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O produtor rural Eduardo Oliveira teve dois tratores Massey Ferguson de R$ 180 mil furtados de uma das fazendas da família em Batatais, no interior paulista, em dezembro do ano passado. O furto ocorreu na noite de sábado, quando não havia funcionários no local.

Um dos tratores foi encontrado abandonado dois dias depois na margem de uma rodovia, com problemas mecânicos. O outro, que tinha um implemento acoplado, não foi recuperado, mas o produtor recebeu o seguro da máquina.

“Os ladrões sabiam da nossa rotina e atacaram quando não havia ninguém na fazenda. Só soubemos do furto na manhã de segunda e registramos o boletim de ocorrência”, diz Oliveira, produtor de cana, soja, milho e pecuária de corte.

Agricultor durante a colheita de soja (Foto: José Medeiros/Ed.Globo)

 

Ele conta que foi a primeira vez que roubaram maquinário na propriedade e diz que tem observado um aumento de casos como esse na sua região. Para prevenir, além de renovar o seguro das máquinas, Oliveira contratou um sistema de monitoramento 24 horas da propriedade operado por uma central de segurança.

Não há números oficiais de roubos e furtos de máquinas agrícolas no país, já que eles entram nas estatísticas comuns de veículos, mas especialistas em segurança rural e empresas de monitoramento ouvidos pela Globo Rural concordam que está ocorrendo um aumento dessas ocorrências no campo e o relacionam ao crescimento do agronegócio.

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A demanda por máquinas agrícolas, aliás, nunca esteve tão aquecida: o setor registrou um aumento de 17% nas vendas no ano passado e projeta uma alta ainda maior neste ano, na casa dos 30%.

Carlos Frederico Ribeiro, coordenador administrativo do Instituto CNA (Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil), que lançou o Observatório da Criminalidade no Campo em 2017, diz que há uma “invisibilidade” do crime rural que não condiz com a importância do setor. “Não se pode pensar em políticas públicas sem um diagnóstico fiel do problema que se pretende corrigir.”

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O Observatório fez contato com os 27 Estados em busca de dados sobre a criminalidade na zona rural no período de 2015 a 2017 para elaborar um estudo sobre a criminalidade no campo. Apenas cinco unidades da federação enviaram alguma informação, a maioria sem detalhamento: Minas Gerais, Santa Catarina, Rio Grande do Sul, Maranhão e Goiás, além do Distrito Federal.

A conclusão do estudo aponta que a falta de padronização, em alguns casos, e a total ausência de informação na maioria dos casos são os principais gargalos para o combate à criminalidade no campo, embora haja iniciativas louváveis que merecem destaque em alguns Estados e no Distrito Federal.

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A CNA cita como exemplos o Rio Grande do Sul, que criou em 2018 a primeira delegacia especializada em crimes rurais do país; Goiás e Minas Gerais, que instituíram a Patrulha Rural com apoio dos Sindicatos Rurais e de produtores; Mato Grosso, que, em parceria com a Federação da Agricultura e Pecuária do Estado do Mato Grosso (Famato) e outras entidades do agro, tem avançado no policiamento rural; e o Distrito Federal, onde há detalhado levantamento das ocorrências de crimes no campo. “São ilhas de práticas e ações positivas em um mar de desconhecimento e ignorância”, conclui o estudo.

Goiás, um dos exemplos, instituiu a Patrulha Rural em 2017 e passou a levantar as estatísticas da criminalidade no campo. Um relatório de 2019 apontou 2.192 furtos e roubos relacionados ao agronegócio ou 1,94% do total. Os furtos, com 94%, foram dominantes.

Os animais foram os principais alvos de furtos e roubos no campo, com 54% das ocorrências, seguidos por equipamentos agrícolas, com 28%. Tratores, colheitadeiras, plantadeiras e equipamentos agrícolas de grande porte representaram 2,46% das ocorrências.

 

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Segundo o tenente Lenine Monteiro Branquinho, comandante do Batalhão Rural da região de Catalão, os policiais fazem o cadastro do produtor, dos funcionários e da propriedade com georreferenciamento da localização para diminuir o tempo de resposta em caso de denúncia de crimes. No cadastro, consta também a relação e fotos do maquinário da fazenda, que são usadas para divulgação e identificação em casos de furto ou roubo.

