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Jeffrey Abrahams, da Fesa Group (Foto: Fernando Martingo/Ed. Globo)

 

O processo de sucessão nas empresas, especialmente familiares, deve ser preparado a médio e longo prazo, de forma clara e bem monitorado. É o que afirma Jeffrey Abrahams, da Fesa Group, com larga experiência em seleção de executivos no mercado agropecuário. “A família precisa reconhecer que quer um sucessor. A pessoa tem de querer também”, diz ele em entrevista à Globo Rural.

Dificuldades na troca de gestores podem ocorrer em qualquer empresa, afirma. Desde as administradas por famílias até grandes multinacionais. Um erro pode sair caro. Por isso, ele recomenda contratar empresas especializadas em formatar a governança e a transição.
O agronegócio precisa se estruturar melhor para mudanças de gestão empresarial em comparação com outras áreas da economia, diz Jeffrey, mesmo levando em conta o aumento da profissionalização no setor.

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Globo Rural  Por que a sucessão ainda é um problema para muitas empresas?
Jeffrey Abrahams  Há vários estágios e tipos de empresas dentro da cadeia de valor do agronegócio. As familiares, que começaram com um pioneiro, cresceram muito. Algumas tiveram grande sucesso em fazer a sucessão e existem outras que estão tendo certa dificuldade. A família empresária é um passo diferente. Precisa querer e tem de perceber que está na hora de fazer a sucessão. Você tem empresas que tiveram um fundador e o pai é o grande líder do negócio. Ele conseguiu colocar os filhos em algumas posições e chega a um ponto em que a empresa entra numa crise e não está preparada para a mudança. Há casos de sucesso em que a família inteira trabalha na empresa. A governança tem que ajudar a estruturar. Primeiro, a empresa tem de querer. Depois, buscar organizações de confiança para ajudar a montar a governança. Aí, avaliar a sucessão propriamente dita.

GR  O que indica que está na hora de pensar no assunto?
Abrahams  Muitas vezes, o líder mesmo percebe que está chegando ao ponto. Ou quando bate uma crise econômica ou familiar. Outro aspecto: com a entrada das private equities, há uma oportunidade de vender a empresa, ou parte da empresa, ou colocar capital para crescer.

GR  Existe um perfil de empresa mais problemático?
Abrahams  Cada caso é um caso. Precisa ser avaliado no tempo. Agora, sempre tem o primeiro passo. É o mais difícil, de estruturar. Ninguém está livre disso, mesmo as empresas profissionais. Multinacionais, companhias grandes. É muito comum porque, primeiro, falta gente adequada e, quando sai alguém de repente, poucas empresas têm a preparação do backup.

GR  Qual é a melhor maneira de fazer uma sucessão?
Abrahams  É buscar uma empresa especializada em governança para montar a estrutura e trabalhar junto com a que vai fazer a sucessão. Deve haver um processo muito claro e bem monitorado. A chance de dar errado na primeira vez é alta para a empresa e para o executivo. O custo é alto. Então é melhor fazer bem-feito.

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GR  Como preparar o substituto?
Abrahams  A família precisa reconhecer que quer um sucessor. A pessoa tem de querer também. Mas nem sempre querer é poder. Pode ser alguém que quer, mas não possui as ferramentas. Precisa preparar um CEO, ter conhecimento de finanças, gestão. Além do aspecto técnico, uma base que se adquire estudando ou trabalhando em outro setor. Pode levar cinco ou seis anos. Enquanto o fundador tiver uma visão moderna e for bem preparado, consegue preparar um filho ou filha. Quando a empresa chega até um certo ponto, está em R$ 150 milhões (de receita) e precisa chegar a R$ 1,5 bilhão, talvez precise de outro calibre de executivo.

GR  É um processo de longo prazo…
Abrahams  Fazer um MBA ou um curso em uma empresa ou passar por um processo de gestão de empresa familiar. Fora o aprendizado em novas ferramentas de gestão e a experiência que a pessoa precisa ter levando pancadas da realidade. Muitas vezes, o dono coloca uma pessoa totalmente despreparada para gerenciar. Vai perder líderes por conta desse conflito.

