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Um dos autores da carta, André Baniwa (Foto: Divulgação/IEA-USP)

 

Em carta aberta a Jair Bolsonaro divulgada ontem (2/1), lideranças indígenas da Amazônia reagiram à reforma administrativa na gestão da política indigenista do novo goveno e ao que chamam de “declarações preconceituosas” do presidente sobre o modo de vida das populações tradicionais. "Vimos em público afirmar que não aceitamos mais política de integração, política de tutela e não queremos ser dizimados por meios de novas ações de governo e do Estado Nacional Brasileiro", diz um dos trechos.

O documento, assinado por Marcos Apurinã e André Baniwa, lideranças dos povos Apurinã e Aruak Baniwa, da Amazônia, reafirma as garantias constitucionais aos modos de vida dos povos tradicionais, a importância da conservação ambiental das aldeias e critica declarações recentes de Jair Messias Bolsonaro sobre o "vazio demográfico" e o percentual do território brasileiro ocupado por reservas.

“Não é verdade que os povos indígenas possuem 15% de terras do território nacional. Na verdade são 13%, sendo que a maior parte (90%) fica na Amazônia Legal. Esse percentual é o que restou como direito sobre a terra que era 100% indígena antes do ano de 1500 e que nos foi retirado. Não somos nós que temos grande parte do território Brasileiro, mas os grandes latifundiários, ruralistas, agronegócios, etc que possuem mais de 60% do território nacional Brasileiro.”

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Segundo o texto, o argumento do “vazio demográfico” nas terras indígenas é “velho e falso”, servindo apenas para “justificar medidas administrativas e legislativas que são prejudiciais aos povos indígenas”.

“As nossas terras nunca são vazios demográficos. Foram os indígenas que ajudaram a proteger as fronteiras brasileiras na Amazônia”, dizem os autores, que ainda reagem ao que o presidente chama de “manipulação” das populações indígenas por ONGs. “Diferente do que o senhor diz de forma preconceituosa, também não somos manipulados pelas ONGs. As políticas públicas, a ação de governos e do Estado Brasileiro é que são ineficientes, insuficientes e fora da realidade dos povos indígenas e nossas comunidades.”

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Os indígenas dizem ter condições de elaborar projetos e iniciativas como os já aplicados no Estado do Amazonas sobre gestão de suas terras. “Quem não é indígena não pode sugerir ou ditar regras de como devemos nos comportar ou agir em nosso território e em nosso país. Temos capacidade e autonomia para falar por nós mesmos”.

Os autores lembram que os direitos dos povos indígenas são assegurados e garantidos nos artigos 231 e 232 da Constituição Federal, na Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT) e na declaração da ONU sobre os povos indígenas. Além disso, o texto cobra de Jair Bolsonaro o cumprimento dos discursos de campanha sobre fazer valer a democracia.

“Não aceitamos a ação ditatorial, pois contradiz com o discurso do senhor Ministro da Casa Civil Onyx Lorenzoni que defende o diálogo. Afirmamos que estamos organizados com lideranças e povos capazes de diálogo com o presidente, Estado brasileiro e governo”.

Política indigenista

Os índios classificam a reorganização administrativa do governo federal promulgadas pela MP n° 870, de 1° de janeiro, como uma “completa desordem e um ataque contra a política indigenista Brasileira que visa inviabilizar os direitos constitucionais dos indígenas."

A retirada da competência da Funai sobre o licenciamento de terras indígenas, que passou para o ministério da Agricultura, também foi apontada como uma ação com vistas a dizimar os povos tradicionais. "Essa prática já aconteceu no passado na história Brasileira como uma tentativa agressiva de nos dizimar. Foi um período muito difícil e ineficiente do Estado. Não aceitamos e não concordamos com suas medidas de reforma administrativa para gestão da política indigenista”, dizem os autores.

“Queremos continuar sendo indígenas, com direito a nossa identidade étnica, assim como somos brasileiros. Nosso modo de vida é diferente. Não somos contra quem opta por um modelo econômico ocidental, capitalista. Mas temos nossa forma própria de viver e se organizar nas nossas terras e temos nossa forma de sustentabilidade. Por isso, não aceitamos desenvolvimento e nem um modelo econômico feito de qualquer jeito e excludente, que apenas impacta nossos territórios. Nossa forma de sustentabilidade é para nos manter e garantir o futuro da nossa geração.”

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O texto ainda faz referência à declaração de Bolsonaro segundo a qual os índios não podem viver em um zoológico. “Não estamos nos zoológicos, senhor Presidente, estamos nas nossas terras, nossas casas, como senhor e como quaisquer sociedades humanas que estão nas suas casas, cidades, bairros. Somos pessoas, seres humanos, temos sangue como você, nascemos, crescemos, procriamos e depois morremos na nossa terra sagrada, como qualquer ser humano vivente sobre esta terra.”

Por fim, os indígenas pedem que o presidente considere a política de diálogo e a democracia em seu governo. “Nós lideranças indígenas, representantes legítimas, estamos prontos para o diálogo, mas também estamos preparados para nos defender”, finaliza o texto.

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Source: Rural

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