Os produtores recebem uma placa de monitoramento com o número de cadastro de sua propriedade. “A implantação da Patrulha Rural inibiu as ocorrências. Desde agosto do ano passado, só tivemos um caso de implemento furtado na nossa região, que foi recuperado quatro dias depois em bloqueio nas estradas.”

Ribeiro diz que, desde o ano passado, o Observatório realizou três painéis online de segurança rural com representantes da Polícia Militar, que levaram para seus Estados novos conhecimentos e tomaram iniciativas de desenvolver projetos ou aperfeiçoar procedimentos e ações em curso para combater os crimes rurais.

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Falta de registro

O coordenador diz que, infelizmente, muitos produtores rurais ainda não registram as ocorrências, o que também impede um mapeamento dos crimes pela polícia. O Observatório criou um formulário digital para denúncias de roubos, furtos e outros crimes nas fazendas, mas o instrumento só funcionou, e de forma precária, no primeiro ano.

Em 2018, a CNA passou a integrar o Conselho Nacional de Segurança Pública, que se reúne uma ou duas vezes por ano para discutir políticas para o setor. Entre as propostas levadas pela entidade, estão inserir na política nacional programas e projetos específicos voltados para a prevenção e o controle da criminalidade nas regiões rurais e incluir segmentação regionalizada e mais detalhada possível das ocorrências criminais mais comuns em áreas rurais, visando a padronização e disponibilização das informações.

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Ribeiro diz que dentro do Ministério da Justiça já há movimentos para separar nas estatísticas os crimes no campo, mas é preciso alinhar isso com cada Estado. A CNA também desenvolveu junto com o Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa) a Plataforma Digital de Registro e Gestão de Tratores e Equipamentos Agrícolas (ID Agro), lançada em novembro do ano passado, que permitirá o registro oficial de tratores e equipamentos agrícolas, sem custo para o produtor rural.

“O registro permitirá verificar se o trator não é roubado. A plataforma só aguarda a regulamentação pelo Mapa para entrar em vigor”, diz Ribeiro, acrescentando que vai valer apenas para novas máquinas. “Mas, já estamos pensando em como registrar também as outras.”

Consultada, a Secretaria de Inovação, Desenvolvimento Rural e Irrigação do Mapa disse que estão sendo realizadas tratativas com o Departamento Nacional de Trânsito (Denatran) e o Ministério da Justiça e Segurança Pública para viabilizar o compartilhamento das informações. “O texto do decreto e as normativas estão em fase de avaliação pela área jurídica do Mapa para a regulamentação desse sistema.”

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Rastreamento

No ano passado, o Grupo Tracker, que oferece três tecnologias para monitorar e rastrear máquinas agrícolas, incluindo um sistema que opera com radiofrequência e é o mais indicado para os novos equipamentos, registrou nove ocorrências de roubos ou furtos no segmento.

O número representa o triplo das ocorrências de 2019 – em anos anteriores, o aumento de casos nunca passou de 50%. “Os ladrões migram para onde está o dinheiro”, diz Rodrigo Abbud, diretor comercial da multinacional colombiana que opera há 20 anos no Brasil.

Segundo ele, o segmento específico de máquinas agrícolas representa atualmente 2% dos negócios da multinacional colombiana, mas, quando se incluem outros veículos que atendem o agronegócio, como caminhões e camionetes, o percentual sobe para 40%. Além disso, o agro é o setor que mais tem registrado crescimento em clientes, com cerca de 12% por ano.

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De janeiro de 2020 a maio de 2021, diz Abbud, a empresa conseguiu recuperar 90% das máquinas roubadas. O sucesso é maior nos casos em que o cliente faz a comunicação rápida. Duas em cada três ocorrências são de roubo.

Em maio deste ano, por exemplo, foi roubado um trator em Itaquaquecetuba (SP) avaliado em R$ 200 mil, após os ladrões terem rendido o condutor. O equipamento foi recuperado quatro horas após o aviso, graças ao rastreamento do sinal por helicóptero que foi feito pelos “caçadores” da Tracker.

