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Gado meio-sangue angus nos confinamentos da Fazenda Santa Clara (Foto: Raphael Salomão/Ed. Globo)

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Criador de bovinos de corte no interior paulista, Luiz Moraes Barros Filho resolveu neste ano aplicar mais uma ferramenta para selecionar o gado de corte. Adotou pela primeira vez a ultrassonografia para a avaliação de carcaças. O objetivo de tornar mais precisa a separação do plantel, com base nos exames de imagem de determinados aspectos dos animais, visando obter um gado de alto padrão.

Luiz conta ter contratado o serviço de uma empresa de Araçatuba (SP). Os exames levaram alguns dias para serem feitos em 1.200 cabeças e ele garante que já percebeu a diferença quando compara com o modo como vinha separando seus animais até então.

“Em vez de separar a olho, vê o animal por dentro, determina os lotes e seleciona os mais parecidos. A avaliação é muito mais precisa e o animal que está melhor não precisa ficar mais tempo no cocho esperando o que está pior”, explica Luiz, proprietário desde 2005 da Fazenda Santa Clara, na região de Avaré.

Imagem de uma ultrassonografia usada para avaliação de qualidade de carcaça bovina. (Foto: Divulgação/FB Meat)

O uso da ultrassonografia para avaliar qualidade da carcaça assume a ideia de que o ganho de peso não é o único fator determinante do valor de um bovino de corte considerado de alto padrão. O exame de imagem serve para diferenciar os melhores com base em atributos que indicam um melhor acabamento do animal, que, por consequência, tende a proporcionar uma carne bovina de maior valor agregado.

Entre os pontos analisados, estão a chamada área de olho-de-lombo (AOL), que indica ganho de peso e rendimento dos cortes; a espessura de gordura subcutânea (EGS), medida próxima da costela, que indica o grau de acabamento do animal, o que interfere na idade de abate; assim como a espessura de gordura de garupa (EGG), para avaliar a cobertura na área da picanha; e o nível de marmoreio indica a gordura interna, que influencia no sabor.

Publicações técnicas sobre o assunto enumeram entre as principais vantagens do uso da ultrassonografia nessa fase do ciclo produtivo a redução de custos com alimentação, padronização das carcaças, melhor programação de abates e formação de lotes com melhores atributos.

Convencido por essa ideia, Luiz Moraes Barros Filho conta que pretende usar a ferramenta com mais regularidade, talvez a cada três ou quatro meses. O plano é priorizar os animais mais novos, que ainda não tenham sido submetidos ao exame, logo na chegada à fazenda, em lotes de 400 a 500 animais.

Na Santa Clara, ele mantém um plantel de 1.800 bovinos meio-sangue: genética angus implantada em vacas nelore. Com o cruzamento, a intenção é aproveitar o potencial de suculência e sabor de carne do primeiro, britânico, aliando-o à rusticidade e resistência do segundo, zebuíno. “Meu objetivo é carne de alta qualidade, entregar animais com melhor padrão e acabamento possível todos os meses do ano”, diz o pecuarista.

Trabalho rigoroso

Carne bovina de alta qualidade tem a ver, principalmente, com suculência, sabor e maciez. A principal diferença em relação ao produto mais comum, chamada de carne commodity, está na gordura, influenciada pela idade do animal no abate, acabamento da carcaça e marmoreio (a gordura interna da peça). O produto visto como premium é mais gorduroso e marmorizado. Quem entende do assunto diz que obtê-lo envolve técnica, ciência e tecnologia, em um trabalho rigoroso de seleção genética, nutrição, sanidade e manejo.

Roberto Barcellos é especialista nesse tipo de produto. Dá cursos sobre o assunto. Diz que roduzir carne de alta qualidade requer “obediência” a níveis mais elevados de processo, custos de produção e preços de venda; um controle rigoroso de todas as etapas, “da genética ao prato”. O objetivo é entregar ao consumidor um produto padronizado: peças do mesmo tamanho, bem cortadas, “desenhadas” e embaladas de forma atrativa. 

