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Celso Moretti, presidente da Embrapa (Foto: Divulgação)

*Publicado originalmente na edição 422 da Revista Globo Rural (Dezembro/20 e Janeiro/21)

Pesquisadores da Embrapa foram surpreendidos no começo de setembro com a informação de um bloqueio de proporções inéditas no orçamento da instituição, principal fomentadora da pesquisa no agronegócio brasileiro. No total, R$ 118,5 milhões previstos foram represados.

A situação, decidida no contexto do ajuste fiscal e justificada em parte pelos efeitos da pandemia no orçamento público, obrigou a instituição a rever contratos de serviços, além de causar preocupação com a possibilidade de interrupção de pesquisas e manutenção de rebanhos.

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De acordo com o presidente da Embrapa, Celso Moretti, a aprovação, em novembro, do Projeto de Lei (PLN) 40 pelo Congresso deve recompor integralmente o valor bloqueado. Em entrevista por e-mail, Moretti reconhece a atipicidade de um ano cheio de intempéries, mas observa que instituições de pesquisa devem trabalhar com planejamento e previsibilidade. 

Em novembro, a Embrapa lançou um plano diretor que estabelece metas para a entidade até 2030. Há anos, a empresa trabalha com parcerias que podem reduzir a dependência da instituição do orçamento público. Moretti alerta que "bloqueios orçamentários podem causar sérios prejuízos ao processo de geração de tecnologias” para o campo.

 

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Globo Rural: Como o senhor avalia o bloqueio imposto à Embrapa?

Celso Moretti: O cenário fiscal é complexo e foi afetado pela pandemia, que reduziu a arrecadação e demandou gastos para a mitigação de seus efeitos. Entendemos o bloqueio no contexto da gestão orçamentária. Por sua vez, a recomposição reflete o reconhecimento do papel e da importância da Embrapa pelo governo e pela sociedade.

GR: Quanto do bloqueio anunciado em setembro foi liberado até aqui (novembro)?

Moretti: Após a aprovação do Projeto de Lei (PLN) 40 pelo Congresso Nacional, tivemos a recomposição quase que completa do nosso orçamento.

GR: A expectativa é de liberação total até o final do ano?

Moretti: Nossas equipes estão se preparando para a recepção dos recursos. Esperamos recuperar grande parte do planejado. Algumas atividades têm componente sazonal ou demandam longo prazo para estruturação e devem ser postergadas para 2021.

GR: Há risco de as verbas não serem liberadas até o fim do ano?

Moretti: Não temos elementos para avaliar esse ponto.

GR: O que significaria a não recomposição?

Moretti: A não recomposição significa manter os recursos disponíveis atualmente. A proposta de orçamento de 2021 é independente do orçamento de 2020.

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GR: Já há um balanço sobre os impactos do bloqueio?

Moretti: A Embrapa monitora permanentemente suas atividades. Acompanhamos em tempo real nossa programação de pesquisa e detectamos atrasos no cronograma de execução de atividades de alguns projetos. Entretanto, estamos em um ano atípico e é difícil isolar os efeitos da pandemia de atrasos na liberação orçamentária. Estamos nos reprogramando, com foco na manutenção dos compromissos assumidos e na realização de entregas à sociedade, a exemplo dos recentes resultados do trigo em áreas tropicais.

GR: Quais são as principais áreas atingidas?

Moretti: O atraso decorrente dos bloqueios atingiu as atividades da empresa em praticamente todas as áreas, sem distinção.

GR: O que mudou na rotina da instituição?

Moretti: A Embrapa está monitorando seus centros de pesquisas para identificar os gastos críticos e estabelecendo critérios para a priorização da alocação de recursos com foco na minimização dos impactos nas atividades. É difícil distinguir os impactos dos bloqueios com os da pandemia.

GR: De que modo o bloqueio pode comprometer o funcionamento da Embrapa?

