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A versatilidade tem transformado o caju em trunfo da indústria de alimentos à base de plantas no Brasil. Do pedúnculo à amêndoa, o aproveitamento é completo para produzir versões vegetais e de sabor similar a alimentos como carne, queijo, leite, requeijão e manteiga.

Entre os diferenciais, estão riqueza de proteínas, sabor neutro, preço atraente em relação a ingredientes importados e sustentabilidade, visto que a produção, concentrada no Nordeste, mescla cuidado ambiental com geração de trabalho e renda para pequenos produtores.

Caju antes de ser colhido (Foto: Bishnu Sarangi/Pixabay )

 

“A castanha de caju vai bem com tudo, é muito versátil, do doce ao salgado, da bebida ao prato”, diz Rodrigo Carvalho, sócio da A Tal da Castanha, empresa plant-based criada em 2015 e que vende 6 milhões de litros por ano de bebidas vegetais. 

“Projetamos crescimento de dois dígitos nos próximos anos, com a consolidação do mercado à base de plantas e pessoas querendo consumir menos produtos de origem animal”, destaca Carvalho, revelando que a meta é lançar 12 produtos em 2021.

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O otimismo também paira sobre a mineira Vida Veg, onde 11 dos 28 produtos do portfólio levam castanha de caju, incluindo similares a queijo, leite, requeijão e manteiga. “Trocamos a mandioca pela castanha porque entrega 18 vezes mais proteína, além de contribuir na textura. Todos os produtos têm vendido muito bem”, conta o diretor Anderson Rodrigues.

Trabalhadoras beneficiam manualmente as castanhas-de-caju das plantações locais (Foto: Divulgação)

 

 

Além do sabor, a vida útil e o preço compensam – o custo da castanha de caju é mais barato do que amêndoas (-34,4%) e coco (-10%). Por ano, a indústria consome 50 toneladas de castanha, mas a expectativa é crescer mais. Para 2021, 10 novos produtos vão entrar no portfólio, metade à base de castanha.

O sucesso da empresa plant-based tem efeito direto no sertão nordestino. Afinal, é de lá que vem a castanha usada pela Vida Veg. A fornecedora é a ONG Amigos do Bem, que atua há mais de 25 anos em regiões carentes, atende 75 mil pessoas e gera mais de 1 mil empregos.

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“O caju é o carro-chefe da parte agrícola. A primeira plantação foi em 2004 e, hoje, são 630 hectares entre Pernambuco e Ceará. Ainda temos duas fábricas de beneficiamento, que geram 600 empregos”, afirma Andre de Luca, diretor da ONG, ao ressaltar que a procura pelas indústrias tem aumentado.

Ele ressalta o papel social da cajucultura como um motivo a mais para valorizar o setor. Tanto que o projeto incentiva a plantação no Nordeste – quase 1 mil famílias já receberam mudas e têm tido acesso a orientação técnica, com garantia de compra por preço justo.

“A ideia é que eles consigam crescer. O caju é a muda da esperança, transformação e mudança para essas pessoas”, diz Luca, destacando os graves efeitos da pandemia no sertão e a busca permanente da ONG por mais apoio e doações.

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Oportunidades e desafios

Iniciativa da ONG Amigos do Bem gera mais de mil empregos na Região Nordeste (Foto: Divulgação)

 

O interesse da indústria vem em um momento positivo no campo. A mais recente análise da Companhia Nacional de Abastecimento (Conab), de novembro de 2020, aponta que, em um ano, o preço pago ao produtor pela castanha de caju in natura subiu 32% no Ceará, principal produtor, com 61%.

Além disso, a produção brasileira cresceu 8,1% em relação a 2019 e teve o maior volume desde 2015. Apesar de a área cultivada ter caído 1,8%, a produtividade saltou 10,1%. A situação, porém, poderia ser melhor, avalia Vitor Hugo de Oliveira, engenheiro agrônomo e assessor do Instituto Caju Brasil (ICB), ONG sem fins lucrativos que representa o setor. 

Ele observa que o Brasil hoje responde por 3,85% da produção mundial, com 138,7 mil toneladas de castanha de caju em 2020. “Devido à nossa baixa produção, frequentemente temos importado – foram 15,4 mil toneladas no ano passado. Por isso, o grande desafio é produzir mais, pois este é um mercado em crescimento”, observa.

