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Para Bortoli, produtor precisa buscar o caminho certo e não o mais fácil (Foto: Jeferson Próvideo/Basf/Divulgação)

 

 

 

Quais os segredos para produzir mais e melhor lavouras de soja? Dos vários fatores envolvidos, muitos dependem do produtor. Que tal, então, conhecer as dicas de quem registrou produtividade média de 123,9 sacas por hectare na safra 2018/19?

A Globo Rural conversou durante a Expodireto Cotrijal, em Não-Me-Toque (RS), com o engenheiro agrônomo Mauricio De Bortoli, produtor rural em Cruz Alta (RS) e bicampeão nacional do Desafio CESB de Máxima Produtividade de Soja.

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Ele contou como obteve bons resultados nas lavouras em Cruz Alta (RS) e comentou, também, sobre os desafios para repetir o desempenho no ciclo 2019/2020 diante da combinação, no Rio Grande do Sul, de atraso no plantio, estresse hídrico e elevadas temperaturas.

Confira, a seguir, a entrevista completa:

Globo Rural – Hoje, sabemos que o principal objetivo de qualquer produtor é conseguir maior produtividade por área. Como você conseguiu essa produtividade em 2018/19?

Maurício de Bortoli – Na verdade, a busca pela alta produtividade vai ao encontro da alta rentabilidade, ou seja, aumentar a receita da propriedade e também ter sustentabilidade nos processos produtivos para manter a atividade da propriedade rentável. Qual o desafio nesse ambiente de produção, que é o Rio Grande do Sul? Cada Estado do Brasil tem suas limitações e desafios, mas, para nós, o maior desafio é reter água. A gente dispõe de irrigação em parte da propriedade, usa bastante tecnologia de fertilização, usa agricultura de precisão, tem equipamentos modernos, mas acabou percebendo que, para conseguir aumentar a produtividade, teria que resgatar algo muito antigo – o que talvez muito produtor não percebeu -, que são as boas práticas agrícolas e o plantio direto. Para nós, isso tem sido de suma importância porque, para conseguir construir um sistema de produção campeão ou construir uma área que dê alto potencial produtivo, a gente tem que desenvolver um trabalho de longo prazo. Não tem como transformar um talhão de um ano pro outro em um talhão campeão ou escolher apenas uma cultivar e transformá-la em uma cultivar campeã. São vários processos. E é isso que a gente tem tentado fazer na propriedade há diversos anos com as boas práticas agrícolas: construir um ambiente de produção e um perfil de solo para que essas raízes consigam explorar um maior ambiente de solo e guardar água. Acho que guardar água hoje é o principal fator.

Tem muito produtor que busca respostas fáceis para soluções que estão, talvez, muito próximas dele ao invés de procurar as soluções certas

GR – E o plantio direto é fundamental nisso…

Bortoli – Exatamente. Com a manutenção da palhada, eu melhoro as condições físicas, químicas e biológicas desse solo, além de, com o passar dos anos, aumentar a matéria orgânica, que é fonte essencial para a estruturação do solo e para transformar esse ambiente num ambiente sustentável. Então, como produzir mais sem expansão de área? É investindo no próprio ambiente e esse ambiente é, fundamentalmente, o solo.

GR – Você também é consultor. Nas suas visitas em outras propriedades e falando com outros produtores, quais são os principais equívocos que você encontra?

Bortoli – Acho que o equívoco mais comum do produtor hoje é buscar soluções de curto prazo. Tem muito produtor que busca respostas fáceis para soluções que estão, talvez, muito próximas dele ao invés de procurar as soluções certas. Acho que tem uma grande diferença entre o fácil e o certo. O fácil é, talvez, aquilo que seja menos oneroso, mais cômodo e tenha menos despesa energética para o produtor. Mas o certo tira um pouco da zona de conforto. Leva ele a tentar buscar algo mais e talvez mudar algum processo, quebrar algum paradigma, buscar fazer algo novo na propriedade. E eu acho que é isso que move, hoje, os produtores que atingem altas produtividades. Porque eles buscam usar a tecnologia do capricho, fazer mais o certo ao invés de fazer o fácil na propriedade.

Temos diversas tecnologias disponíveis no mercado. O grande diferencial é deter o profissional que a domina, que sabe utilizar essa tecnologia e que vai extrair dela o seu melhor

GR – Nesse processo, qual o peso das marcas na decisão e no planejamento do produtor?

Bortoli – Acho que a marca deixa de ser importante quando você tem pessoas na condução dos processos. Mais importante do que uma máquina agrícola de marca ou pensar em marcas de máquinas agrícolas, é você pensar em pessoas. Temos diversas tecnologias disponíveis no mercado. O grande diferencial é deter o profissional que a domina, que sabe utilizar essa tecnologia e que vai extrair dela o seu melhor. Acho que o grande desafio hoje para nós crescermos em produtividade é material humano. Tecnologias há inúmeras disponíveis no mercado. O que temos que saber é como utilizá-las da melhor forma.

GR – Você comentou de manter a umidade no solo e as dificuldades para isso. Este ano foi uma safra particularmente mais difícil no quesito climático. Como está sendo para você, na sua propriedade, e o que você tem feito para contornar esses problemas?