Abbud diz que a vantagem do sistema de rastreamento por radiofrequência em relação à tecnologia do GPS é não sofrer a interferência dos “jammers” (equipamentos usados geralmente por quadrilhas para inibir ou desabilitar o sinal de GPS das máquinas) e não ter qualquer conectividade com o veículo, ou seja, não interfere na parte elétrica ou eletrônica.

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O rastreador, que possui bateria de três anos e uma blindagem especial para resistir a situações extremas de temperatura, umidade, pressão, trepidação e poeira, é escondido na máquina para dificultar a ação dos ladrões. 

Segundo o diretor, a maioria dos clientes do segmento agro é do interior paulista, onde estão também as quadrilhas especializadas. A contratação do serviço de rastreamento pode ser mensal ou anual. O aparelho é cedido em comodato e passa por atualizações. A Tracker, que atua em 13 países, tem uma base de 180 mil clientes ativos e iniciou suas operações trabalhando com seguradoras.

Migração

O consultor Carlos Zumerle, da Agro Zeta Segurança do Agronegócio, também aponta uma invisibilidade dos crimes no campo e diz que o mundo agro ainda não se conscientizou de que o crime especializado migrou para o campo. Segundo o especialista, ao ouvir que o agro representa 26% do PIB brasileiro, o criminoso vai agir onde está o dinheiro.

Além de não saber o total de roubos ou furtos de máquinas agrícolas por falta de tipificação nas estatísticas, também não dá para dizer qual o valor total de equipamentos roubados ou furtados. Ainda há muita subnotificação e falta vontade política para criar um código específico para essas ocorrências, como ocorreu com o roubo de cargas

Carlos Zumerle, consultor da Agro Zeta Segurança do Agronegócio

 

Zumerle lançou uma enquete em março deste ano com o objetivo de mapear as regiões brasileiras e caracterizar os crimes ocorridos na cadeia do agronegócio. O formulário foi respondido por 80 produtores rurais de todo o país, sendo que 66% disseram já ter sido vítimas de alguma ação criminosa.

Desses, 57% responderam que suas propriedades foram alvo de furtos, 27% relataram a ocorrência de roubos e o restante foi alvo dos dois crimes. A maioria, 94%, afirmou que o bem não foi recuperado e 27,8% disseram que o equipamento levado pelos ladrões valia mais de R$ 100 mil.

“Além do prejuízo material, nos casos em que não há seguro, o furto ou roubo gera uma perda intangível para o produtor porque ele fica sem a máquina para o seu processo produtivo até conseguir recuperar ou comprar outra”, diz Zumerle, acrescentando que uma dificuldade maior na recuperação de um trator, por exemplo, está no fato de a máquina não ter placa (a identificação é feita apenas pelo chassis) como os veículos de passeio e caminhões e ser acionada por uma chave universal.

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O consultor e o coordenador do Observatório da CNA reconhecem que segurança é uma obrigação do Estado, mas lembram que o “cobertor da polícia é curto” e recomendam aos produtores que invistam em sistemas de segurança e monitoramento para minimizar os roubos e furtos.

Zumerle acrescenta que câmeras, alarmes e drones devem ter suas centrais de monitoramento fora das propriedades porque, ao entrar nas fazendas, o criminoso já estudou o local e sabe bem como neutralizar os sistemas locais.

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Para Luiz Henrique Peixoto, fundador da Campo Seguro, projeto privado que tem como propósito transformar a segurança do agronegócio brasileiro através da aplicação de tecnologia, é preciso criar um banco de dados do crime rural visando dar segurança ao setor.

Umas das soluções oferecidas pela Campo Seguro, que já opera em Minas Gerais e está em fase de captação de recursos para ampliação e importação de equipamentos, é a instalação de câmeras com inteligência artificial em portais, torres e drones para leitura de placas de veículos nas fazendas e nas estradas rurais. As imagens vão para uma uma central de monitoramento integrada com a Polícia Militar, que dá o alerta no caso de veículos furtados ou roubados.

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Source: Rural

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