Deputada federal, Tereza Cristina foi indicada pelo presidente eleito Jair Bolsonaro como nova ministra da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Foto: Adriano Machado/Ed. Globo)
Quando assumir o comando do Ministério da Agricultura, em janeiro, a deputada Tereza Cristina (DEM-MS) vai precisar de muito diálogo. Com setores de um governo que, a começar pelo próprio Jair Bolsonaro, deram declarações desastrosas sobre o comércio exterior do Brasil. E com uma máquina pública enferrujada, para destravar processos vagarosos e modernizar o ministério, a fim de intensificar a produção agropecuária brasileira.
Nesta entrevista exclusiva, a atual presidente da Frente Parlamentar Agropecuária (FPA) explica como pretende melhorar a imagem do agronegócio lá fora e como espera levar adiante entraves como a reforma agrária, a melhoria na fiscalização agropecuária e a aceleração na concessão de crédito. “Quero trabalhar muito para termos uma área de inteligência que possa atuar com todos os nossos mercados.”
Globo Rural O que o produtor pode esperar do Ministério da Agricultura a partir de janeiro?
Tereza Cristina Queremos colocar algumas áreas do ministério no século XXI. Modernizar o ministério, facilitar a vida do produtor e simplificar a burocracia sem perder a segurança da legislação dos diversos segmentos que temos na pasta. Queremos melhorar o ambiente para que o produtor trabalhe com mais tranquilidade. Hoje se exige muito do produtor. Ele perde muito tempo com papel, atrás de licença disso, licença daquilo. Queremos simplificar, cumprir as mesmas coisas de maneira mais simplificada.
GR Até aqui, o governo eleito teve muitas declarações polêmicas sobre as relações externas do país, além de muitos recuos em anúncios. Como a senhora espera trabalhar em meio a isso?
Tereza Com muita tranquilidade, totalmente aberta ao diálogo. Eu já fiz isso, já conversei com o futuro chanceler (Ernesto Araújo), mostrando a ele o que é o agronegócio, suas necessidades, os mercados importantes para o país e como vamos acessá-los. Também falei da importância de, ao assumirmos, termos a formulação de políticas de governo e políticas setoriais em consonância, sempre mostrando as peculiaridades do agronegócio.
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GR Na reunião com Ernesto Araújo, a senhora falou de levar a imagem real do setor para os países compradores. Que imagem real é essa?
Tereza Precisamos levar para fora as coisas boas que o Brasil faz. Quanto preservamos, nosso Código Florestal, o que temos de área preservada, o que ocupamos de área para a agricultura e para a pecuária, que é infinitamente menor do que a grande maioria dos países desenvolvidos. Só que tudo isso tem um custo. Hoje, o produtor brasileiro tem de preservar, mas não recebe nada por isso. Todo segmento tem bandido. Não podemos associar a imagem do produtor brasileiro ao desmatamento, à destruição da Amazônia. O produtor rural não faz isso. Quem faz isso são pessoas que estão na ilegalidade. São bandidos que estão lá para roubar a floresta, para não pagar imposto. Essa não é a característica do produtor rural brasileiro. Temos de trazer mais gente aqui para conhecer.
GR O país ainda sofre com os efeitos da Operação Carne Fraca. Como espera eliminá-los?
Tereza Precisamos modernizar o sistema de fiscalização e vigilância sanitária. A defesa brasileira tem de ser modernizada. Nós temos de padronizar as ações, temos de conversar muito com o setor privado, empresarial, para dizer a eles que a responsabilidade é deles. No mundo inteiro, quem se responsabiliza pela qualidade dos produtos é o empresário. A fiscalização faz as auditorias para ver se as empresas estão cumprindo os requisitos que a lei exige. Não é só a lei brasileira, mas também as exigências dos países que compram nossos produtos. Nós temos de fazer uma compensação entre o setor público e o setor privado, que já vem melhorando. Precisamos fazer com que as missões estrangeiras que venham ao Brasil realmente levem a impressão de que nós colocamos o dedo na ferida e resolvemos os problemas, que estamos dando a garantia de que temos uma defesa sanitária de qualidade e de referência.
