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O presidente da torrefadora italiana illycaffè, Andrea Illy, defende que os cafeicultores brasileiros adotem os sistemas da agricultura regenerativa, para reduzir o impacto das mudanças climáticas e garantir a sustentabilidade da atividade. O executivo observa que práticas como o cultivo em agroflorestas, algo bem familiar ao cultivo em outros países, é pouco praticado pela cafeicultura nacional.

“Está claro que, nas últimas duas décadas, o café está sendo impactado por secas, inundações, altas temperaturas, geadas… É surpreendente, mas está acontecendo. E a agricultura regenerativa, que começar pelo cuidado com a terra, é a solução para a resiliência climática”, afirma.

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Andrea Illy, presidente da Illycaffè, empresa italiana considerada grife no ramo do cafpe (Foto: Divulgação)

 

Descoberto na região que atualmente é a Etiópia, no continente africano, o café foi criado originalmente sob a sombra. É comum até hoje em países da África e também da América Central que o cafezal seja coberto pela copa das árvores, relata o executivo em entrevista concedida à Globo Rural.

Andrea Illy lembra que as mudanças climáticas fazem as condições do tempo serem mais erráticas. "As altas temperaturas constantes têm feito a produção e a produtividade caírem significativamente, no Brasil e no mundo. No entanto aqui, o cafezal exposto em terreno aberto sofre ainda mais com a falta de umidade", diz ele.

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“Na maioria dos países produtores, o café é sombreado, mas não no Brasil, onde o café  é cultivado exposto ao sol, por causa da mecanização. Isso amplifica o problema, pois onde há mecanização vai ser mais difícil de alternar com outras culturas e também mais difícil introduzir plantas que fazem sombra. Ainda assim, é possível pensar em cultivos que possibilitem a mecanização”, afirma.

Ylli observa que as regiões cafeeiras de Minas Gerais apresenta aumento de temperatura duas vezes acima do resto do mundo, o que está diretamente ligado ao desmatamento da Mata Atlântica, a qual já teve 98% de seu território devastado devido à derrubada da floresta original. “O Brasil costumava ter a Mata Atlântica, que era até maior do que a Amazônia há muitas décadas atrás. Ninguém mais fala da Mata Atlântica, porque ela foi destruída”, lamenta.

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O atual modelo de produção, sob o sol e em monocultura, causa dois problemas, segundo Andrea Illy: a necessidade de saber lidar com condições climáticas diversas frequentemente e o aumento de custos de produção para se adaptar a elas. Para isso, são sugeridas três mudanças significativas. “A primeira é mudar as práticas agronômicas, a segunda é desenvolver novas variedades adaptadas para a resiliência às mudanças climáticas, e a terceira é migrar para altitudes mais altas”, disse ao elogiar os trabalhos da Embrapa e o Instituto Agronômico (IAC) nos estudos sobre café e clima.

Como solução para este dilema, inclusive para aliviar a vida do cafeicultor que enfrenta a crise dos insumos, a alternativa indicada pelo italiano é a agricultura não-convencional, fundamentada no que se chama de soluções baseadas na natureza. "Isso significa recuperar o equilíbrio do ecossistema para que a planta absorva o máximo de nutrientes com o mínimo de intervenção humana. E esta auto regulação do ciclo produtivo começa com o trato bem feito do solo."

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Solo e biodiversidade

O presidente da Iilycaffè explica que os processos biogeoquímicos do solo ficam comprometidos quando há muito desmatamento e a área convertida em monocultura diminui a biodiversidade e a fertilidade da terra. “Por isso que nas últimas décadas muita área foi abandonada, por causa da perda de produtividade devido à extrema exploração. Agora já temos esse conhecimento e precisamos resgatar a agricultura não convencional, como a agricultura regenerativa”, comentou. 

Todas as práticas não convencionais, de acordo com o executivo, têm o mesmo princípio de preservar o gás carbônico no solo. Ao explorá-lo demasiadamente, reduz-se a matéria orgânica, empobrecendo a biodiversidade, que não é só responsável pela fertilidade mas pela resiliência a doenças. “A biodiversidade é uma defesa natural e com isso não seriam tão necessários os pesticidas, herbicidas, agrotóxicos, que eventualmente podem comprometer o solo, a água e o cultivo”, pontua o executivo.

“É extremamente importante considerar o cuidado e a recuperação dos solos, principalmente no Brasil, onde a monocultura e o uso intenso de defensivos estão contribuindo muito para as mudanças climáticas. Não por acaso, as companhias de agroquímicos estão ampliando o portfólio com soluções alternativas, visando o plantio orgânico”, argumentou Andrea Illy.

Combinar a recuperação dos solos com o reflorestamento é o que Andrea Illy chama de agroecologia, em que há uma abordagem holística de pensar a paisagem a fim de regenerar ecossistemas e viabilizar terras mais saudáveis. “A boa notícias é que as mesmas práticas agronômicas também são boas para a descarbonização e, portanto, o mercado de carbono”, complementa.

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"O que é importante para a resiliência e a fertilidade é a biodiversidade. Reflorestar traz tanto biodiversidade, quanto menores temperaturas, mais umidade, então definitivamente é mais sustentável ter o café rodeado de florestas. E isso é pouco feito no Brasil”, disse. Para isso, ele reconhece que é preciso investimento de longo prazo para adaptação à nova forma de produzir.

Ele admite que a transição da forma de cultivo pode levar tempo e apresentar queda de produtividade. Porém, com incentivos financeiros e planejamento, é possível “construir uma ponte para que a mudança da [agricultura] convencional para regenerativa seja mais tranquila”, defende.  Segundo Andrea Illy, a Índia é um dos melhores exemplos, pois integra café, baunilha, pimentas e banana. “Eles têm menos produtividade no café, mas isso é compensado com as produções extras”, ponderou.

“No Brasil, não será uma jornada fácil. Para aqueles que produzem cerca de 80 sacas por hectare, não será fácil, mas é necessário. De um jeito ou de outro, é melhor começar agora a modificar as práticas para não ser surpreendido negativamente pelo clima, e de forma definitiva”, alertou.

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Em paralelo à conversão para a agricultura regenerativa, o executivo ainda sugere que o Brasil expanda a área de reservas naturais, aumentando a capacidade de sequestrar carbono. “Se quiser alcançar a meta de zero emissões até 2050 e contribuir para manter o aquecimento global em até 1,5ºC até o final do século, a única forma é começar a reflorestar agora. Isso é prioridade para países como o Brasil, porque a Amazônia também faz um papel essencial de provedor de chuvas para todo o planeta”, comentou o italiano.

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Source: Rural

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