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Mercado de defensivos agrícolas no Brasil deve registrar crescimento no uso de produtos biológicos (Ilustração/Thales Molina)

 

*Publicada originalmente na edição 425 de Globo Rural (abril/2021)

O mercado de defensivos agrícolas no Brasil, que movimentou US$ 12,13 bilhões no ano passado, deve registrar crescimento acelerado no uso de produtos biológicos nos próximos anos, sem que isso signifique uma substituição dos agroquímicos. Biológicos e químicos vão atuar em harmonia para garantir maior sustentabilidade, associados às tecnologias de melhoramento genético e às soluções digitais. Essa é a visão de futuro de oito grandes indústrias de defensivos agrícolas e de sementes que atuam no país.

“Acreditamos em uma abordagem equilibrada entre químicos e biológicos. O biodefensivo não tem eficácia para substituir as importantes características que os agroquímicos fornecem ao agricultor sem perda substancial da produtividade”, diz Robert Reiter, biólogo e líder global de pesquisa e desenvolvimento da divisão agrícola da alemã Bayer. Segundo ele, os biológicos vão ser cada vez mais usados para complementar – e até melhorar – a eficiência de um agroquímico para a proteção de cultivos.

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Reiter afirma que, na fase de tratamento de sementes de algumas culturas, já há mistura das duas tecnologias. Ele acredita que, no futuro, diferentes técnicas genéticas serão
usadas para melhorar as características e dar mais eficácia aos biológicos, sempre em equilíbrio com os químicos.

A Bayer perdeu parte dos produtos biológicos para a BASF quando adquiriu a Monsanto, para não infringir legislações antitruste; mantém hoje apenas um fungicida e bactericida biológico para soja e citros em seu portfólio, mas, segundo Geraldo Berger, diretor de assuntos regulatórios, está acelerando a pesquisa em sua unidade da Califórnia para entrar mais forte nesse mercado nos próximos anos. A multinacional alemã investe 2,3 bilhões de euros por ano em pesquisa e tem no Brasil seu segundo maior mercado, atrás dos EUA.

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Robert Reiter, líder global de pesquisa da Bayer (Foto: Divulgação)

 

 

 

André Savino, diretor de marketing da Syngenta Proteção de Cultivos, diz que o mercado de biológicos terá de duplicar em cinco anos para atender à demanda da sociedade por alimentos com menos resíduos, no entanto, ressalta que sustentabilidade não significa simplesmente substituir químicos por biológicos, especialmente no caso da agricultura tropical brasileira, em que não há inverno para controle natural de pragas e doenças
e cultivam-se várias safras por ano numa mesma área.

“É preciso oferecer alternativas para a harmonia de químicos e biológicos que visem à sustentabilidade ambiental, mas também à financeira. Além de investir mais nos biológicos, a indústria tem o desafio de trazer agroquímicos cada vez mais limpos e eficientes e que diminuam a quantidade de ingrediente ativo por hectare”, diz ele.

Savino pondera que o controle biológico não é necessariamente mais barato, mas é mais sustentável e demanda menos tempo para sair do laboratório e ir para o campo do que um agroquímico. “No caso dos agroquímicos, a multiplicação em escala é bem mais rápida. Já o processo de registro de um biológico junto aos órgãos reguladores brasileiros leva cerca de um ano, enquanto um químico pode ficar até 12 anos na fila.”

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Seguindo uma tendência entre as grandes companhias de parceria ou aquisição de empresas especializadas em produtos biológicos, a multinacional com sede na Suíça incorporou no ano passado a italiana Valagro, uma das pioneiras no mundo na pesquisa, produção e comercialização de bioestimulantes e nutrientes especiais para cultivos. “A ideia foi comprar know how de ponta reconhecido no exigente mercado europeu para trazer novos produtos ao nosso portfólio.” Os primeiros devem chegar ao mercado neste ano ou em 2022. A empresa investe globalmente US$ 1,3 bilhão em pesquisa e liderou o ranking mundial de vendas de defensivos em 2019.

