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O ano de 2021 marcou uma virada no consumo de um dos temperos mais utilizados no país. Pela primeira vez em cinco anos, o brasileiro usou mais alho nacional do que produto importado. Segundo a Companhia Nacional de Abastecimento (Conab), as importações caíram 35% no ano passado na comparação com 2020, somando 125,7 mil toneladas, enquanto a produção brasileira saltou de 132 mil para 168,1 mil toneladas.

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O Brasil importou mais da Argentina no ano passado por causa das dificuldades logísticas e da falta de contêineres, que tornaram o alho chinês muito caro (Foto: Getty Images )

 

Além disso, o alho chinês, que dominou o mercado nos últimos anos, perdeu espaço para o argentino: 76 mil toneladas (o equivalente a 60,5%) vieram do país vizinho e apenas 44,7 mil toneladas tiveram a China como origem, em relação às 193 mil toneladas de 2020.

“Batemos recorde de produção em 2021 graças ao investimento crescente em tecnologia, que nos fez pular da média de 14 toneladas para 18 toneladas por hectare em poucos anos”, diz Rafael Jorge Corsino, presidente da Associação Brasileira dos Produtores de Alho (Anapa). Os números de safra da associação superam os da Conab: produção de 240 mil toneladas (24 mil caixas de 10 quilos). Um aumento de 20% em comparação a 2020, para um consumo estimado de 360 mil toneladas.

Corsino explica que o Brasil importou mais da Argentina no ano passado por causa das dificuldades logísticas e da falta de contêineres, que tornaram o alho chinês muito caro. Maior produtor mundial, com 21,2 milhões de toneladas, a China vinha elevando suas exportações para o Brasil, apesar da renovação da taxa anti-dumping de US$ 0,78 por quilo. A Anapa luta na Justiça para derrubar liminares que garantem a duas empresas importadoras o não pagamento da tarifa.

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A associação de produtores também promove campanhas de marketing em supermercados e nas redes sociais para ressaltar a qualidade do alho roxo brasileiro, que é mais pesado, tem mais dentes por cabeça e sabor mais forte e ácido, diante do alho chinês branco (mais leve, com menos dentes por cabeça e de sabor mais doce). Em dezembro do ano passado, ao lado da Associação Brasileira de Supermercados (Abras), foi lançada a campanha "Brasil Temperado", que contou com a participação em vídeo da ministra da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa), Tereza Cristina.

Rafael Jorge Corsino, presidente da Anapa, prevê que nos próximos anos o Brasil poderá atingir autossuficiência (Foto: Wenderson Araújo)

 

Para a safra que começou a ser plantada no final de fevereiro, a projeção da Anapa é de novo crescimento de 20% na produção e aumento da área plantada de 16 mil para 19 mil hectares – outro recorde. Na importação, a Argentina ainda deve liderar neste ano, porque a crise logística permanece sem solução a curto prazo. Corsino estima que a produção brasileira nos próximos anos poderá chegar perto da autossuficiência, com 280 mil toneladas, mas ressalta que o setor não visa eliminar a importação.

O Brasil tem cerca de 5 mil agricultores familiares na produção de alho e mais 1,7 mil pequenos, médios e grandes produtores concentrados em Minas Gerais (líder do ranking), Goiás, Santa Catarina e Rio Grande do Sul. Juntos, os quatro Estados respondem por 92% da produção nacional.

Corsino, que planta 150 hectares, em Cristalina (GO), diz que vale a pena ser produtor de alho desde que o agricultor invista em um pacote tecnológico, que inclui as sementes livres de vírus, nutrição da planta, irrigação e manejo fitossanitário, entre outros. A implantação de 1 hectare custou cerca de R$ 150 mil em 2020 e deve subir para R$ 180 mil neste ano. “A rentabilidade varia de 12% a 15%, mas depende muito da produtividade, que, além do uso da tecnologia, é impactada pelo clima. Em 2021, o clima foi bem favorável ao alho.” 

Quem viu boas oportunidades na produção foi Osório José Barbosa Netto, produtor de HF, cereais e café em São Gotardo (MG), maior polo de produção de alho do país. Há 13 anos, ele plantava 12 hectares de alho e, agora, semeia 350 hectares da hortaliça, que se tornou o carro-chefe de sua produção agrícola. A produtividade vem aumentando a cada ano. Começou em 12 toneladas por hectare; no ano passado, chegou a 21 toneladas; e a expectativa é colher neste ano 23 toneladas por hectare.

Barbosa Netto: Produtor semeia 350 hectares da hortaliça, que se tornou o carro-chefe de sua produção agrícola (Foto: Arquivo Pessoal)

 

Barbosa Netto, engenheiro agrônomo e gestor em agronegócios, afirma que o Brasil pode ser autossuficiente em alho em poucos anos, e até passar a exportar, mas foi a concorrência com o tempero importado que desafiou o produtor brasileiro a investir em tecnologia para ter mais produtividade. Nas fazendas da família, ele está implantando neste ano estufas para a produção contínua de plantas livres de vírus. Além disso, investe em adubação e na aplicação de bons defensivos para maximizar o potencial produtivo da planta.

A Agrícola Wehrmann, que cultiva hortaliças e cereais em Cristalina (GO), também viu a produtividade de seu alho crescer com o investimento em tecnologia. Rodrigo Ribeiro Cardoso, diretor da empresa, atribui principalmente ao trabalho intensivo de desenvolvimento da qualidade da semente o aumento de produtividade de 12 toneladas por hectare, em 2016, para 17,5 toneladas, no ano passado. A Wehrmann tem como carro-chefe a soja, mas o alho ocupa 500 hectares e está entre as três culturas de maior faturamento da empresa.

A Wehrmann também investe em laboratório para limpar suas sementes, em estufas isoladas para a multiplicação e em estruturas de armazenamento do alho. “Temos buscado inovações tecnológicas na cultura do alho em todo o mundo, por causa do aumento de custos da cultura. Como plantamos em dólar e colhemos em real, precisamos de toda a tecnologia disponível para elevar a produtividade.”

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A produção de alho, totalmente manual, emprega cerca de 300 mil pessoas no país, tendo criado 40 mil vagas em 2021, segundo a Anapa. O presidente da entidade, que tem 400 funcionários na produção e beneficiamento do alho em sua fazenda a 50 quilômetros de Brasília, diz que o Brasil não usa máquinas porque o ciclo de produção no clima tropical é muito curto (120 dias no Cerrado), enquanto na Europa passa de 200 dias. “A semente de alho tem de ser plantada em pé com a raiz para baixo para ter boa produção no ciclo curto.”

O produtor Barbosa Netto conta que chegou a importar três máquinas da Europa para acelerar a colheita, mas desistiu do equipamento, pois, segundo ele, apresentava problemas, como a perda da qualidade dos bulbos. “Continuamos buscando formas de mecanizar a produção, mas é preciso lembrar que muita gente depende da lavoura de alho.” Ele emprega 450 pessoas só para o alho, sendo 250 fixos, que ganham de dois a três salários mínimos por oito horas de trabalho.

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Source: Rural

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