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GR O presidente eleito já disse que teme o avanço chinês no Brasil e contrariou alguns dirigentes do país asiático. A senhora acredita que esse tipo de posicionamento de Bolsonaro pode prejudicar os negócios do país?
Tereza É difícil dizer, mas eu acho que pode, sim, mas estamos conversando com o presidente e agora com o novo chanceler. Precisamos levar ao presidente os reflexos dessas posições. A China precisa comprar do Brasil, eu não tenho dúvida. Mas precisamos ter um bom diálogo. Nós não precisamos vender só para a China, temos de ter outros mercados. Hoje, a China está vivendo um namoro com o Brasil devido aos problemas com os Estados Unidos. Temos de tomar muito cuidado porque amanhã, se eles fazem as pazes, não podemos perder nossa agroindústria. Hoje, a vontade dos chineses de comprar do Brasil pode fazer com que nossa agroindústria perca seu vigor. Então é preciso ter muito equilíbrio nesse momento no que a gente fala e numa estratégia de exportação. Quero trabalhar muito para termos uma área de inteligência no ministério que possa trabalhar com todos esses mercados.
GR Como presidente da FPA, a senhora entregou ao candidato Bolsonaro uma lista prioritária que incluía a questão fundiária rural e urbana e a revogação das demarcações de terras indígenas. Como acredita que ficarão essas questões com a criação da Secretaria de Assuntos Fundiários?
Tereza O que o presidente tem dito é que ele não admite a invasão. A demarcação, se for legal, vai acontecer. Ninguém está acima da lei, nem eu nem o presidente da República. O que o presidente fala é das coisas que acontecem fora da legalidade. Invade para depois demarcar. Isso causa insegurança jurídica. Depois que acontece uma invasão e se judicializa aquela demarcação, ninguém ganha. Nem os índios nem os produtores. Então tem de demarcar, tem de ser rápido, com laudos corretos.
GR Como será a interlocução com os movimentos sociais sem-terra como o MST?
Tereza Todo movimento legalizado e com influência sobre as pessoas assentadas será ouvido. Eu mesmo vou começar a ouvi-los. Precisamos entender quais são as demandas, onde elas estão, porque a ideia do governo é fortalecer o pequeno agricultor. Nós queremos ver quais são as necessidades de crédito e de políticas específicas. O Brasil é muito grande, temos diferenças regionais, cada região tem um problema. Precisamos formular políticas de governo para que essas pessoas possam produzir. O presidente quer que as pessoas que estão na terra tenham condições de produzir, se manter e ter dignidade. Melhorar de vida. Esse é nosso discurso e nossa política. Nós receberemos todos, desde que cheguem com propostas, e não da maneira que era antes. Com invasor nós não vamos conversar.
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GR A que tipo de políticas a senhora se refere?
Tereza Vamos cadastrar as pessoas que precisam de terra e trabalhar para que aconteça a reforma agrária – e isso é uma coisa que vamos trabalhar muito firme – por meio de um cadastramento. Eu ainda não pus a mão na massa, mas já tenho informações de que temos mais lotes vazios de terras que já estão compradas do que pessoas para colocar nessas terras. Aí é uma questão de cadastrar e já colocar as pessoas que estão esperando um lote imediatamente.
GR Como a senhora pretende melhorar a concessão de crédito a longo prazo? Haverá programas destinados aos pequenos produtores?
Tereza Os agricultores familiares precisam de crédito, e de crédito mais barato com dinheiro do governo subvencionado. Agora, para o grande, e isso é uma coisa que eu ainda estou pesquisando, é preciso um seguro rural efetivo com uma cobertura para a maior parte dos produtores. Com isso, podemos criar uma previsão de que venha muito dinheiro, inclusive dinheiro de fora, para ser aplicado na agricultura. Hoje, o grande risco é climático, de não se colher. Se você tiver um seguro que cubra o risco da agricultura, imagino que possa ter muito dinheiro do mercado entrando para financiar a agricultura e também o investimento. A agricultura é cada vez mais técnica, e nós precisamos de dinheiro de mais longo prazo do que as linhas que temos hoje no mercado. Então, com o seguro, eu tenho certeza de que poderemos ter êxito na mudança da aplicação dos recursos no crédito rural.
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Entrevista publicada em dezembro de 2018, na edição 398 da Revista Globo Rural.
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Source: Rural