GR  Como você vê a sucessão no agronegócio?
Abrahams  Acho que há uma carência, apesar de existir um movimento forte de profissionalização no Centro-Oeste. A virtude dos grandes empresários é reconhecer muito bem onde têm fraquezas e quando realmente devem sair. Por outro lado, existe a necessidade de treinar o executivo. Há carência de profissionais treinados e dispostos a se realocar para novas fronteiras. Às vezes, ele sai de uma empresa multinacional para uma familiar. É uma diferença muito grande. E não existe um pool de talentos tão grande assim.

GR  Há ampla margem de gestores profissionais para atender ao agronegócio?
Abrahams  Existe um bom número. Muitas vezes, aparece também a questão da idade. Quando uma empresa familiar chega e diz “quero contratar um CEO”, faz uma lista e quer tudo no camarada, mas, quando você fala quanto deve pagar, se apavora. Trazer um bom profissional não é barato. Alguém maduro, que tenha capacidade de lidar com as emoções da família, costurar acordos, é alguém que, além de conhecimento técnico, tem experiência, sabedoria, maturidade. Quando você vai falar para uma pessoa “tem pessoas de 55, 60 anos”, o pessoal torce o nariz. Aí é que estão as pessoas experientes. Existe um preconceito em algumas áreas. “Não, esse cara já está velho, não vai ter energia”. Mas tem muita gente com 60, 70 anos que está com muita energia e vontade de trabalhar. Então, tem um pool de talentos represados que não estão sendo aproveitados.

GR Quanto o executivo custa?
Abrahams  Vai depender do tamanho da empresa. Você pode pegar alguém que vai custar de R$ 40 mil a R$ 45 mil. Alguém que seja  agressivo na busca pelos resultados e que pode trazer nos próximos três anos ou nas métricas que serão criadas, de Ebitda, participação de mercado, estruturação da equipe, giro de estoque, crédito, cobrança. Ou pode ir até R$ 100 mil, mais opções de ações ou bônus muito agressivos em termos de resultado. Ele pode entrar com salário menor, que seja de R$ 35 mil ou R$ 40 mil e, se a empresa for vendida, pode ganhar alguns milhões de reais. Mas não vai conseguir alguém que tenha essa experiência que as empresas precisam por menos de R$ 40 mil a R$ 45 mil.

GR  Eles enxergam o agronegócio como um setor atrativo?
Abrahams  Normalmente são pessoas de fora do setor. De uns três anos para cá, vejo pessoas que dizem “eu gostaria de trabalhar no agronegócio”. Aí quando você fala em mudar, começa a criar problema. Grande parte desses executivos é do centro-sul. Quando falamos que tem uma oportunidade em Lucas do Rio Verde, Campo Grande, Cuiabá, Quirinópolis, “não posso”. Ou a esposa trabalha ou o marido trabalha, os filhos estão em uma idade em que não podem ficar sozinhos. O que acontece? Ou para esses lugares vão pessoas bem jovens ou quem está com a família topando fazer uma mudança. Pesa muito. Na cidade, quando você vai buscar uma função, tem cinco ou seis candidatos bons e o cliente vai escolher três. Quando vai para o interior, a garimpagem é muito mais difícil.

GR  O agronegócio está preparado para processos de sucessão?
Abrahams  Tem um espaço para ser trabalhado. Por exemplo, concessionárias de tratores ou revendas. O mercado está mudando. A competitividade é cada vez maior, com a introdução de novas tecnologias. Vai exigir um profissional na ponta falando com o agricultor, vendendo valor, não só tirando pedido. As próprias escolas de agronomia sentem essa deficiência. Um agrônomo é muito bem preparado tecnicamente, mas não preparam esse executivo de business, para um negócio. Fora a língua. Ele tem de saber inglês, porque tem muitos investidores. Há excelentes profissionais no mercado que não falam inglês.

GR  Quais segmentos do agronegócio estão  mais maduros?
Abrahams  O setor industrial está um pouco mais avançado, como cana-de-açúcar e carnes. As pequenas não estão preparadas, principalmente na primeira geração. Eu diria que o setor de defensivos é um pouco mais fácil, porque já lida com multinacionais. Talvez os mais difíceis sejam os produtores.

Entrevista publicada na edição 393 da Revista Globo Rural, em julho de 2018.

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Source: Rural

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