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Guilherme, que está no 7° ano, prefere ciências entre todas as disciplinas (Foto: Marcelo Curia/Globo Rural)

 

Os professores e alunos da pequena Escola Estadual de Ensino Fundamental Boqueirão, localizada na cidade de Santiago, na região central do Rio do Grande do Sul, a cerca de 450 quilômetros da capital, nos últimos meses vêm se reinventando para enfrentar as limitações impostas pela pandemia de Covid-19. A escola, que tem 63 anos de fundação, é uma das cinco do município que estão vinculadas à rede estadual de ensino.

Com sete professores, dois funcionários e 23 alunos matriculados no turno da tarde, do 1o ao 9o ano, a Escola Boqueirão retomou as aulas presenciais no último dia 10 de maio. Apenas cinco alunos não retornaram presencialmente, porque têm parentes idosos ou irmãos pequenos morando juntos.

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Eles assistem às aulas on-line no sistema de modelo híbrido pela plataforma disponibilizada pelo governo gaúcho. Apenas um professor também não retornou, porque teve Covid-19 e ficou com sequelas da doença.

Acima, sala de aula da Escola Estadual de Ensino Fundamental Boqueirão (Foto: Marcelo Curia/Globo Rural)

 

A professora e diretora Marcia Gislaine Bazzan, de 50 anos, desde 2017 trabalhando na escola, explica que todos os protocolos sanitários estão sendo cumpridos: medidor de temperatura, tapete sanitizante na entrada, máscaras e álcool em gel, além de uma área improvisada para a merenda ao ar livre, para evitar aglomeração, desde que não chova ou faça frio, pois a escola não dispõe de espaço para refeitório.

Márcia lembra que, em 19 de março de 2020, as escolas receberam a primeira notificação da Secretaria de Educação para interromper as aulas por 15 dias. Depois, o prazo foi ampliado para 30 – e mais 30 dias. O tempo foi passando, as aulas não retornaram, e a pandemia acabou forçando o fechamento por mais de um ano.

Fazia as tarefas que a professora preparava, mas não era igual estar na aula, era um pouco estranho"

Guilherme Martins, aluno do 7o ano da Escola Estadual de Ensino Fundamental Boqueirão

A adaptação teve de ser rápida. “Nós tínhamos, por um lado, de preparar material pedagógico impresso e on-line para entregar aos alunos e, em contrapartida, as famílias em situação de vulnerabilidade por falta de trabalho dos pais também precisavam de cestas básicas, que conseguimos atender graças à verba da merenda escolar.”

A diretora Marcia Gislaine Bazzan (Foto: Marcelo Curia/Globo Rural)

“Nem todos os alunos tinham – e muitos ainda não têm – acesso à internet para acessar os materiais para trabalho, além disso, a escola tinha uma conexão de internet muito fraca e instável, que hoje já conseguimos resolver com uma de fibra óptica de 100 megabytes, com verba do Ministério da Educação”, explica a diretora.

No período em que a escola esteve fechada, o aposentado rural João Luiz Freitas Martins, de 50 anos, encilhava a sua égua Prateada uma ou duas vezes por semana e encarava uma cavalgada de três horas para ir até a escola buscar os livros e conteúdos impressos pela professora, trazendo na garupa para o filho Guilherme, aluno da 6a série. Na propriedade de 16 hectares, em Lobo Dávila, o sinal de internet é ruim, mal dá para usar o celular.

Ele, então, fazia uma nova viagem para devolver à escola os trabalhos realizados pelo filho. João sente orgulho de ter percorrido várias vezes coxilhas e estradas com a sua parceira equina de quase 30 anos das lidas na lavoura de subsistência que mantém a família.

João Luiz Freitas Martins com a égua que o levava até a escola para buscar os livros do filho (Foto: Marcelo Curia/Globo Rural)

Guilherme, de 12 anos, é filho do seu João e um dos 11 alunos atendidos pelo transporte escolar, que, pelo protocolo sanitário, realiza várias rotas para não aglomerar tantos jovens ao mesmo tempo dentro da van. Ele explica do seu jeito como foi a sensação de ficar este último ano afastado da escola, estudando praticamente sozinho no sítio da família, com a ajuda dos pais. “Eu tinha os materiais, os livros, fazia as tarefas que a professora preparava, mas não era igual estar na aula, era um pouco estranho. Eu gosto da escola, das aulas e dos colegas.”

Ele frequenta a Escola Boqueirão desde o 2o ano do fundamental – hoje está no 7o ano – e, dentre todas as disciplinas, diz ter preferência pela de ciências, além de gostar de pesquisar na internet sobre os animais, mas somente quando tem oportunidade de ir à casa da tia materna, na cidade, onde há banda larga e Wi-Fi.

A aluna Renata da Silva de Bastos, de 10 anos, do 5o ano do ensino fundamental, mesmo com a retomada das aulas, precisou continuar em casa, porque mora com a avó Luísa Castilhos, de 84 anos, que é cadeirante. Renata mora próximo à escola, tem Wi-Fi por fibra óptica e pela tela do celular da mãe acompanha as aulas. Ela conta que o pai comprou um computador e um smartphone novos para ela, o que vai ajudar nas tarefas do dia a dia, além de conseguir liberar o celular da mãe.

Guilherme, de 12 anos, aguarda a van que o levará até a escola (Foto: Marcelo Curia/Globo Rural)

 

O colega Luiz Otávio Zambeli da Silva, de 10 anos, também estudante do 5o ano, é mais um dos que não retornaram às aulas presenciais. Ele contraiu a Covid-19 em novembro de 2020, juntamente com seu pai, mãe e irmão recém-nascido. Hoje, todos passam bem, mas, por segurança, ele assiste às aulas pelo celular, que tem Wi-Fi com banda larga. A mãe de Otávio, Sirne Dapieve Zambeli, de 34 anos, ajuda o filho nas tarefas escolares e elogia o esforço dele.

Otávio, que sonha quando crescer trabalhar na área da robótica, considera a escola muito importante. “Gosto muito de matemática, é minha matéria preferida, mas também gosto de estudar todas as disciplinas. Já me acostumei a estudar em casa com a professora on-line. E também tem a minha mãe, que me ajuda muito em casa com as tarefas. Ela é bem exigente”, conta.
Source: Rural

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