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A geada é um fenômeno já muito conhecido dos cafeicultores e players do mercado mundial de café. Até o momento, os Estados mais afetados neste ano oram: Minas Gerais, São Paulo e Paraná, com destaque para as regiões do Cerrado Mineiro, sul de Minas e Alta Mogiana, onde os danos foram severos.

Os três Estados são responsáveis por 67% da área total cultivada de café no país, segundo dados da Companhia Nacional de Abastecimento (Conab). Estudos preliminares da instituição indicam que 21% da área de café arábica foi afetada de alguma forma pelo frio, porém, levantamentos regionais de cooperativas, órgãos estaduais e associações indicam prejuízos maiores e mais severos.

 

Diante de tal situação, um levantamento mais completo está sendo realizado pela Conab, Fundação Procafé, Conselho Nacional do Café (CNC) e Ministério da Agricultura. O objetivo é gerar um número oficial para a cadeia café, além de identificar e facilitar a liberação de recursos para mitigação dos impactos da geada para os cafeicultores.

O café que apreciamos em nossas xícaras todos os dias pode ser constituído de duas espécies de café: Coffea arabica e Coffea canephora. Mas aqui falarei somente do primeiro, o único afetado pelas geadas deste ano.

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O café arábica tem preço construído dentro da Bolsa de Valores de Nova York (ICE NY). Além dos básicos preceitos da economia (oferta e demanda), o grão é negociado em compras futuras como outras commodities, o que pode gerar muitas especulações.

Fundos de investimento, pequenos e grandes investidores, produtores e torrefadores, todos estão envolvidos nessa salada da Bolsa de Valores. E há diversas bolsas em que o grão é negociado, como a B3, no Brasil, e a Ethiopian Commodity Exchange (ECX), na Etiópia.

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O café ainda é vendido fora dessas plataformas, no mercado físico. No entanto, todos os agentes formadores de preço da cadeia café se baseiam no que acontece na ICE NY para fixar seus valores.

A pergunta que está em campo agora é: será que vai faltar café? Em teoria sim, mas na prática a resposta é depende. Segundo dados compilados pelo CNC no ciclo passado, o Brasil produziu 63,1 milhões de sacas de café, exportou 44,5 milhões e consumiu 21 milhões de sacas, portanto já temos um déficit de 2,4 milhões de sacas.

A falta de matéria-prima indica que haverá judicialização por não cumprimento dos contratos. E a situação não irá se normalizar em 2022, uma vez que a safra não deve ser tão alta – apesar da teórica bienalidade positiva

Jonas Leme Ferraresso

Na equação de 2022, a exportação e o consumo interno não devem ter grandes variações. E ainda há chances de crescimento do consumo em países asiáticos. Somando-se a isso, o Brasil está em um ano de safra baixa, a previsão é de uma colheita 22,6% menor.

Mas, neste número, a Conab não computou os efeitos da estiagem nas lavouras após maio. Tais consequências estão sendo observadas apenas agora na colheita e no rendimento dos frutos de café.

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Empresas como a Nestlé e JDE tendem a formalizar suas compras de grãos crus com bastante antecedência, evitando assim os solavancos no mercado financeiro. Elas “travam” os preços e ficam com papéis que, teoricamente, garantem a entrega da matéria-prima no futuro.

No entanto, ninguém torra papel, essa garantia formal só é válida se houver café físico para processar. A falta de matéria-prima indica que haverá judicialização por não cumprimento dos contratos.

E a situação não irá se normalizar em 2022, uma vez que a safra não deve ser tão alta – apesar da teórica bienalidade positiva. Isso é consequência de uma combinação de fatores: os estoques privados baixos, as três geadas registradas este ano, a pior seca dos últimos 91 anos que continua afetando a agricultura e economia, e uma pandemia ainda persistente.

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A cadeia café nunca enfrentou tantas peculiaridades de uma só vez. Os produtores, a princípio, veem seus rendimentos brutos subirem, pois os preços internacionais do café estão em ascensão e o dólar alto favorece o valor final da saca.

No entanto, a inflação e o efeito câmbio provocam a alta dos insumos necessários na lavoura, tais como fertilizantes e combustíveis. O impacto também é notado no transporte, nas tarifas alfandegárias, nos investimentos em equipamentos, o que achata tais ganhos a curto, médio e longo prazo.

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Por fim, estes acontecimentos afetam o consumidor, que pagará mais caro pelo café na gôndola, na padaria e nas populares cápsulas. Atualmente, o produtor está recebendo em várias regiões mais que o dobro do valor bruto que recebia há menos de um ano atrás por sua saca de café.

Então até que ponto esses reajustes chegarão ao nosso café diário? Será que toda esta conhecida inelasticidade de consumo irá permanecer neste cenário de grandes ajustes de preço? Pequenas e médias marcas e torrefações conseguirão sobreviver achatando suas margens de lucro ao extremo para se manter competitivas no mercado?

Assim como na pandemia, muitas questões serão respondidas ao longo do caminho, já que agora as consequências da dobradinha seca e geada estão nebulosas a todos.

*Jonas Leme Ferraresso é engenheiro agrônomo e consultor em café.

As ideias e opiniões expressas neste artigo são de responsabilidade do seu autor e não representam, necessariamente, o posicionamento editorial da Revista Globo Rural.

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Source: Rural

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