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O Programa de Aquisição de Alimentos foi criado para incentivar a compra de produtos da agricultira familiar, mas seu orçamento foi sendo reduzido nos últimos anos (Foto: MDA/Divulgação)

 

Se ao longo da pandemia a fome aumentou no Brasil, atingindo mais de 19 milhões de pessoas, no governo federal, os recursos destinados para fazer frente ao agravamento da insegurança alimentar no país devem apresentar forte redução este ano, com efeitos sobre o acesso adequado à alimentação no campo e na cidade.

Segundo números do projeto de lei orçamentária anual, o valor para programas de segurança alimentar e nutricional este ano será de R$ 279,6 milhões, um corte de mais de 75% em relação aos R$ 1,12 bilhão reservados no ano passado e declarados no Portal da Transparência, mantido pela Controladoria Geral da União (CGU) a partir de informações dos sistemas de gestão financeira do governo federal. Dentre as políticas públicas atendidas por esses recursos, estão a aquisição e distribuição de alimentos da agricultura familiar e a distribuição de alimentos a populações tradicionais.

“A redução que acontece no orçamento dos recursos do programa de aquisição de alimentos é uma coisa brutal. Só isso daí já vai ter um impacto direto num programa que é uma base muito importante do ponto de vista de uma política de segurança alimentar”, aponta o professor da Universidade Federal do Paraná (UFPR) e pesquisador da Rede Brasileira de Pesquisa em Soberania e Segurança Alimentar e Nutricional (PENSSAN), Nilson de Paula.

Ele ressalta que os gastos do governo com políticas de segurança alimentar tem caído desde 2015 e se agravou nos últimos anos, com o consequente avanço da crise econômica. “O programa de aquisição de alimentos não é só uma política agrícola para dar suporte a agricultura familiar. A sua arquitetura permite justamente a ligação entre a agricultura familiar e segmentos da sociedade que são beneficiados diretamente por ela”, aponta.

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O PAA, Programa de Aquisição de Alimentos, foi criado em 2003 pelo governo federal para promover o acesso à alimentação e, ao mesmo tempo, incentivar a agricultura familiar. No ano passado, foram destinados R$ 168,2 milhões ao programa, segundo dados do Portal da Transparência, dos quais apenas R$ 27,16 milhões foram efetivamente executados – cortes de 35% e 71% em relação a 2019, respectivamente. Para este ano, o governo propôs um orçamento é de 101,7 milhões, redução de 39,5% no pior momento da pandemia no país.

Em relação à distribuição de alimentos a populações tradicionais, o valor gasto pelo governo no ano passado foi de R$ 6,3 milhões, um corte de 59,6% em relação a 2019, segundo números da CGU. Os gastos também fazem parte do orçamento destinado à segurança alimentar e nutricional, cuja execução somou R$ 209,98 milhões no ano passado, o equivalente a 18,75% do total disponível.

O montante foi destinado principalmente para secretarias do próprio governo, como a secretaria do desenvolvimento agrário, e bancos públicos, como o Banco do Brasil. Já este ano, além dos cortes no orçamento, também houve mudança no perfil dos órgãos que receberam os recursos liberados até o momento, destacando-se empresas privadas do ramo agropecuário e de alimentos. Só a Itambé, gigante do setor de laticínios, recebeu R$ 19,25 milhões dos desembolsos do governo federal para promoção da segurança alimentar no país, o que representa mais de 16% do total executado.

Entre as empresas que receberam recursos do governo para combate à fome, também está a Granol Indústria de Comércio e Exportação, que se descreve em seu site como uma das maiores fabricantes de farelos e óleos vegetais no Brasil, com 5 complexos industriais, 17 regionais de compra e armazenagem de grãos, 3 usinas de biodiesel, 2 usinas de glicerina, 1 fábrica de lecitina. A empresa consta no Portal da Transparência como destino de mais de R$ 10,6 milhões do governo federal este ano, o que equivale a 9,23% do total executado do orçamento para o programa de segurança alimentar e nutricional este ano.

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Procurado, o Ministério da Cidadania negou que tenha havido variação significativa no orçamento do Programa de Segurança Alimentar e Nutricional previsto para este ano na comparação com o executado no ano passado. Em nota, a pasta apresentou dados diferentes dos registrados no Portal da Transparência, mas que, ainda assim, caracterizam queda de 79,7% no orçamento para o programa de segurança alimentar e nutricional do governo: de R$ 1,05 bilhão em 2020 para R$ 213 milhões este ano.

“É preciso esclarecer que, em 2020, o programa contou com um aporte adicional de recursos de R$ 814,3 milhões, por conta de créditos extraordinários estabelecidos no Decreto Legislativo nº 6, de 20 de março de 2020, que reconhece o estado de calamidade pública devido à situação de emergência decorrente da Covid-19. Esse crédito somou-se ao orçamento do programa previsto para 2020, que era de R$ 237 milhões, totalizando um orçamento de R$ 1,05 bilhões, o qual teve uma execução de 94%”, afirma a pasta, ao apontar uma execução superior à registrada no Portal.

Globo Rural também entrou em contato com o Ministério da Agricultura, com a Itambé Alimentos e com a Granol Indústria de Comércio e Exportação, para entender em qual contexto para qual finalidade as empresas receberam recursos do programa de segurança alimentar e nutricional este ano, mas não obteve resposta até a conclusão desta reportagem.
Source: Rural

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