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Dentre todas as alternativas existentes para reduzir as emissões de metano do rebanho bovino, como enzimas e aditivos incluídos na ração animal, a maior contribuição talvez esteja em um processo mais elementar da criação de gado: o manejo de pastagens. Um pasto bem cuidado pode significar até 12% menos de emissões do gás formado no processo de digestão dos animais, de acordo com estudos.

Muitos desses trabalhos são concentrados em pecuária leiteira e em países de clima temperado, mas podem ser um indicativo do potencial da pecuária de corte na redução dos níveis de metano na atmosfera, diz o professor do departamento de zootecnia da Universidade Federal do Mato Grosso (UFMT), Luciano Cabral.

Qualidade da pastagem tem impacto tanto nas emissões de metano quanto no sequestro de carbono da atmosfera (Foto: Gabriel Olivera/Agência El Campo/Divulgação)

 

 

“Do ponto de vista nutricional, comparando uma forrageira não devidamente manejada com uma manejada adequadamente, e que proporciona ao animal um maior consumo de lâmina foliar vede, que seria aparte mais nutritiva da planta, provavelmente se tenha menor teor de fibra e maior quantidade de carboidratos solúveis. Só olhando para isso, a gente já pode fazer algumas inferências sobre o processo fermentativo”, explica Cabral.

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Com menor teor de fibras, a pastagem bem manejada propicia uma digestão ruminal mais rápida, o que limita o crescimento da população e a ação de bactérias metanogênicas, responsáveis pela formação do metano. Embora as pesquisas disponíveis atualmente estejam concentradas na pecuária de leite e em forragens de clima temperado, Cabral acredita que, em pastagens de clima tropical, como no Brasil, a redução das emissões pela melhor qualidade nutricional dessas gramíneas pode até passar dos 12% já observados em outros países, devido à melhor qualidade das espécies usadas aqui.

Por outro lado, o professor alerta que a formação do metano é fundamental para o processo digestivo dos ruminantes. Ou seja: zerar as emissões é incompatível com a própria fisiologia desses animais. “Embora o metano represente uma perda de energia no rúmen e colabore para o aquecimento global, o evento da metanogênese é fundamental para o ecossistema ruminal. Há vários trabalhos mostrando que, se diminuir a população metanogênica, provavelmente diminuirá a digestão de fibras e o número de bactérias que degradam a celulose”, aponta o pesquisador.

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Ele defende a adoção de estratégias que maximizem a produtividade da pecuária, tanto de corte quanto de leite. “O Brasil tem condição plena de continuar sendo o segundo maior produtor de carne do mundo eo maior exportador e com baixa emissão de metano. Isso vai de encontro ao que temos que fazer” observa o professor da UFMT.

Para o pesquisador e chefe-geral da Embrapa Pecuária Sudeste, Alexandre Berndt, o manejo de pastagens é estratégico para o Brasil contribuir com o cumpromento da meta firmada na COP26 – de uma redução global de 30% nessas emissões – porque ataca três problemas de uma vez: a emissão de metano, o sequestro de carbono e o ganho médio de peso diário.

“Quando a gente adota uma boa tecnologia de manejo de pasto, está atacando três pilares importantes para reduzir as emissões do setor: a redução da fermentação, a diluição das emissões e o sequestro de carbono. Além disso, como ele tem uma qualidade superior nutricionalmente, vai permitir que o animal ganhe mais peso, encurtando o ciclo de produção”, ressalta o pesquisador.

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Reduzir a idade desses animais é fundamental para aumentar a produtividade da pecuária nacional, hoje em torno de 4,5 arroba por hectare. “A adoção de tecnologia nesse setor ela ainda é feita por uma pequena minoria, além de ter como característica predominante a prática da pecuária extensiva”, observa o diretor executivo da ONG Amigos da Terra, Mauro Armelin.

Como 80% do rebanho brasileiro é criado em pastagens, ele avalia que faria mais sentido mitigar as emissões de metano via sequestro de carbono do que reduzir as emissões do gás em si. “A não ser que alguém invente alguma pílula que dê ao boi e na hora do processo digestivo ele reduza o metano”, pontua o ambientalista.

A pílula não existe, mas o mercado já dispõe de enzimas que otimizam a digestão dos animais, reduzindo as emissões – tecnologias que, embora eficientes, estão longe de serem adotadas em larga escala. 

“Tecnologicamente já é viável, mas economicamente tenho certeza que não, porque não vejo ninguém fazendo em larga escala, de forma comercial”, destaca Armelin. Berndt, da Embrapa, concorda: “Se fosse fácil, todo mundo já teria feito. Então, realmente, precisa de vontade, inteligência e ciência”, ressalta o pesquisador.

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No caso do manejo de pastagens, ele lembra que a pesquisa no Brasil nessa área já acumula duas décadas e terá contribuição decisiva no cumprimento das metas firmadas em Glasgow. “Isso que estamos discutindo hoje de manejo de pasto é uma ciência que vem sendo executada nos últimos vinte anos. Só que a gente precisa continuar com os investimentos em ciência e tecnologia para que a gente possa trazer novas soluções para esses novos desafios, como o pacto do metano”, destaca o chefe-geral da Embrapa Pecuária Sudeste.

Ele lembra que, para atingir uma meta dessa magnitude, o Brasil precisará desenvolver novas tecnologias. “São soluções complexas e não será algo trivial. Por isso a gente precisa conhecer exatamente o pacto, fazer o planejamento da estratégia de enfrentamento desse desafio e receber os recursos para pesquisa ou aplicação das tecnologias que já existem”, completa Berndt.

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Source: Rural

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