto no campo sem ter nenhum dado de segurança alimentar ou respaldo técnico”, diz Tatiane.

De acordo com relatório divulgado em 2019 pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), 23% dos alimentos que foram analisados entre 2017 e 2018 apresentavam inconformidade em relação ao uso de agrotóxicos, sendo que 17,3% eram sobre o uso de produtos não autorizados para determinada cultura.

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“A contaminação que havia é porque o produto não era permitido para aquela cultura e agora a gente sabe a quantidade exata que pode se aplicada no campo”, diz a porta-voz do Ministério da Agricultura.

Desde 2018, uma Instrução Normativa (IN) conjunta do Ministério da Agricultura e da Anvisa estabelece normas sobre a rastreabilidade de frutas, verduras e legumes frescos destinados ao consumo humano – o que, na prática, permite identificar os produtores responsáveis pelos alimentos com irregularidades relacionadas ao uso de defensivos. “Isso também fez gerar uma demanda por registros por parte dos produtores, com medo de incorrer em infrações”, destaca a técnica.

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Ministério da Agricultura e Anvisa estabelecem normas sobre a rastreabilidade de frutas, verduras e legumes frescos destinados ao consumo humano (Foto: Getty Images)

 

 

Segundo números levantados pelo Sindiveg, cerca de um quarto dos defensivos registrados no ano passado (125, no total) incluía recomendações para essas culturas. São plantações que, em sua ampla maioria, chegam ao prato do consumidor: pimentão, mandioca, abobrinha, quiabo, entre outras.

“Quando a gente tem o registro para essas culturas, sabe exatamente qual a dose segura, se haverá ou não algum resíduo e qual o limite de dias até a data da colheita que o agricultor pode utilizar aquele produto”, explica Tatiane, ao lembrar que, até pouco tempo, era comum o uso de produtos sem registro para determinada cultura.

Com isso, quase que a totalidade dos defensivos com registro para algum tipo de minor crop no ano passado se deu com produtos à base de princípios ativos já presentes no país. “É como uma dipirona. Quando você vai à farmácia, existe mais de uma marca e cada uma delas precisou de um registro próprio na Anvisa. E não é porque tem muita opção de dipirona que as pessoas tomam mais dipirona”, observa Tatiane. São justamente empresas menores que têm puxado o crescimento da oferta de defensivos para essas culturas, diz.

O produtor às vezes utiliza determinado produto sem ter nenhum dado de segurança alimentar ou respaldo técnico"

Tatiane Nascimento, chefe da Divisão de Registro de Produtos Formulados do Ministério da Agricultura

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“As empresas estão fazendo essas solicitações de registro e estão, sim, um pouco mais focadas nesse mercado de minor crops. Algumas pequenas empresas estão solicitando registro e incluindo mais minor crops do que a gente tinha antes”, revela. De todos os registros de defensivos químicos concedidos no ano passado pela pelo Ministério da Agricultura, apenas nove envolviam a autorização de uso para novas moléculas – três delas com previsão de uso em minor crops.

Do lado dos produtores rurais, a organização e a articulação com empresas do setor de defensivos também têm permitido avanços na aprovação de novos registros. Eles apresentam as principais demandas de cada cultura e fornecem dados de mercado e cultivo para ajudar na elaboração dos pedidos de registro – que devem incluir estudos de toxicidade e risco ao meio ambiente a serem analisados também pelo Ibama e Anvisa antes do Ministério da Agricultura.

“Tem alguns produtos que estão registrando genéricos e incluindo esses minor crops que as outras empresas não estavam olhando para esse mercado”, explica.

(Foto: Divulgação)

 

Coordenadora técnica do Comitê Minor Crop Brasil, formado exclusivamente para debater o assunto e articular soluções junto com a indústria e o governo, a assessora técnica da Federação de Agriculturado Estado do Paraná (Faep),Elisangeles Sousa, tem estado à frente do tema.

“A gente faz um levantamento de demandas em que essas informações, após compiladas, são encaminhadas para a indústria fazer análise interna da possibilidade de extrapolação de uso e também para o governo entender qual é o cenário do setor produtivo”, explica a assessora técnica da Faep.

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Segundo Elisangeles, “o mercado de minor não é tão pequeno assim”. “As empresas que não trabalham com minor ou atuam só com algumas culturas de referência não têm toda a dimensão do que são as pequenas culturas. São várias safras ao ano. Só no caso das folhosas, é uma safra a cada 40 dias”, destaca a técnica.

Além dos químicos, Elisangeles conta que o setor também tem atuado para obter novos registros de defensivos biológicos – cujo uso é liberado para qualquer cultura, desde que atingida pela praga para a qual ele foi autorizado. “O setor está em busca de alternativas, e o produto biológico está sendo demandado. A própria indústria tem apontado para isso, e a busca do nosso trabalho é ter uma alternativa de suporte fitossanitário tanto químico quanto biológico. E fitoquímico também”, completa Elisangeles.

Dos 493 novos registros concedidos pelo Ministério da Agricultura no ano passado, 95 envolviam produtos biológicos contra pragas e doenças.
Source: Rural

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