André Savino, diretor de marketing da Syngenta (Foto: Divulgação)

 

Rodrigo Neves, líder de P&D da Corteva Agriscience para Brasil e Paraguai, afirma que as tecnologias para elevar a sustentabilidade no campo têm de ser necessariamente complementares. “Nada de canibalismo. É preciso haver integração de sementes, biológicos, proteção de culturas e soluções digitais. A sustentabilidade depende sempre do bom uso e da escolha correta dos produtos.”

Seu colega na Corteva, Ernesto Fukushima, líder de biológicos na América Latina, concorda. Segundo ele, o agricultor brasileiro não tem como abrir mão dos químicos, mas os produtos biológicos vão dar um salto muito rápido, repetindo a explosão que ocorreu com os químicos nos anos 1970. Esse salto, diz, deve incluir apenas biofungicidas e bioinseticidas.

Ele lembra que a Dow, uma das empresas que formaram a Corteva, tinha uma linha de bioherbicidas em desenvolvimento, mas o produto não evoluiu porque não tinha ação abrangente. “O fato é que o produtor não está pensando em substituir produtos, e sim em como produzir mais e com mais sustentabilidade.”

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Pensando em agregar faturamento com biológicos nos próximos anos, a Corteva também buscou uma parceria. Neste ano, ela se associou à Simbiose Agro, produtora de tecnologias microbiológicas no Brasil. O plano é desenvolver um pipeline de bioestimulantes e soluções de controle biológico para atuar no manejo integrado de pragas das culturas de cana-de-açúcar, soja e milho.

A multinacional, com sede nos EUA, investe US$ 1,2 bilhão por ano em pesquisa, sendo US$ 200 milhões no Brasil. Está desenvolvendo um produto biológico para uso associado a agroquímico na cultura da cana e, neste ano, lança nos EUA e na Europa seus primeiros biológicos, um bioinseticida e um biofungicida, que devem chegar aoBrasil em 2022.

(Gráfico: Danilo Bandeira)

 

Soluções de manejo integradas e complementares em defensivos químicos e biológicos para proporcionar um manejo mais eficiente também são a aposta de futuro da BASF, segundo Ademar De Geroni Júnior, vice-presidente de marketing regional da divisão de solução para agricultura na América Latina. Ele cita como uma dessas soluções um fungicida e bactericida biológico para manejo integrado de doenças em frutas e hortaliças que pode ser mantido por mais tempo na cultura sem risco de resistências e perda de produção. “Uma das vantagens do uso de biológicos é a maior liberdade na janela de aplicação até a colheita.”

Outra solução da companhia alemã é um defensivo desenvolvido junto com a Embrapa que une químico e biológico para a cana-de-açúcar. O produto tem ação fungicida, inseticida e inoculante para as raízes. Além disso, a empresa tem inoculantes biológicos para sementes. Geroni Júnior diz que as vendas globais da empresa com biológicos já superam 150 milhões de euros ao ano e que, para os próximos dez anos, a BASF pretende aumentar em até 7% ao ano a oferta de soluções ainda mais sustentáveis. A companhia investe 900 milhões de euros por ano em pesquisas. O Brasil, junto com América do Sul, África e Oriente Médio, responde por 23% do faturamento.

Nada de canibalismo. É preciso haver integração de sementes, biológicos, proteção de culturas e soluções digitais"

Rodrigo Neves, líder de P&D da Corteva Agriscience para Brasil e Paraguai

 

 

Rodrigo Neves, líder de P&D da Corteva (Foto: Divulgação)

 

 

Para a agrônoma, entomologista e diretora da área de registros de produto para a América Latina da FMC, Maria de Lourdes Setten Fustaino, biológicos e químicos são tecnologias sinérgicas. “Nos últimos dez anos, o crescimento dos biológicos foi acelerado graças às novas tecnologias, mas nem para tudo há solução com biológicos ou só com químicos e não dá para saber se algum vai predominar ou se isso vai ocorrer em alguma cultura específica.” Ela diz que a FMC investe em biológicos para controle de pragas e insetos há 20 anos, mas, nos últimos oito anos, o investimento aumentou, devido a parcerias com empresas de ponta na área de microrganismos que não tinham experiência em agricultura.

