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Realização. Esse é o sentimento do agricultor Gelso Pezzini, de quase 72 anos, ao ver que suas três "crianças", hoje com mais de 40 anos de idade, estão conduzindo a fazenda em Santa Bárbara do Sul, no oeste gaúcho. Com produção de soja, milho e trigo em rotação com feijão preto e aveia, a Agropecuária Corticeira hoje tem a parte executiva conduzida pelo filho do meio, Tales Giovane Pezzini – engenheiro agrônomo como o pai.

Gelso Pezzini e seu filho do meio, Tales Giovane Pezzini (Foto: Divulgação)

 

“A gente tentou criar nos filhos uma motivação para buscar o conhecimento nessa área. E eu fui incentivado pelo meu pai, que não tinha muito conhecimento científico. Era um pequeno agricultor e me incentivava a fazer agronomia”, lembra Gelso, ao contar que, desde cedo, buscou levar as crianças para a fazenda.

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“A educação e a busca do conhecimento sempre foram muito incentivadas por mim e pela minha esposa, a mãe das crianças. Ela também teve uma função importante na formação pessoal e profissional dos filhos incentivando a gostar daquilo que era a nossa atividade”, relata o agricultor, que hoje atua apenas na parte administrativa da propriedade, contando com a ajuda dos outros dois filhos: uma formada em direito e outro formado em veterinária.

O caso da família Pezzini, contudo, é uma exceção. Segundo pesquisa realizada pela consultoria PwC, 75% das empresas familiares acabam fechando na passagem para a segunda geração – problema que, na maioria dos casos, está relacionado a conflitos na própria família, segundo conta a pesquisadora do Cepea/Esalq-USP, Gabriela Ribeiro. Em sua dissertação de mestrado, ela analisou sucessões bem feitas em quatro fazendas em São Paulo, Mato Grosso do Sul e Paraná e destaca que a boa relação entre pais e filhos está entre os principais fatores de sucesso nesse processo.

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“Cada família é uma, assim como cada propriedade é uma. Tem coisas que funcionam mais para uma do que para outras, mas existem vários pontos que acabam favorecendo a sucessão. É uma construção desde sempre, com vários pontos que acabam favorecendo para que ocorra da melhor forma possível”, explica Gabriela, ao relatar o trabalho dos pais para trazer os filhos para a atividade.

“O que eu sinto é que os pais têm muito orgulho de passar o legado para o filho e se sentem muito satisfeitos do filho tocar as coisas que ele criou. Só que, realmente, o dia a dia, em si, para passar esse bastão, é muito complicado. O que deu pra perceber é que quanto mais cedo isso ocorre, menores são as dificuldades porque o processo consegue ser um pouco mais tranquilo”, explica a pesquisadora do Cepea/Esalq-USP.

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Hoje à frente da Brangus HP, a pecuarista Tita Lancsarics ainda lembra dos tempos de criança, quando frequentava a fazenda no interior de São Paulo com o pai. A proximidade entre os dois foi decisiva no processo de sucessão, marcado por altos e baixos. “Tiveram muitos embates, momentos muito difíceis, mas nunca faltou amor. Nunca faltou entendimento entre a gente”, conta Tita ao recordar do trabalho que foi convencer o seu pai, falecido este ano, a implementar a integração lavoura-pecuária na fazenda.

Tita Lancsarics e seu pai, Herculano Carlos de Almeida Pires, durante a última visita do pecuarista a sua fazenda (Foto: Arquivo Pessoal)

“É muito tênue essa ligação entre o velho e o novo. O novo tem que chegar e a gente também tem que ter um olhar para aquilo que é a experiencia do mais velho. E acho que que essa é a grande sabedoria de uma sucessão bem sucedida”, observa Tita, que, hoje, passa esse conhecimento para o filho e os sobrinhos. Deixar a atividade, contudo, é a parte mais difícil para quem está sendo sucedido, segundo conta Gabriela, do Cepea/Esalq-USP.

“Geralmente, quem construiu uma atividade e está ali produzindo é uma pessoa vaidosa, com um gênio forte, porque trabalhou muito naquilo para ter sucesso. É uma pessoa competente e que vai ter que se retirar daquilo, deixar de ser o centro da atenção e permitir que o filho passe a decidir e a comandar. Então, tanto o pai tem que ter a cultura de dar um passo pra trás quanto do filho de não achar que vai revolucionar a agricultura brasileira naquele momento”, relata a pesquisadora, ao destacar que saber a hora de sair de cena também é um fator decisivo para um sucessão bem sucedida.

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No caso de Tita, o pai se afastou da atividade quando percebeu que as coisas já não estavam mais como ele gostaria que fossem conduzidas. “Eu falei, comentei com ele ‘pai, estou sentindo sua falta’ e ele falou que estava indo menos porque quando ele via algo que não estava exatamente como ele gostaria, se irritava”, conta a filha, ao ver, na decisão do pai, um gesto de amor. “Não tem demonstração maior de amor e de desejo de que o negócio se perpetuasse”, completa a pecuarista.

José Carlos Beckheuser e sua filha Mariana Soletti Beckheuser (Foto: Divulgação)

 

Na Beckhauser, empresa que atua no setor de manejo racional de bovinos, o pioneiro José Carlos Beckheuser, hoje conselheiro, se sente “pleno” ao saber que os negócios estão sendo bem conduzidos pela filha, Mariana Soletti Beckheuser, hoje na presidência da empresa. “Eu me senti sempre muito respeitado pelos filhos e eles me cultivam e me cultuam por esse contexto todo. Pelo jeito como se tocou o negócio, mas também como se tocou a relação de família e de pai e filho”, conta José Carlos.

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Para Mariana, a educação que o pai ofereceu a ela e aos irmãos é um presente que José Carlos conferiu a eles e a si mesmo, pois foi vital na boa condução do processo de sucessão. “Porque a gente só o que a gente é por causa dos pais. Não sozinho, é pai e mãe, mas são eles que formam. Para mim, se tem um investimento maior e mais acertado que os meus pais fizeram na gente foi investir na nossa educação e nos dar liberdade”, completa a presidente da Beckhauser.
Source: Rural

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