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 (Foto: Divulgação/MPT/SC)

Dentre os inúmeros desafios impostos ao setor frigorífico brasileiro após o avanço da Covid-19 entre trabalhadores do setor, a situação específicas dos indígenas tem despertado atenção especial do poder público. “Estamos verificando que a prevalência de Covid-19 é muito alta em frigoríficos e que há um elevado risco em que os povos indígenas que trabalham em frigoríficos se tornem vetor de transmissão para suas comunidades”, aponta o procurador do trabalho em Santa Catarina e gerente do projeto nacional de frigoríficos, Sandro Sarda.

Junto com procuradores federais do Ministério Público Federal, Sarda contribuiu para a elaboração de uma recomendação conjunta das duas instituições para o afastamento remunerado de indígenas em cinco frigoríficos do oeste de Santa Catarina. As orientações foram acompanhadas pela Secretaria Estadual da Saúde, que incluiu a população indígena no grupo de risco da doença, garantindo o isolamento de aldeias da etnia Guarani e Kaingang dentro e fora do Estado.

“Os povos indígenas no Brasil apresentam, talvez, os piores indicadores sociais de saúde, renda e educação. Então, há também uma vulnerabilidade biológica no sentido de que historicamente eles sempre foram sofreram com uma elevada mortalidade em razão de doenças respiratórias”, explica Sarda. Segundo dados do Ministério da Saúde, o Brasil possui 1.737 casos confirmados de Covid-19 entre indígenas, dos quais 934 encontravam-se na fase ativa da doença até o último dia 04/06.

Dourados

Em Mato Grosso do Sul, que abriga a maior população indígena do país fora do bioma amazônico, o Ministério da Saúde contabiliza 76 casos confirmados da doença entre indígenas, sendo 62 deles no distrito de Dourados, segundo dados da Secretaria Estadual de Saúde. O município abriga dois frigoríficos de grande porte, um da BRF e um da JBS, onde a contaminação de 33 indígenas levou ao afastamento imediato dos trabalhadores residentes em aldeias e fez do município o epicentro da pandemia no Estado.

“A vulnerabilidade da comunidade indígena é latente, independentemente de perderem o vínculo com os frigoríficos”, observa o procurador do trabalho no MS, Jeferson Pereira. Atualmente, o MPT acompanha a situação de quase 40 frigoríficos no Estado e tem orientado as empresas sobre as medidas de prevenção da doença. “A indústria frigorífica aqui no Estado tem se demonstrado colaborativa na implementação de tais medidas”, avalia Pereira.

Além do setor frigorífico, Mato Grosso do Sul também registrou casos da doença entre indígenas empregados no setor sucroenergético. Em maio, dois trabalhadores da aldeia Tey Kuêda que atuavam no plantio manual da cana-de-açúcar em uma usina da Raízen foram confirmados com a doença durante a testagem preventiva realizada pela empresa, que afastou todos seus colaboradores indígenas e manteve a remuneração.

“Em Dourados foi proibido [o uso de força de trabalho indígena durante a pandemia], mas nas cidades adjacentes eles ainda estão indo trabalhar, o que é preocupante”, explica José Carlos Pacheco, presidente do Coletivo dos Trabalhadores Indígenas do MS, ao revelar preocupação com o acompanhamento desses indígenas dentro das aldeias. “A minha preocupação é que eles estão em quarentena dentro das aldeias e as empresas deveriam estar acompanhando esses trabalhadores”, observa Pacheco.

Mal necessário

 

Embora seja um importante fonte de renda para as comunidades indígenas, o trabalho na indústria agropecuária, sobretudo frigoríficos, é visto por lideranças e pesquisadores como um mal necessário para a subsistência dessas famílias. “Por que essa pessoas se dispõem a viajar por até seis horas todos os dia para trabalhar se possuem 11 mil hectares de terras? Essas áreas deveriam estar divididas de forma equitativa para que cada um tivesse condições de obter sua própria subsistência”, defende a advogada indígena Fernanda Kaingang, que atua na defesa dos trabalhadores da JBS em Seara, Santa Catarina.

Após a demissão em massa de 40 indígenas da aldeia Serrinha pela empresa, a Justiça determinou a readmissão dos trabalhadores de forma liminar, mantendo o afastamento remunerado enquanto durar a pandemia. A advogada, contudo, relata que os trabalhadores dispensados não querem retornar ao trabalho no frigorífico. “É preciso pensar nos modelos de desenvolvimento sustentável dentro das terras indígenas. Isso precisa ser corrigido porque não sabemos quanto tempo vai durar a crise pós-pandemia e isso só vai agravar a miserabilidade de pessoas que não têm emprego formal”, destaca Fernanda.
Source: Rural

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