“O biológico faz parte do nosso pilar de sustentabilidade. Temos três produtos no mercado brasileiro e, nos próximos cinco anos, vamos lançar um bioinseticida ou biofungicida inovador por ano. A partir daí, isso deve acelerar, porque temos um centro de pesquisa focado nesses produtos na Dinamarca”, diz Fustaino, referindo-se à parceria fechada este ano com a Novozymes, líder mundial em soluções biológicas com sede na Dinamarca.

Com sede na Filadélfia (EUA), a FMC tem mais de 30 produtos biológicos à venda em mais de 45 países e 12 biofungicidas, bioinseticidas e bionematicidas no seu pipeline de P&D. A empresa investe 7% do seu faturamento em pesquisa, com 20 centros de P&D espalhados pelo mundo. Em 2020, as vendas somaram US$ 4,64 bilhões e a expectativa para este ano é chegar a US$ 5,1 bilhões. O faturamento no Brasil equivale ao dos mercados americano e europeu.

Maria de Lourdes Setten Fustaino, diretora da FMC (Foto: Divulgação)

 

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Marcelo Zanchi, diretor de marketing da indiana United Phosphorus Limited (UPL), aposta em um crescimento exponencial dos biodefensivos nos próximos anos – até porque a base é pequena –, mas sem superar os químicos. Ele ressalta que os biológicos têm mostrado cada vez mais eficiência e fatores que dificultavam seu uso massivo, como estabilidade de formulação e shelf life (tempo de prateleira), estão sendo superados. “Tanto que as grandes indústrias estão entrando com força nesse mercado.”

A UPL tem quatro biológicos em seu portfólio e deve lançar, em 2022, um biofungicida já usado na Europa, que funciona como uma vacina na planta. Segundo Zanchi, 6% do faturamento já vem dessa linha de produtos, que inclui fisioativadores, compostos produzidos com algas ou outros extratos vegetais que são aplicados nas plantas para que elas expressem maior potencial genético. A tendência, diz Zanchi, é quintuplicar nos próximos cinco anos o faturamento com biossoluções, de forma a impactar de 12% a 15% no faturamento geral da empresa, que foi de US$ 5 bilhões no ciclo 2019/2020. O Brasil é o maior mercado da UPL.

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Para a israelense Adama, o avanço dos biológicos não representa uma concorrência com os químicos. “É mais uma ferramenta para atuar no combate a pragas e doenças e aumentar a produtividade, como ocorreu com o melhoramento genético e as soluções digitais”, diz Alexandre Pires, diretor de marketing. Ele conta que a empresa trouxe os biológicos para o portfólio há dois anos e pretende lançar seu primeiro produto em 2022, para a cultura da cana. “Inicialmente, vamos investir em parcerias para desenvolver esses produtos e, no médio prazo, ter produtos próprios.” Os biológicos integram a estratégia da Adama de aumentar o faturamento de US$ 700 milhões para US$ 1,4 bilhão em 2025. O Brasil é seu
maior mercado, com 20% das vendas globais.

Clayton Veiga, diretor de P&D da Ihara, diz que o lançamento de mais biodefensivos nos próximos anos vai atender a uma demanda por maior eficácia no combate às pragas, desde que conjugados com os químicos. “Os biológicos ainda têm um caminho longo a percorrer antes de entregar a eficiência que o produtor precisa.” Esses produtos representam hoje 3% do faturamento de R$ 3 bilhões da companhia e demandam 15% dos investimentos em pesquisa – que somaram R$ 76 milhões em 2020. Neste ano, a Ihara, empresa brasileira de capital japonês, lançou mais um biológico, chamado Romeu, para ajudar no manejo da ferrugem da soja. Nos próximos dois anos, chegam mais três biodefensivos, entre eles Julieta, um biofungicida para o segmento de hortifrúti.
Source: Rural

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