Moretti: A Embrapa tem mais de 900 projetos em execução. Destes, quase 600 são exclusivamente financiados com recursos da instituição. A aprovação do PLN 40 e a liberação dos recursos bloqueados até o final do ano minimizarão eventuais prejuízos à agenda de pesquisa.

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GR: Como o incentivo a parcerias pode compensar situações de bloqueio orçamentário sem comprometer a pesquisa?

Moretti: As parcerias diversificam as fontes de recursos financeiros e reduzem a dependência do orçamento público. Além da maior alavancagem, as parcerias alimentam a programação de pesquisa comos desafios concretos enfrentados pelo setor e facilitam a chegada das soluções aos produtores. Está previsto no VII Plano Diretor da Embrapa, recém-lançado, um incremento substantivo no volume de parcerias como setor privado.

GR: A previsibilidade e o planejamento não são fundamentais?

Moretti: Previsibilidade e planejamento são fundamentais para a gestão de todo tipo de organização. As instituições de pesquisa, em especial, desenvolvem atividades que podem levar décadas para terem resultado. Nosso desafio é superar as questões conjunturais para realizarmos entregas estruturais de relevância. Temos visão de futuro e planejamento estratégico, o que nos permite trabalhar durante anos para entregas como a adaptação da soja e do trigo ao clima tropical, por exemplo.

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GR: Como manter o protagonismo em meio a tantas mudanças políticas, tecnológicas, empresariais e climáticas?

Moretti: A Embrapa tem investido de forma consistente, ao longo dos anos, em planejamento estratégico e capacidade de antevisão de cenários futuros. Procuramos antecipar cenários ao invés de reagir às mudanças. Nosso foco é no desenvolvimento de soluções para os problemas da agropecuária brasileira. Aumentamos nossa efetividade ao promover uma maior aproximação com o setor produtivo, uma das frentes na nossa gestão. Em18 meses, triplicamos o número de projetos com o setor produtivo. Nossa meta, prevista no VII Plano Diretor da Embrapa, é chegar a 40% da programação de pesquisa em parceria com o setor produtivo até 2023.

GR: Como foi feito o plano diretor?

Moretti: A Embrapa realiza planejamento estratégico desde o final da década de 1980. Nesta sétima edição, analisamos documentos estratégicos de instituições públicas e privadas e realizamos uma ampla consulta externa, com lideranças do agro brasileiro, da academia, do governo e do setor produtivo. A construção contou com2.358 contribuições pela internet, 36 entrevistas de consulta e 101 participantes em workshops presenciais. O novo PDE é um espelho da mudança da gestão da estratégia da empresa, indo na direção da modernização da operação, na maior capacidade de responder às demandas da sociedade, agilidade, racionalização de custos e busca por excelência.

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GR: Qual é o diferencial da proposta?

Moretti: O grande diferencial são as metas quantificáveis associadas aos objetivos estratégicos. Poucas instituições públicas e, às vezes, até mesmo privadas tiveram a ousadia de estabelecer objetivos e metas tangíveis no tempo, públicas e claras, o que nos permitirá medir o seu alcance. Ao estabelecer metas tangíveis e quantificáveis, a Embrapa sinaliza, de forma clara e inequívoca, os caminhos que percorrerá na próxima década nos diferentes temas em que atuará.

GR: Bloqueios orçamentários como o deste ano podem afetar o plano?

Moretti: Sim, podem afetar. O planejamento estratégico prevê um fluxo contínuo de recursos financeiros para irrigar os trabalhos necessários ao atingimento das metas com as quais a pesquisa está comprometida. Bloqueios orçamentários podem interromper esse fluxo de recursos, interrompendo ações de pesquisa e desenvolvimento. É importante frisar que tal interrupção pode, em muitos casos, causar sérios prejuízos ao processo de geração de tecnologias. Muitas vezes, não é possível retomar uma pesquisa após sua interrupção, pois estamos falando de processos biológicos, que têm tempo determinado para ocorrer.
Source: Rural

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