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(Foto: Acrimat/Divulgação)

 

Os anos de 2019 e 2020 tem apresentado chuvas abaixo da média climatológica da região do Pantanal, o que proporcionou condições climáticas ideais para a propagação de grandes incêndios. Incêndio é o fogo que se propaga sem controle e pode causar grandes impactos ambientais e socioeconômicos. 

A queimada prescrita (controlada), por sua vez, consiste no uso do fogo controlado de acordo com critérios técnicos e condições ambientais adequadas mediante autorização do órgão ambiental competente (legislação vigente). Esta prática é muito usada como ferramenta de manejo das pastagens nativas no Pantanal, mas também pode ser usada para reduzir o impacto de grandes incêndios.

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O ano de 2020 tem sido considerado um dos mais secos nas últimas cinco décadas na região do Pantanal. A propagação de incêndios depende da existência de calor, oxigênio, combustível e a reação em cadeia, no qual a eliminação de um desses componentes pode extinguir o fogo. No caso, o principal componente para manejo é o combustível e no Pantanal, o principal combustível são as formações vegetais constituídas de florestas, cerrado e campos (=savanas) que formam uma riqueza de fitofisionomias que variam no espaço e no tempo.

Esta riqueza de campos com gramíneas nativas tornou a região apropriada para a criação extensiva de gado de corte nos últimos três séculos, cuja atividade tradicional tem moldado as paisagens com pouco impacto ambiental, embora na última década a intensificação do sistema tenha aumentado.

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O fogo tem sido usado como estratégia de manejo nas propriedades do Pantanal para redução da dominância de gramíneas nativas grosseiras (“macegas”) e aumento do valor nutricional, por meio da rebrota, dessas pastagens de baixa aceitabilidade pelos bovinos.

O fogo também serve para eliminar ou conter a disseminação de espécies indesejáveis, geralmente invasoras de campo limpo com dominância de gramíneas; bem como para o aumento da heterogeneidade de ambientes e espécies desejadas. Esse manejo promove ainda a distribuição mais homogênea de pastejo dos herbívoros domésticos e silvestres e a redução da quantidade de vegetação seca (“macega”) para diminuir o risco de incêndio em áreas florestais.

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As fitofisionomias de savanas (cerrado, campo cerrado, campo sujo e campo limpo) no Pantanal são adaptadas ao distúrbio natural do fogo, cujo efeito depende da intensidade, frequência, tempo de ocorrência, características estruturais da vegetação e condições climáticas. Porém deve ser salientado que a biodiversidade existente na região é regida pelo ciclo de inundação de seca e cheia, que depende das variações anuais e plurianuais da precipitação. Portanto há uma interação entre fogo e inundação que pode ter efeitos sinérgicos, antagônicos e/ou neutros sobre a biodiversidade, processos e funções dos ecossistemas, mas ainda há poucos estudos na região, especialmente a longo prazo.

Pelo fato de o Pantanal possuir uma riqueza de fitofisionomias em diferentes gradientes de inundação, cujo impacto do uso do fogo ainda é pouco conhecido, e tendo conhecimento que o fogo pode causar uma série de alterações nas propriedades físicas, químicas e biológicas do solo, que é a base da sustentabilidade dos ecossistemas, recomenda-se o uso do fogo somente quando outra prática de manejo da vegetação não seja sustentável.

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Este é o caso de algumas áreas de campos totalmente invadidas por espécies arbustivas, impenetráveis, com perda de diversidade e de difícil acesso de maquinário. Essas áreas de campo limpo, antes dominadas por gramíneas nativas, estão sendo invadidas por espécies lenhosas, diminuindo a capacidade de suporte das pastagens, com consequente perda de sustentabilidade econômica. Este cenário é decorrente de diversos fatores, entre os quais a supressão de fogo e pastejo associadas com as condições climáticas (anos plurianuais mais secos ou mais chuvosos) e suas interações.

A Embrapa Pantanal em parceria com a Embrapa Informática desenvolveu um sistema que faz a avaliação holística de uma fazenda pantaneira a partir do uso de indicadores/índices de sustentabilidade para os diferentes atributos, entre os quais o estado de conservação das pastagens e das paisagens. A partir do diagnóstico são definidas boas práticas de manejo e no planejamento das pastagens, busca-se dar prioridade ao manejo sustentável e adaptativo das pastagens nativas e paisagens.

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Em algumas situações, o uso da queima prescrita pode ser utilizado desde que seja dentro de critérios técnicos e de acordo com a legislação vigente (autorização de órgão competente). Dentre as boas práticas de manejo para atingir o objetivo do uso do fogo, recomenda-se o desenvolvimento de um plano de manejo em função da distribuição das formações vegetais (estrutura e conectividade) e das características dos combustíveis no espaço (mapa de distribuição dos tipos de combustíveis e os locais de risco) e um plano de operações e monitoramento (guia para queima prescrita).

No manejo holístico das pastagens procura-se otimizar o uso das pastagens nativas, com atenção regular do produtor ao campo e aos animais para o estabelecimento de um manejo adaptativo, especialmente nas épocas extremas de secas e cheias. Considerando que as fazendas pantaneiras apresentam grandes extensões e paisagens complexas e diversas com diferentes tipos de pastagens, o sistema de pastejo predominante é contínuo, em grandes invernadas, o que permite a seletividade animal nas pastagens, acarretando super pastejo e sub pastejo nas unidades de manejo.

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Neste sistema, o gado prefere pastar nas pastagens nativas das áreas úmidas e estas funcionam como barreiras naturais para a propagação do fogo em anos não muito secos, o que torna o gado conhecido como “bombeiro do Pantanal”, o que podemos usar este serviço como auxílio no manejo holístico das pastagens e paisagens.

Porém, é importante entender a relação entre animais-plantas-solos-clima e suas interações em cada unidade de manejo pois no Pantanal não há regras únicas e cada fazenda necessita de manejo específico e adaptativo para que se torne sustentável. As estratégias de manejo devem ser adotadas para evitar degradação e melhorar a distribuição de pastejo por meio da melhor distribuição de aguadas e cochos, uso integrado de diversas espécies de animais, vedação em épocas estratégicas, taxa de lotação compatível com a capacidade de suporte, suplementação estratégica, introdução de espécies forrageiras exóticas adaptadas e de baixo risco de invasão respeitando a heterogeneidade ambiental, entre outras.

*Sandra Aparecida Santos, pesquisadora da Embrapa Pantanal, Ph.D. em Nutrição e Produção Animal

As ideias e opiniões expressas neste artigo são de responsabilidade do seu autor e não representam necessariamente o posicionamento editorial da revista Globo Rural
Source: Rural

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