Diferentes cortes. Carne de alta qualidade está relacionada a sabor, maciez e suculência (Foto: Raphael Salomão/Ed. Globo)

Na Fazenda Santa Clara, o pecuarista Luiz Moraes são não faz a cria dos animais. só não faz a cria. Ele vai ao mercado e compra bezerros na desmama, com peso médio entre 200 e 250 quilos. Todos de criadores, ele garante, de gado de alto padrão e donos de genética angus provada. A depender das condições de oferta e demanda, ele adquire reses que chama de "meio caminho", pesando, em média, entre 350 e 370 quilos.

O gado, então, é dividido em três grupos para a fase da recria, em que é tratado a pasto e suplementação. Quando os machos estão com peso médio em torno de 450 quilos e fêmeas chegam a cerca de 400 quilos, vão para o confinamento. A terminação nos cochos é feita com ração preparada na fazenda, onde o pecuarista, além da processadora dos ingredientes, tem plantações de soja e milho para silagem. O boi é encaminhado ao abate com, em média, 600 quilos de peso. A vaca vai com peso médio entre 540 e 550 quilos.

O clinte da Fazenda Santa Clara é o próprio Roberto Barcellos. Ele é sócio da marca BBQ Secrets, em parceria com o frigorífico Frigol, de São Paulo. É sócio também da recém-lançada FB Meat, cujo objetivo é vender cortes diferenciados pela internet.

Barcellos acredita na eficácia do ultrassom de carcaça para produzir carne diferenciada em sistemas produtivos mais criteriosos, como o do seu fornecedor. O exame favorece a análise individualizada do plantel, que entende como fundamental para chegar ao padrão desejado.

Ele defende que a avaliação do gado deve ir além da observação dos padrões de cada raça ou do resultado dos cruzamentos industriais. O “blend” de raças acelera a expressão das características procuradas pelo criador. Mas a seleção de qualidade pode também ser feita entre animais só de uma raça, já que indivíduos podem apresentar variações entre si.

“Tenho que pensar em um indivíduo dentro de uma raça, a favor de um produto ou uma característica. Eu posso ter variações de indivíduos dentro de uma mesma raça ou cruzamento. Falar só de raça não garante que eu vá cumprir meus objetivos”, explica.

Eficiência reprodutiva

A ultrassonografia é utilizada também para medir a eficiência reprodutiva de matrizes, novilhas precoces ou vacas já eradas. “Serve para avaliar a precocidade sexual para a produção do bezerro que será abatido para dar uma carne premium”, explica o professor da faculdade de medicina veterinária da Universidade de São Paulo (USP), Pietro Baruselli.

Especialista em reprodução animal, ele afirma que o uso do ultrassom visa reduzir a idade do primeiro parto das vacas. Segundo ele, a média no Brasil hoje está em quatro anos. Com o exame, esse tempo chega a cair para dois. Outro objetivo é encurtar o intervalo entre os partos, de uma média de 17 meses, como ocorre atualmente, para um bezerro por ano.

“Isso tem um impacto muito grande em produtividade. O depósito de gordura tem relação direta com a fertilidade. Animais mais precoces depositam gordura na carcaça mais cedo. Usamos a ferramenta para fazer a seleção e melhorar essa eficiência”, diz Baruselli.

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O ultrassom para eficiência reprodutiva é feito anualmente, explica ele. Com base nos depósitos de gordura nas fêmeas, é possível ainda identificar e corrigir falhas no manejo nutricional. E como gordura é reserva de energia, lembra o professor, um bom volume no parto é importante também para a recuperação pós-parto e para a matriz ficar prenha de novo mais rapidamente.

Baruselli conta que a ultrassonografia chegou à medicina veterinária há cerca de 30 anos, mas só nos últimos 10 ou 15 a utilização passou a ser maior. O aparelho utilizado é semelhante ao utiliado na medicina humana. Passa apenas por adaptações de estrutura – nas telas e nas "ponteiras" usadas para captar as imagens, as probes – por conta do tamanho dos bovinos. A principal diferença está no software, próprio para medir atributos dos animais.

Na eficiência reprodutiva, a avaliação de resultados de exames de imagem permitiu a criação do chamado escore de condição corporal, conta o professor da USP. Com base nesses parâmetros, foi desenvolvido um método de análise visual das fêmeas na fase reprodutiva. “A correlação é alta entre as duas, mas a avaliação visual só foi validada por causa do ultrassom. Esse escore pode ser usado por criadores que não têm acesso ao ultrassom”, explica Pietro Baruselli.

*O repórter viajou a convite da FB Meat
Source: Rural

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