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No ano passado, segundo Oliveira, a área colhida de castanha de caju foi de 425,7 mil hectares. Para 2021, o IBGE estima aumento de menos de 1%. “Faltam políticas públicas mais agressivas para o setor, que tem papel muito importante para emprego e renda no Nordeste”, analisa ele ao ressaltar que, hoje, 45% da produção é consumida no mercado interno.

Entre os incentivos necessários, Oliveira cita garantia de preço mínimo ao produtor, assistência técnica regular e de qualidade, apoio para implantar novas áreas e renovar pomares e uma melhor organização da cadeia.

Nesse sentido, diz ele, a expansão do setor plant-based é uma oportunidade. “Para cada quilo de castanha, há oito quilos de caju. Por isso, é importante renovar os pomares e aprofundar pesquisas para aproveitá-lo ao máximo na alimentação”, sugere.

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Potencial comprovado

A produção nacional foi de 138,7 mil toneladas no ano passado, segundo o IBGE (Foto: Divulgação)

 

A versatilidade do caju já é tema de estudos no Brasil, como os feitos pelos pesquisadores de Ana Paula Dionísio e Nedio Wurlitzer, da Embrapa Agroindústria Tropical. Segundo eles, o foco é reaproveitar castanhas quebradas – de menor valor de mercado, mas ainda nutritivas – e resíduos ricos em proteína para subprodutos como, por exemplo, óleo e queijo vegetal.

Outro projeto em andamento analisa o uso da fibra do pedúnculo como ingrediente para produtos como carne vegetal. “Estamos otimizando processos para ver como maximizar a extração e ter ganhos econômicos”, diz Ana Paula.

Janice Ribeiro Lima, pesquisadora e engenheira de alimentos da Embrapa Agroindústria de Alimentos, observa que a castanha de caju tem de 42% a 45% de gordura ou óleo, alto valor nutricional, e amêndoa com teor de proteína acima de 20%. “É muito versátil, tem facilidade de emulsificação e características interessantes para aplicar em alimentos”, ressalta.

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Também há pesquisas usando uma técnica chamada “biorrefinaria”. Segundo Fernando Abreu, engenheiro de alimentos da Embrapa, o processo resulta na extração de fibra (para uso em carnes à base de plantas), suco clarificado (cajuína, já vendida em supermercados) e um corante amarelo para alimentos.

“De cada tonelada de pedúnculo, tiro 30 kg de corante, suficiente para colorir 1 mil litros de suco”, conta Abreu, observando que o subproduto pode ser usado em sucos, iogurtes e queijos vegetais, entre outros.

Ele destaca, no entanto, que a produção em maior escala tem esbarrado no atraso tecnológico da indústria – a produção de suco, por exemplo, não suporta linhas paralelas para extrair corante e fibras. “Precisamos nos organizar para tirar mais proveito da matéria-prima”, afirma.

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Bom para o coração

A urgência se justifica pela busca crescente por alimentação saudável, em especial após a pandemia de Covid-19. Afinal, os benefícios da castanha à saúde incluem, por exemplo, alto índice de proteína e teor equilibrado de gordura.

“A gordura da castanha de caju é muito rica em ômega 9, o que tem correlação direta com a saúde cardiovascular”, observa Alessandra Luglio, diretora do departamento de saúde e nutrição da Sociedade Vegetariana Brasileira (SVB).

Mais um motivo para o setor acelerar. “É preciso maior comunicação entre produtores, indústria e comércio, além de união para atrair investimentos e implantar pequenas e médias empresas de produtos a partir do caju”, finaliza Oliveira.

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Mais castanhas no radar

Outras castanhas, além da de caju, estão no radar da indústria plant-based no Brasil. É o que apontou mapeamento feito pelo GFI em busca de novos ingredientes, que indicou seis prioridades: castanha do Brasil, babaçu e cupuaçu, no bioma Amazônia, e baru, pequi e macaúba, no Cerrado.

“A ideia é buscar formas de agregar valor aos produtos, visto que são nacionais e oriundos de árvores nativas do Brasil”, diz Cristiana Ambiel, coordenadora de ciência e tecnologia do GFI.

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Um edital será aberto para financiar pesquisas, que devem começar em setembro e durar um ano. O movimento já é observado de perto pela Associação Brasileira dos Produtores de Nozes, Castanhas e Frutas Secas (ABNC).

“Quanto mais pesquisa tiver, mais oportunidades vão surgir”, avalia José Eduardo Mendes Camargo, presidente da entidade, ressaltando que o setor trabalha para agregar mais valor, mapear melhor a produção e criar um selo que certifique qualidade, segurança e produção justa e sustentável.

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Source: Rural

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