Bortoli – No período de verão aqui no Rio Grande do Sul, normalmente chove algo em torno de 800 milímetros durante 120 a 130 dias de ciclo. O que não ocorreu este ano. Temos algumas propriedades nossas com 120 dias de ciclo da soja e menos de 240 milímetros de chuva, ou seja, com menos de um terço do volume que normalmente ocorre. O que a gente tem feito para conseguir mitigar o estresse ocasionado pela falta de chuvas e por esses veranicos muito recorrentes é distribuir a janela de plantio com cultivares adequados, pensar numa proposta de não aplicar toda a tecnologia ou todos os cultivares numa mesma época, usar práticas de cultivo com plantas de cobertura que visam conservar a umidade de solo e promover um sistema radicular mais profundo e, também, usar a tecnologia de irrigação. Acho que a irrigação é uma ferramenta para você conseguir manter ou até elevar a produtividade. Claro que ela é apenas um componente do clima, mas ela é essencial quando se busca alta produtividade num ambiente onde a chuva passa a ser um fator limitante.

(Foto: Jeferson Próvideo/Basf/Divulgação)

 

GR – E é viável economicamente você irrigar uma cultura que ocupa áreas tão extensas, como a soja?

Bortoli – Na verdade, a cultura da soja é uma cultura que demanda muito menos água do que culturas gramíneas, como o milho e o arroz. Porém, ela responde, sim, à irrigação – mas desde que o profissional que esteja usando essa tecnologia para aumentar sua produtividade saiba quais os momentos ideais para aplicá-la na lavoura. Então, eu acho que ela é viável, sim. Ela pode ser um fator determinante e decisivo para quem busca alta produtividade, porém não é um fator isolado. A irrigação é um dos componentes do processo. Dentro do fator clima, ela passa a ser muito importante, desde que bem utilizada. A gente tem um trabalho de vários anos utilizando a irrigação como ferramenta de auxílio à produtividade e com bons resultados. Mas isso não foi fácil, não foi da noite para o dia e isso talvez não esteja muito disponível na literatura para estudo. É muito uma questão de conhecimento prático e de utilização de ferramentas tecnológicas para conseguir medir essas respostas a nível de campo.

É, verdadeiramente, a cultura do capricho que tem feito a diferença entre a alta produtividade e a produtividade média convencional

GR – Você aponta a alta produtividade como um trabalho de longo prazo. Mas o que ocorre muitas vezes é o abuso do uso da tecnologia na busca de respostas rápidas. Esse uso excessivo da tecnologia pode ser um problema nesse processo?

Bortoli – Creio que sim. Quando os produtores apostam simplesmente numa tecnologia isolada como se fosse a solução para a produtividade eles acabam incorrendo, talvez, num erro. O uso de vários fatores e tecnologias somadas é que compõem a alta produtividade. Ou seja, não é um fator por si só, mas o somatório de estratégias de manejo, de uso de tecnologias de solo, de ferramentas de proteção de cultivos, de boas práticas agrícolas. É, verdadeiramente, a cultura do capricho que tem feito a diferença entre a alta produtividade e a produtividade média convencional.

GR – A sua última produtividade foi de quase 124 sacas por hectare. Neste ciclo atual, mesmo com essas adversidades, você espera um resultado semelhante?

Bortoli – Por mais que eu tenha conseguido repetir boas partes das minhas premissas básicas para a alta produtividade, eu creio que acabei sofrendo com três fatores limitantes para a alta produtividade. O primeiro deles é que eu perdi a janela ideal de semeadura, que aqui para nossa região ocorre entre 20 de outubro e 10 de novembro. Seria o melhor momento para semear a soja buscando alta produtividade. Nesse período, choveu muito na região e acabou atrasando a semeadura, o que nos jogou numa janela de plantio após 15 de novembro. Então, a primeira perda de potencial produtivo minha foi época de plantio. A segunda perda produtiva foi pela temperatura muito elevada nos meses de floração. A gente teve temperaturas na faixa 39ºC a 40ºC em dezembro, que é um mês decisivo para a floração da soja. E o terceiro ponto que eu acho que foi muito determinante foi esse período de estiagem. Essa falta de chuva recorrente que vem impactando a região vai acabar reduzindo, sim, nosso potencial produtivo este ano, tanto em lavoura irrigada quanto em lavoura de sequeiro. O Rio Grande do Sul este ano vai sofrer com uma quebra muito significativa na cultura da soja porque o mês de março, que é um mês determinante para esses plantios de novembro, não tem nenhuma previsão de chuva considerável.

A água é um dos principais fatores e vai ser a que vai nos roubar, talvez, o nosso maior potencial produtivo aqui no RS neste ano

 

GR – A irrigação, por si só, não faz milagre…

Bortoli – Não. A irrigação é apenas um fator componente do clima. Outros fatores componentes são a luminosidade, a temperatura, a nebulosidade, concentração de gases. E esses a gente não tem poder de controlar, embora eles interfiram muito na produtividade. Mas a água é um dos principais fatores e vai ser a que vai nos roubar, talvez, o nosso maior potencial produtivo aqui no Estado este ano.

GR – Você consegue estimar sua produtividade este ano?

Bortoli – É difícil eu te falar isso porque a gente ainda tem um ciclo bastante longo de desenvolvimento das culturas. Eu tenho cultivares em que eu tive quebra de 30%, de 40%. Em materiais mais tardios, talvez tenha um potencial de quebra de 20%, mas isso é muito relativo. Ainda falta bastante tempo para conseguir definir todo o potencial da cultura, e março vai ser o mês que vai definir o quanto de quebra nós vamos ter. Nos materiais de outubro, a quebra já está bem desenhada e ela é bem expressiva. Os materiais de novembro, que finalizam o ciclo agora em março e são colhidos em abril, esses, sim, ainda são uma incógnita. É a pergunta que não quer calar: quanto vai ser a quebra e quando vai voltar a chover de forma normal no Estado.

*O jornalista viajou à convite da BASF
Source: Rural

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