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(Foto: Pixabay)

 

A proibição do uso de agrotóxicos em lavouras na região da Área de Proteção Ambiental (APA) Serra do Lajeado, em Tocantins, está provocando polêmica entre ambientalistas e representantes do agronegócio no segundo maior produtor de soja do Matopiba. A decisão foi tomada na semana passada, em reunião do Conselho Deliberativo. A Apa Serra do Lajeado, uma das cinco do Estado, inclui a região da capital, Palmas, tem 121 mil hectares, sendo 22 mil hectares ocupados por agricultura e pecuária. 

Ao Instituto Natureza do Tocantins (Naturatins), do governo estadual, cabe a gestão dos planos de manejo. Os conselheiros, escolhidos por edital para um mandato de dois anos, decidiram proibir o uso dos agrotóxicos das classes 3 e 4 (menos tóxicos) na revisão do plano da área. São exemplos da classe 4 usados na soja os herbicidas glifosato e dicamba. O uso dos químicos das classes 1 e 2, considerados os mais tóxicos, já era limitado desde a criação da Apa em 1997. Só não entram na lista de proibidos os defensivos da classe 5, considerados improváveis de causar dano agudo.

Um documento que baseou a revisão do plano de manejo diz que “não se pode assumir uma posição tímida ou até legitimadora do ‘estado atual’ das coisas, sobretudo quando estamos diante de um cenário de grave crise hídrica e de contaminação das águas, cujos efeitos prejudiciais à saúde já são amplamente conhecidos”. Segundo o documento, o plano de manejo deve atentar para novos modelos de produção, como o sistema agroflorestal e/ou agroecológico, que, além de outros benefícios, usam defensivos naturais.

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Camilla Muniz, engenheira florestal do Naturatins, supervisora da Apa do Lajeado e presidente do Conselho Deliberativo, explica que a questão envolve mananciais que abastecem 300 mil pessoas em Palmas e outras cidades do entorno. Ambientalistas alegam que os agrotóxicos estão contaminando as nascentes.

A presidente do conselho diz que o Instituto do Desenvolvimento Rural (Ruraltins), outro órgão do governo estadual, pediu o adiamento da votação para apresentar um estudo técnico mostrando a viabilidade e os benefícios do uso consciente dos agrotóxicos, mas o conselho não aceitou e deliberou pela proibição. Camilla lembra que, há dois anos, uma grande fazenda da região foi multada em R$ 3 milhões por ter feito uma reforma em uma represa que prejudicou a qualidade da água que abastece a capital.

“O pessoal do setor agropecuário nunca se preocupou em participar formalmente do conselho, mas na última reunião havia mais de 50 representantes tentando derrubar a proibição dos agrotóxicos”, diz ela, acrescentando que, para os produtores que já atuam na área, a proibição só passa a valer cinco anos depois da renovação da licença ambiental.

Como presidente do conselho, Camilla só teria direito ao voto de minerva. Dos dez integrantes, cinco votaram pela proibição de todos os agrotóxicos, três votaram para manter proibidos apenas os de classe 1 e 2 e dois faltaram à reunião.

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Rafael Massaro, agrônomo e gerente de crédito do Ruraltins que votou para manter proibidos apenas 1 e 2, diz que a decisão não impacta apenas os grandes produtores de soja, milho e sorgo da região, mas também os pequenos agricultores que plantam frutas, feijão e hortaliças e os pecuaristas. Além disso, a proibição  inclui até alguns produtos biológicos e ignora que muitos produtores já estavam na área do parque antes da criação da Apa.

“Não existe nenhum estudo técnico que mostre prejuízos causados pelos agrotóxicos na região. Ao contrário, o uso consciente desses produtos ajuda no controle de pragas”, argumenta.

O agrônomo afirma que decisão do conselho não é assertiva e vai atingir toda a cadeia produtiva, incluindo o cinturão verde de Palmas. “Essa decisão é ambientalista, mas não é sustentável porque tira do produtor sua capacidade de produzir e se sustentar. Não é um avanço tecnológico. No nosso ponto de vista, é um retrocesso.”

Para Alessandra Sampaio, advogada e produtora de suínos e gado na região da Apa, o que está gerando muita insatisfação é a mudança ter sido feita em órgãos estaduais, via edital, sem a participação do setor agropecuário. “Quem lê editais?” questiona Alessandra, que saiu de São Paulo em 2014 para investir no agronegócio no Tocantins.

Ela alega que hoje as terras do agro são produtivas e caras porque foram investidos milhões em correção de solo e defensivos. "O produtor que não vai poder plantar ou criar gado será indenizado?” Segundo ela, os produtores estão estudando entrar com um mandado de segurança para barrar a proibição dos agrotóxicos.

Aprosoja

Dari Fronza, presidente da Associação dos Produtores de Soja e Milho do Tocantis (Aprosoja-TO), diz que a entidade é contra o mau uso de agroquímicos. Mas também se opõe à proibição. “Devemos sim banir o uso indiscriminado de agroquímicos e punir quem faz mau uso, mas nossos produtores estão adequados a uma das leis ambientais mais severas do mundo, sendo que aqui no Tocantins praticamente 50% de nossas áreas (35% de reserva legal e mais 10% de APPs) são áreas de conservação.”

Além disso, acrescenta, todos os produtos fitossanitários usados nas propriedades são aprovados pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), Ministério da Agricultura (Mapa) e Ministério do Meio Ambiente “exatamente para não causar danos à saúde da fauna, da flora e dos consumidores dos alimentos”.

O dirigente diz que não se pode banir o uso dos defensivos sem estudo técnico. “Para usar defensivos, temos que ter laudo de boas práticas assinado por um agrônomo. Já para comprar um produto para matar baratas em casa com o mesmo princípio ativo do agrotóxico, basta ir ao supermercado. E o que é pior: não temos onde descartar a embalagem do produto usado em casa, diferentemente do defensivo que tem bula e é descartado corretamente.”

Questionado sobre a proibição, o secretário estadual da Agricultura, Pecuária e Aquicultura (Seagro), Jaime Café, disse que a sua pasta não faz parte do grupo de trabalho do conselho da Apa. “Ainda estamos analisando os impactos dessa decisão.”

Ceará

Fronza, da Aprosoja-TO, diz que participa de audiências públicas que tentam vetar o uso de agrotóxicos pelo país e vê o que chama de exageros. Ele cita como exemplo a lei sancionada em 2019 que proibiu a pulverização aérea das lavouras no Ceará. “Acabou com a bananicultura.”

Luiz Roberto Barcelos, diretor da Associação Brasileira dos Produtores Exportadores de Frutas e Derivados, diz que, junto com outras entidades, a Abrafrutas entrou com ação de inconstitucionalidade no Supremo Tribunal Federal (STF) contra essa lei do Ceará, que trouxe muitos prejuízos aos produtores de banana, especialmente no ano passado, muito chuvoso. “Alguns produtores, inclusive, mudaram sua produção para Estados vizinhos.”
Source: Rural

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