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Tendência depreço pago ao produtor de leite era de alta, mas com o coronavírus, situação se inverteu (Foto: Rogério Albuquerque)

 

A repentina mudança no cotidiano da população brasileira, desde que começaram a surgir os primeiros casos de Covid-19 no país, afetou as negociações entre produtores de leite e indústria de lácteos. A forte oscilação nos preços de alguns produtos no início de
abril, provocada pela corrida da população aos supermercados, gerou distorções nos indicadores usados para o pagamento do leite cru nos principais Estados produtores e deu início a uma queda de braço no setor.

Após acumular queda de 5,9% no primeiro trimestre de 2020, oa indicações para o preço do leite pago ao produtor brasileiro era de alta, segundo os indicadores calculados pelos conselhos paritários entre indústria e produtores (Conseleite), presente em seis Estados
brasileiros. Em Minas Gerais, o valor de referência para o leite entregue em abril a ser pago em maio teve alta de 5,62% em relação ao último mês. Em Santa Catarina, a alta foi de 3,8%; no Paraná, 6,75%, enquanto no Rio Grande do Sul a alta foi mais expressiva, 9,79%.

“Apesar de todos os Conselhos sinalizarem altas, tivemos relatos de descumprimento dos acordos. Produtores do estado do Paraná apontam que importantes empresas fecharam o mês com a manutenção do preço pago no mês anterior”, afirmou a CNA, em nota divulgada na última quarta-feira (06/05). O documento cobra que a indústria cumpra os acordos estabelecidos pelos Conseleites.

Sem caráter vinculativo

Criados para garantir maior transparência ao mercado de lácteos, os indicadores calculados pelos conselhos paritários não possuem caráter vinculativo, ou seja, não são de adesão obrigatória. Os percentuais são calculados com base nas vendas realizadas no varejo no mês anterior e nos custos de produção e são usados apenas como referência para o pagamento do leite captado no mês anterior.

“Na verdade, não tem um contrato. Raramente os produtores têm contratos que coloquem o valor do leite. O que a gente busca é que a indústria compreenda a situação dos produtores, que estão trabalhando no vermelho desde o início do ano”, explica o presidente da
Comissão Nacional de Pecuária de Leite da CNA, Ronei Volpi. Segundo o Cepea, o custo de produção do leite aumentou 3,18% nos três primeiros meses deste ano, puxado por uma alta de 23% no farelo de soja. 

“Nós queremos que a indústria mantenha o compromisso dela e, em maio, pague com o índice observado em abril”, completa o presidente da Associação Brasileira de Produtores de Leite, Geraldo de Carvalho Borges. Segundo ele, o reajuste indicado para maio não chega
nem perto de cobrir a defasagem acumulada nos preços pagos ao produtor nos últimos anos.

Cenário atípico

O presidente do Conseleite-RS, Alexandre Guerra, explica que a distorção entre a alta indicada pela entidade e o proposto pela indústria se deveu à forte oscilação do mercado de lácteos no início do mês. “Havia um cenário com uma tendência de alta e, depois
disso, o mercado foi puxando pra baixo” observa. Segundo ele, esse tipo de distorção não havia ocorrido até então porque o setor nunca enfrentou oscilações tão intensas nos preços.

“Antes não tinha problema na forma de calcular o indicador porque os preços não apresentavam grandes variações. O que aconteceu este mês foi que, em virtude da Covid-19, houve uma procura maior pelo leite UHT no início do mês seguida de queda nas semanas seguintes”, relata Guerra. Com isso, o cálculo feito pela indústria ficou descolado do apontado pelo Conseleite gaúcho, que considera apenas os dez primeiros dias do mês para calcular o seu indicador.

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Além do período de coleta dos dados, Guerra lembra que a indústria leva em consideração outros fatores no cálculo do preço pago ao produtor, como os estoques e capacidade ociosa. “O indicador não considera os custos com estoques ou com o que foi deixado de produzir
em virtude de uma epidemia”, afirma o presidente do Conseleite gaúcho, que defende o papel da instituição. “Isso significa que o indicador é uma ferramenta incorreta? Não. Ele é uma ótima e garante transparência ao mercado. Mas esse mês deu distorção por conta
de uma pandemia”, conclui Guerra.

Confiança abalada

Para Ronei Volpi, as distorções geradas pela Covid-19 nos preços pagos pela indústria provoca um “desgaste” na relação com os produtores. “Essa situação vai gerar um desgaste que vamos ter que resgatar ao longo do caminho. É um prejuízo de imagem para os dois lados”, avalia o presidente da Comissão Nacional de Pecuária de Leite da CNA, que espera normalização do mercado nos próximos meses. “Em maio, vamos discutir de novo com novos valores e, se deus quiser, que não sejam diferenças tão drásticas e tão difíceis de conciliar porque a gente sabe que a situação não está fácil”, reconhece.

Para a Abraleite, a posição da indústria é errada. “Seja dizendo que vai baixar ou manter, o preço, isso está errado. Se foi observado uma alta do preço em abril, principalmente nas duas primeiras semanas, isso tem que ser repassado ao produtor em maio”, defende
Borges ao lembrar que os produtores entregam o leite à indústria antes mesmo de saber o valor que vão receber – o que aumenta a importância dos indicadores apontados pelos Conseleite. 

“No primeiro dia de fornecimento o produtor chega a ficar 50 dias sem receber. É uma situação muito frágil porque o produtor está recebendo o pagamento de algo que ele já entregou”, ressalta o presidente da Abraleite.
Source: Rural

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